sexta-feira, 15 de setembro de 2023

ESTRANHA FORMA DE VIDA

Antonio Carlos Egypto

 

 



ESTRANHA FORMA DE VIDA (Strange Way of Life).  Espanha, 2022.  Direção e roteiro: Pedro Almodóvar.  Elenco: Pedro Pascal, Ethan Hawke, Manu Rios, José Condessa. 31 min.

  

Pedro Almodóvar está com filme novo nos cinemas.  E, como sempre, rompendo paradigmas.  Para começar, porque o filme que ele está lançando é muito curto, dura meia hora, tempo insuficiente para compor uma sessão de cinema.  Sendo ele quem é, no entanto, está lá nas telonas, complementado por uma longa entrevista que deu a uma jornalista, falando sobre o filme, dissecando seu processo de criação e comentando muita coisa mais sobre a sua obra em geral e não apenas “Estranha Forma de Vida”.

 

O filme é falado em inglês, assim como seu trabalho anterior, “A Voz Humana”, com Tilda Swinton, também um curta.  Aqui protagonizam o ator norte-americano Ethan Hawke e Pedro Pascal, chileno de origem, mas com carreira em Hollywood.  Dirigir em inglês significa um desafio a mais para o diretor espanhol, talvez por isso a opção pelo curta-metragem.  O cineasta experimenta, testa seu sistema de trabalho em outro idioma, com atores habituados ao padrão hollywoodiano de realização.  O resultado é ótimo, sem problemas.

 


Nesse filme, Almodóvar encara o gênero western, algo incomum na sua filmografia, embora ele sempre tenha valorizado alguns faroestes clássicos e incluído cenas em seus filmes.  O universo do gênero lhe interessa, desde que possa sair dos clichês habituais, que envolvem preconceitos e uma noção de masculinidade, digamos, restrita a um padrão estereotipado.  Para ele, os cowboys têm de olhar para seus desejos e a atração física que pode surgir entre dois homens.  Constrói, assim, um faroeste gay.  Procura também fugir do óbvio, transmitindo pelos diálogos e pela sutileza de atos o clima erótico necessário ao tema.  Foi o que ele fez em “Estranha Forma de Vida”.

 

A inovação da homossexualidade na cena do western já havia sido encarada por Ang Lee, em “O Segredo de Brokeback Mountain”, que chegou a ser cogitado para ser dirigido por Almodóvar.  O filme de Lee resultou muito bom.  Assim como “Ataque dos Cães”, de Jane Campion, outro excelente trabalho.  O que não impediu Almodóvar de incluir seu toque pessoal nesse curta que explora o erotismo pelas bordas e constrói uma boa história, que poderia perfeitamente ser explorada num longa.  Se a inspiração foram os westerns norte-americanos e os cenários os dos faroestes spaghetti de Sérgio Leone e outros, a marca literária e visual almodovariana cumpre seu papel muito bem, sem deixar margem a dúvidas.

 

E o que dizer da escolha de um fado, de Alfredo Duarte e Amália Rodrigues, cantado em português por Caetano Veloso em falsete, como presença musical relevante no filme?  Mais do que isso, que deu nome a ele? Quem poderia esperar tal contribuição artística a uma obra como essa?   Uma incrível quebra de paradigma, embora totalmente integrada à proposta do filme e de seus personagens.  Coisas do gênio espanhol do cinema contemporâneo.




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