Antonio Carlos
Egypto
Poder voltar a passear pela Itália, curtir
suas cores, odores e sabores tão característicos, partilhar de sua vasta
cultura, história e arte e usufruir de paisagens marítimas de tirar o fôlego,
de tão belas, foi um grande prazer que me permiti neste mês de maio de 2018.
A Sicília, Sorrento e a Costa Amalfitana
apresentam cenários cinematográficos de deixar qualquer um de boca aberta. Não por acaso, tantos filmes já foram feitos
por lá, explorando a beleza singular do lugar.
Quem já não viu as imagens marítimas, as escarpas, os penhascos, os
desfiladeiros, as montanhas de pedra com casas, palácios ou fortificações no alto?
Em 2008, o cineasta alemão Wim Wenders lançou
seu filme “Palermo Shooting”, exibido na Mostra Internacional de Cinema naquele
ano. Mais do que a proposta do filme, o
que mais me cativou foram as belas imagens da cidade de Palermo, na Sicília. Fiquei com vontade de ir lá algum dia. Na programação da Mostra, estava incluído um
documentário sobre as filmagens de “Palermo Shooting”. Achei que seria interessante assisti-lo, por
ser mais uma forma de ver mais imagens de Palermo. Pois bem, para minha surpresa, algo raro se
deu. A sessão ainda estava na vinheta de
apresentação da Mostra, quando eu dormi e só acordei quando as luzes se
acenderam ao final. Ou seja, não vi uma
única cena do tal documentário, que não seria mais exibido.
Dez
anos depois, acabei indo a Palermo e adorei a cidade, linda, mesmo, de não
decepcionar ninguém. Belíssimas
construções, teatros, igrejas, maravilhosos mosaicos na Capela Palatina e na vizinha
Monreale e a praia de Mondello. E me
lembrar de “Il Padrino” (O Poderoso Chefão), de Francis Ford Copolla, de 1972,
explorado em objetos e roteiros turísticos, filmado na região. A onipresente Máfia, que não se vê.
Em Catânia, é inevitável lembrar-se do mestre
Visconti e “A Terra Treme”, de 1948, clássico do neorrealismo italiano. A dura vida dos pescadores, a penúria e a
exploração a que estavam sujeitos no porto de Catânia e no povoado de Aci
Trezza, num momento penoso do pós-guerra.
O que se vê hoje é bem diferente: um porto ativo e movimentado e Aci
Trezza como passeio turístico, onde se pode ver o Acicastelo, a praia com
pedras de erupção vulcânica no mar, de um passado muito remoto. Não são mais visíveis a fome e a miséria
daqueles tempos, exceto por um pedinte eventual na rua. Com uma beleza dessas, o turismo deve
garantir a economia da região.
Outro trabalho importante do neorrealismo é
“Stromboli”, de Roberto Rossellini, que se passa na ilha vulcânica que dá nome
ao filme. No caso, o vulcão é a metáfora
da tragédia humana vivida pelos personagens e da força para enfrentá-la, com
destaque para Ingrid Bergman, ao lado de um elenco não profissional. A visita ao vulcão Etna, desde Catânia, me
revelou, porém, muitas outras coisas, como a imensidão e a multiplicação da
ação vulcânica, sua incrível beleza, surpreendentemente cheia de cores, em
contraste com o negro que cobre toda a vegetação. O material que serve das construções à
criação artística. O vulcão é um mundo à
parte, complexo e variado.
A questão social mais grave hoje é a dos
imigrantes, africanos e do Oriente Médio, que chegam à costa sul da Itália pela
ilha de Lampedusa, como mostram os ótimos filmes “Terra Firme”, de Emanuele
Crialese, de 2011, e o documentário “Fogo no Mar”, de Gianfranco Rossi, de
2016. Mas no meu roteiro esse problema
não se apresentou. A geografia nos
separou desse grande drama humano dos nossos dias.
A Sicìlia histórica, que remete a Garibaldi e
à unificação da Itália, no século XIX, acabou dando margem para que Luchino
Visconti dirigisse uma obra-prima, a partir do romance de Giuseppe Tomasi di
Lampedusa, “O Leopardo”. A Sicília cheia
de charme e beleza é presença constante nos filmes de Giuseppe Tornatore, como
“Malena”, de 2000, filmado no centro histórico de Siracusa, a bela Ortígia,
“Cinema Paradiso”, de 1988, na região de Palermo, e “Baaría”, de 2009, na
cidade de Bagheria.
Siracusa, com o museu e seu sítio arqueológico
que nos remonta à Magna Grécia, com o teatro grego, a orelha de Dionísio, o templo
de Apolo, é um dos pontos altos da bela ilha mediterrânea da Sicília. O teatro de marionetes da cidade também me
encantou.
Tudo isso se completa na beleza da pequena
Taormina que, com seu teatro grego descortina uma paisagem estupenda, e com sua isola bela, tão charmosa, exigindo, porém, preparo físico para subir e
descer seus mais de 120 degraus para poder acessá-la.
Sorrento, no golfo de Nápoles, tem paisagens
marítimas maravilhosas, nos faz lembrar da famosa canção napolitana e é onde o
limão siciliano é mais abundante, aparentemente. E o delicioso limoncello
dá um sabor especial ao
passeio. De lá se vai à cinematográfica
Ilha de Capri. A Marga logo se lembrou
de “Tarde Demais para Esquecer” (An Affair to Remember), de Leo McCarey, de
1957, mais por seu ator preferido, Cary Grant, do que por Capri, acho eu. Mas aqui, também, a paisagem é exuberante.
Na Costa Amalfitana tem Positano, Amalfi,
Maiori, onde ficamos. Percorrer a costa,
baixando pela montanha, é ver uma maravilha após a outra, cinema puro.
Só que o filme de que eu deveria me lembrar em
detalhes me escapou e o prejuízo foi certo.
Tive minha carteira roubada no metrô/trem que vai de Nápoles a
Pompeia. Nada que o filme “O Batedor de
Carteiras” (Pickpocket), de Robert Bresson, de 1959, já não tivesse ensinado em
detalhes, didaticamente até, por meio do personagem Michael refinando sua
técnica pelas ruas de Paris. Quem manda
não se cuidar e achar que com você não vai acontecer?