Antonio Carlos Egypto
CASAMENTO SILENCIOSO (Nuta Muta), Romênia, França, Luxemburgo, 2008.
Direção: Horatiu Malaele. Com: Meda Victor, Alexandru Potocean e Doru Ana. 87 min.
Do cinema romeno chegaram até nós, nos últimos anos, 2006 e 2007, três ótimos filmes: “A leste de Bucareste”, de Corneliu Porumboiu, “Como eu festejei o fim do mundo”, de Catalin Mitulescu e, principalmente, “4 meses, 3 semanas e 2 dias”, de Cristian Mungiu. Isto me fez ficar atento ao que mais chegasse da Romênia em forma de cinema.
Que o novo cinema romeno destile as agruras do regime comunista, imposto e autoritariamente comandado pela então União Soviética, não é surpresa. Nem que Nicolau Ceausescu, o tirano local, seja a lembrança trágica, explicitada ou não, de seus filmes. Mas que o humor seja o veículo para sepultar esses fantasmas é uma grata surpresa.
No caso de “Casamento Silencioso”, a mise en scène, por seu tom barroco, em tudo exagerado, e a histeria que aí se revela, nos remetem ao cineasta sérvio Emir Kusturica. Muita agitação, música intensa, dramaticidade e provocação exacerbadas são visíveis desde as primeiras cenas do filme. A fonte de inspiração é o inegável talento de Kusturica. Incomoda um pouco a quem prefere curtir a vida em tom menos estressante e agitado, mas tudo bem. O mais interessante, porém, é o contraste que se estabelece a partir disso, no desenvolvimento da trama.
Num pequeno vilarejo romeno, em 1953, na zona rural, um casamento é o evento marcante daqueles dias. Está tudo pronto para começar a festa, quando chega a notícia da morte de Stálin, do luto internacional que se seguirá, proibindo manifestações públicas, sobretudo alegres, inclusive festas e casamentos. Muitos talvez quisessem comemorar tal morte, que representou para eles um alívio depois de tanta opressão. O stalinismo certamente não deixou saudades. Mas o que fazer diante da festa pronta, que deveria começar, e a mesa farta, que já está até posta? A saída que encontram é realizar um casamento silencioso: sem copos brindando, sem talheres ruidosos, sem discursos ou música audíveis, ou seja, em total silêncio, para não despertar suspeitas de que as normas proibitivas não estivessem sendo seguidas. E é aí que o filme se torna engraçado.
Parar aquela parafernália que nos foi mostrada, contrapondo cenas que exigem um controle impossível para aquela situação e para aqueles personagens, especialmente, é hilário. A originalidade do filme é justamente encenar o inviável: uma festa de casamento sem som (já que proibida e realizada clandestinamente).
O som se torna um personagem do filme nas cenas da festa, qualquer ruído, por menor que seja, nos faz rir. Grande idéia para se explorar em tempos de equipamentos de som sofisticadíssimos nos cinemas. O efeito dessas cenas é tanto mais curioso uma vez que se insere naquele conceito barroco-histérico que dá o tom do filme. O contraste é perfeito e a escolha daquele tom fica, então, inteiramente justificada.
O que se segue não é engraçado e talvez seja explícito demais, mensagem pronta demais, que não deixa espaço à reflexão. É compreensível exorcizar velhas tragédias e seu custo não é mesmo brincadeira, mas na contemporaneidade vilões e mocinhos já não são verdades autoexplicativas, ou seja, não convencem como tais. Opressão e ignorância desmedidas também nos colocam em posição de ceticismo ou desconfiança. E, afinal, o que é excessivo pode iludir. Mas nada disso tira a criatividade que as cenas do casamento silencioso, que dá título ao filme, apresentam. Elas seguramente valem a ida ao cinema.
Do cinema romeno chegaram até nós, nos últimos anos, 2006 e 2007, três ótimos filmes: “A leste de Bucareste”, de Corneliu Porumboiu, “Como eu festejei o fim do mundo”, de Catalin Mitulescu e, principalmente, “4 meses, 3 semanas e 2 dias”, de Cristian Mungiu. Isto me fez ficar atento ao que mais chegasse da Romênia em forma de cinema.
Que o novo cinema romeno destile as agruras do regime comunista, imposto e autoritariamente comandado pela então União Soviética, não é surpresa. Nem que Nicolau Ceausescu, o tirano local, seja a lembrança trágica, explicitada ou não, de seus filmes. Mas que o humor seja o veículo para sepultar esses fantasmas é uma grata surpresa.
No caso de “Casamento Silencioso”, a mise en scène, por seu tom barroco, em tudo exagerado, e a histeria que aí se revela, nos remetem ao cineasta sérvio Emir Kusturica. Muita agitação, música intensa, dramaticidade e provocação exacerbadas são visíveis desde as primeiras cenas do filme. A fonte de inspiração é o inegável talento de Kusturica. Incomoda um pouco a quem prefere curtir a vida em tom menos estressante e agitado, mas tudo bem. O mais interessante, porém, é o contraste que se estabelece a partir disso, no desenvolvimento da trama.
Num pequeno vilarejo romeno, em 1953, na zona rural, um casamento é o evento marcante daqueles dias. Está tudo pronto para começar a festa, quando chega a notícia da morte de Stálin, do luto internacional que se seguirá, proibindo manifestações públicas, sobretudo alegres, inclusive festas e casamentos. Muitos talvez quisessem comemorar tal morte, que representou para eles um alívio depois de tanta opressão. O stalinismo certamente não deixou saudades. Mas o que fazer diante da festa pronta, que deveria começar, e a mesa farta, que já está até posta? A saída que encontram é realizar um casamento silencioso: sem copos brindando, sem talheres ruidosos, sem discursos ou música audíveis, ou seja, em total silêncio, para não despertar suspeitas de que as normas proibitivas não estivessem sendo seguidas. E é aí que o filme se torna engraçado.
Parar aquela parafernália que nos foi mostrada, contrapondo cenas que exigem um controle impossível para aquela situação e para aqueles personagens, especialmente, é hilário. A originalidade do filme é justamente encenar o inviável: uma festa de casamento sem som (já que proibida e realizada clandestinamente).
O som se torna um personagem do filme nas cenas da festa, qualquer ruído, por menor que seja, nos faz rir. Grande idéia para se explorar em tempos de equipamentos de som sofisticadíssimos nos cinemas. O efeito dessas cenas é tanto mais curioso uma vez que se insere naquele conceito barroco-histérico que dá o tom do filme. O contraste é perfeito e a escolha daquele tom fica, então, inteiramente justificada.
O que se segue não é engraçado e talvez seja explícito demais, mensagem pronta demais, que não deixa espaço à reflexão. É compreensível exorcizar velhas tragédias e seu custo não é mesmo brincadeira, mas na contemporaneidade vilões e mocinhos já não são verdades autoexplicativas, ou seja, não convencem como tais. Opressão e ignorância desmedidas também nos colocam em posição de ceticismo ou desconfiança. E, afinal, o que é excessivo pode iludir. Mas nada disso tira a criatividade que as cenas do casamento silencioso, que dá título ao filme, apresentam. Elas seguramente valem a ida ao cinema.