Antonio Carlos Egypto
DESERTO PARTICULAR. Brasil, 2021.
Direção e roteiro: Aly Muritiba.
Elenco: Antonio Saboia, Pedro Fasanaro, Cynthia Senek, Thomas Aquino, Laila
Garin, Zezita Matos. 120 min.
O Brasil oficial anda muito mal
representado pelo mundo, como temos visto continuamente nos noticiários
diários. Nesse contexto, é muito bom
saber que o Brasil que estará representado pelo cinema na disputa do Oscar
2022, de melhor filme internacional, é outra coisa. É um Brasil amoroso, de
encontros, que celebra a diversidade, que ama a vida.
“Deserto Particular”, dirigido e
corroteirizado por Aly Muritiba (em parceria com Henrique dos Santos), foi
escolhido pela Academia Brasileira de Cinema para essa tarefa, depois de
premiações em Veneza, Espanha, Israel, Los Angeles, Nova York, e de vencer o
Festival Mix Brasil.
“Deserto Particular” é uma história de
amor que envolve surpresas, mistério, decepções de lado a lado e reconstruções
mediadas, naturalmente, pela sociedade.
Sujeitos a opressões diversas.
Religiosas, principalmente. Parte
de um desejo distante, intermediado pela onipresente internet. Desejo que se torna forte o suficiente para
estimular uma viagem de carro de Curitiba, no Paraná, a Sobradinho, no sertão
da Bahia. Um problema legal e funcional,
aliado a uma interdição aparentemente incompreensível, acaba por ensejar essa
ousada travessia. O mistério permanecerá,
mesmo lá, até conduzir a uma mudança de paradigma com transformações sofridas e
muito importantes.
Os personagens apresentam camadas,
níveis diversos de expressão e profundidade, sendo fundamentalmente falíveis,
humanos. Porém, regidos pela perspectiva
do amor, de sua busca, ao menos.
O amor também se mostra forte quando,
no filme, um filho cuida com carinho e paciência de seu pai, outrora uma figura
de comando, reduzido à demência senil que borra a memória e cala a
expressão. Tudo isso mostrado com
realismo e poesia. A vida cotidiana, convivendo com a fantasia, com a esperança,
com a utopia.
O fato de personagens transitarem
entre os gêneros, ou seja, sem se enquadrarem numa perspectiva binária, amplia
o leque de possibilidades, de ambições e de problemas. Torna, enfim, tudo mais complexo, tanto
positiva quanto negativamente.
Interpretações magníficas de Pedro
Fasanaro e de Antonio Saboia, destacando-se num bom elenco, põem em relevo a
dimensão emocional da situação. Um
roteiro muito bem articulado imprime força e verdade à narrativa. A trilha sonora é muito variada, vai do mais
elaborado ao brega. Combina com o filme,
celebra também a diversidade musical.
Um excelente trabalho do diretor Aly
Muritiba, que já nos deu “Para Minha Amada Morta” (2015), “Ferrugem” (2018) e
“Jesus Kid” (2020), entre vários outros trabalhos também como roteirista.