Antonio Carlos Egypto
TREM NOTURNO PARA LISBOA (Night Train to Lisbon).
Alemanha, Suíça, 2013. Direção:
Bille August. Com Jeremy Irons, Mélanie Laurent, Christopher
Lee, Charlotte Rampling, Bruno Ganz. 111
min.
Uma boa história, um romance importante ou com
sucesso de público, podem ser o ponto de partida para um grande filme. Mas, muitas vezes, não é o que acontece. O
excesso de cuidados na adaptação, a tentativa de ser fiel à obra e ao seu
autor, podem inibir o trabalho do cineasta e dos atores e o resultado acabar
sendo pífio.
Mesmo que não renda um grande filme, uma boa
história, com densidade e sensibilidade, se puder ser passada para as telas,
pode se comunicar bem com o público e alcançar êxito. É como vejo “Trem Noturno
para Lisboa”, o filme do dinamarquês Bille August. O diretor, que já fez
trabalhos como “Pelle, O Conquistador”, em 1988, “As Melhores Intenções”, em
1992, e “A Casa dos Espíritos”, em 1997, sabe contar bem uma história, de forma
clássica. Se o material a ser adaptado
for bom, o resultado tende a não decepcionar. Aqui trata-se de um romance best seller, que vendeu 2,5 milhões de exemplares pelo mundo, escrito por
Pascal Mercier, pseudônimo do escritor suíço Peter Bieri, natural da bela
cidade de Berna, a capital do país.
É justamente em Berna que a trama começa. Raimund Gregorius (Jeremy Irons), suíço,
professor de latim no ensino médio, se depara com uma jovem portuguesa tentando
saltar de uma ponte, em busca da morte, nas águas geladas do rio. Com ela vem um casaco que contém um livro de
um médico lusitano, Amadeu do Prado, e uma passagem de trem para Lisboa. A mulher desaparece, mas a passagem será
utilizada e o livro, mais do que lido, encantará de tal forma o leitor que este
mergulhará na vida de seu autor, já morto, e passará a reconstruir e a se
envolver com a história pessoal dele.
Uma história que se insere num dos momentos mais negros da política
portuguesa, em tempos de fascismo.
Descobrirá a resistência dos portugueses, à terrível ditadura de
Salazar, que durou mais de 40 anos, apequenou Portugal, torturou e matou
barbaramente. Mas a vida dos resistentes
era rica de coragem, amor, traição, renúncia, medo e convívio com a opressão e
a morte. Uma vida tão intensa e cheia de
nuances que toma de assalto a pacífica e rotineira vida intelectual do
professor.
É sobre esse processo de descoberta de uma identidade
fascinante, mas em tudo diferente da de Raimund, que se move toda a narrativa,
centrada na figura do protagonista suíço.
É ele quem vive, descobre, reflete, se relaciona com as pessoas. Natural que ele fale e pense em inglês. O filme, porém, é quase todo passado em
Lisboa e soa estranho que todas as falas, inclusive a dos portugueses entre si,
sigam sendo em inglês. Só em raros
momentos uma palavra em português aparece.
Essa é uma solução ruim para o filme.
Mas que não chega a comprometer, nem a narrativa, nem a produção bem
cuidada da fita.
O diretor Bille August não é um inovador, mas conduz
com segurança sua trama, apoiado num elenco espetacular. Além de Jeremy Irons, ótimo, temos Charlotte
Rampling, Bruno Ganz, Christopher Lee, Martina Gedeck, Mélanie Laurent. Ou seja, um super elenco que sustenta muito
bem essa aventura cheia de intrigas políticas e emocionais de “Trem Noturno
para Lisboa”. Quem gosta de acompanhar
um enredo atraente vai apreciar o filme.