Antonio Carlos Egypto
EO (Eo).
Polônia, 2022. Direção: Jerzy
Skolimowski. Elenco: Sandra Drzymalska,
Mateuz Koscivkiewicz, Lorenzo Zurzolo, Isabelle Hupert. 88 min.
“Eo”,
novo filme do veterano cineasta polonês Jerzy Skolimowski, é uma homenagem a um
clássico do diretor francês Robert Bresson (1901-1999) “A Grande Testemunha” (Au Hasard Balthazar), de 1966. Nos dois casos, o protagonista dos filmes é
um burro, ou jumento, e é por meio do que o animal vivencia que vemos o mundo,
tanto o dos seres humanos como o dos animais.
No
filme “Eo”, acompanhamos a vida errante e surpreendente do burro, que passa por
todo tipo de experiência com os humanos, desde a sua dona, uma jovem que é
afetiva, gosta dele e lhe dá carinho, até os que o tratam como burro de carga,
com chicotadas e crueldade. Resgatado,
junto com outros animais de um circo, por um grupo de ativistas que defendem os
bichos, sua vida, no entanto, não será de tranquilidade.
Colocado
marginalmente junto a outros animais, como cavalos de raça, representantes de
uma outra classe, ou junto a porcos ou cachorros indo para o abate, sua vida
não será fácil. Diante do abandono ou da
violência, Eo sai andando sem rumo, em busca de alguma outra coisa, o carinho
da dona, por exemplo. E testemunha todo
tipo de eventos, como corridas, exibições e brigas de torcidas de futebol, que
acabam por vitimá-lo. Ele apanha sem
motivo. Por ter sido adotado como
mascote por uma das torcidas, recebe o ódio da outra. Sobrevive e segue em frente, até onde as
circunstâncias permitirem.
Trata-se
de um road movie animal, o burro
percorre boa parte da Polônia e chega à Itália, passa por florestas, cidades,
campos, sendo levado por humanos ou indo por conta própria. Irrita-se, também, mas sua placidez e
inocência são as marcas mais evidentes do animal.
Jerzy
Skolimowski explora com muita beleza visual o mundo de Eo, seja o das árvores,
da água, da lama, do sangue, do firmamento, ou dos estábulos, ruas e outras
localidades da cidade. É um filme a um
tempo encantador, mas que também nos mostra o mundo tecnológico em que vivemos,
que não tornou o ser humano melhor ou mais compreensivo, embora haja muita
gente do bem por aí. Destaque para o
robô de quatro patas, que parece nos indicar um futuro estranho. Distópico.
Assustador. Ou atraente?
Seja
como for, “Eo” substitui o jumento Balthazar, do filme de Robert Bresson, que
era realista e realizado com grande rigor formal, dando espaço para uma
exploração visual mais livre e fantasiosa.
Com ótimo resultado, também.
“Eo”
foi apresentado em Cannes, premiado pelo Júri e indicado pela Polônia para a
disputa do Oscar de melhor filme internacional, ficando entre os finalistas.
Não
deixe de ver (ou rever) também o filme original de Bresson. Ele foi lançado em DVD pela Versátil, como “A
Grande Testemunha”. E você verá que o
simpático burrinho, exposto a tanto que ele não pode controlar, é uma figura
admirável, na sua simplicidade de um animal de menor porte e importância, que
nos inspira não só a respeitar todos os animais, mas a incluir os excluídos nos
direitos de todas as espécies. Ou seja,
valorizar a diversidade animal como se deve valorizar a diversidade humana.