BACURAU.
Brasil, 2018. Direção e roteiro:
Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles.
Com Sonia Braga, Udo Kier, Bárbara Colen, Thomás Aquino, Silvero
Pereira, Karine Teles, Antonio Saboia.
132 min.
“Bacurau”, o novo filme de Kleber Mendonça
Filho (de “O Som ao Redor”, 2013, e “Aquarius”, 2015) e Juliano Dornelles é um western brasileiro. Segue a trilha dos históricos “Deus e o Diabo
na Terra do Sol”, 1963, e “O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro”, 1969,
de Glauber Rocha (1938-1981). Filmes que
já se pautavam por grande força política e preocupação social, tentando
desvendar um universo nordestino, marcado pela violência opressora, de um lado,
e resistente, de outro. Dialoga também
com a produção nacional que sempre teve nos cangaceiros uma fonte de inspiração
permanente e oportunidade de pensar e de criar a partir da realidade do
nordeste brasileiro, para alcançar o país.
“Bacurau” incorpora novos elementos a tudo
isso. Tem invasores agressores e
poderosos. Que chegam a tirar o povoado
do mapa e produzem assassinatos aparentemente inexplicáveis, se valendo até de
drones com aspecto de disco voador.
Falam inglês, seu comandante é um alemão com pinta e comportamento de
nazista, e os colaboradores que atuam com eles falando português, além do
inglês, são desprezados e descartados na primeira oportunidade. Ou seja, estamos no terreno da alegoria
política, que soa tão atual, mas talvez seja mesmo uma constante da nossa
história. Até porque nada se nutre do
momento atual, embora pareça inspirado nele.
Percepção acurada? Premonição? Visão apurada do processo histórico, vista
da relação entre a casa- grande e a senzala e na dimensão internacional que as
envolve.
“Bacurau” mistura ação e reflexão no mesmo
produto. É um filme forte, intrigante,
provocador, mas é também uma aventura, muito envolvente. Por isso, pode ser visto como um filme de
gênero, embora não esteja preocupado em seguir cartilhas ou convenções. Fala ao sentimento do público, mostra uma
violência que tem de ser decifrada e que, afinal, nos leva a algumas
conclusões. Talvez distintas, para cada
grupo de espectadores. Mas que deve
mexer com todo mundo, de um jeito ou de
outro.
Um elenco enorme e dedicadíssimo a seus
personagens passa uma sensação de grande veracidade e nos remete a um mundo tão
familiar quanto parece distante. Sonia
Braga, como a dra. Domingas, reúne as dimensões da solidariedade e do
descontrole, a nos indicar a profunda humanidade da figura que encarna. Udo Kier é a maldade forasteira, mas também o
impasse e a solidão. Bárbara Colen faz
Teresa, mulher forte e lutadora. Os forasteiros colaboracionistas são
patéticos, mas a gente até se esquece disso porque Karine Teles e Antonio
Saboia nos conquistam pela qualidade de seus desempenhos. Thomás Aquino, como Pacote, e o inusitado
bandido local Lunga, papel de Silvero Pereira, nos mostram como é estar no fio
da navalha entre a fome e o crime. Todos
os personagens são bem construídos e têm um ator ou atriz à sua altura.
A trilha sonora é também bem marcante, vai de
Gal Costa e o objeto voador não-identificado a Geraldo Vandré, passando por
Sérgio Ricardo. Marcos reconhecíveis da resistência que marcou a nossa música e
o nosso cinema, que combinam bem com a temática tratada no filme.
A comunidade do povoado da Barra, no Rio
Grande do Norte, divisa com a Paraíba, onde a maior parte do filme foi gravada,
participou ativamente dos trabalhos de apoio à produção e como figurantes,
contribuindo para a autenticidade das situações mostradas.
“Bacurau” é um filme de peso da produção
brasileira recente, que já vem recebendo o maior reconhecimento internacional,
na forma de convites para mais de 100 festivais e mostras de cinema pelo mundo
e já com prêmios conquistados nos festivais de cinema de Munique,
na Alemanha, em Lima, no Peru, e o importante prêmio do Júri, do Festival de
Cannes.
“BACURAU”
ENTRA, EU SAIO
“Bacurau” entra nos cinemas na próxima 5ª.,
dia 29 de agosto, e eu saio em viagem por algumas semanas, dando uma folga para
vocês dos meus textos. Até breve!