domingo, 8 de maio de 2022

O TREM DA UTOPIA

Antonio Carlos Egypto

 

 



O TREM DA UTOPIA.  Brasil, Itália, 2021.  Direção: Beth Sá Freire e Fabrízio Mambro.  Documentário.  94 min.

 

 

O documentário “O Trem da Utopia”, primeiro longa de Beth Sá Freire e Fabrízio Mambro, focaliza o espírito italiano na cidade de São Paulo.  São 8 milhões de pessoas com sobrenome italiano vivendo em São Paulo, em que seus ancestrais, ou eles próprios, encontraram um porto seguro.  Ou nem tanto.  Na aventura pela integração e identidade a um outro mundo, passou-se pela miséria, pelo abuso, pela humilhação, pelo preconceito, pela fuga das guerras, da siciliana à Segunda Guerra Mundial. 

 

O fato é que esse espírito italiano invade o ambiente paulistano e se torna uma marca característica de sua história.  O filme enfatiza isso, ao promover, por meio de cortes rápidos, uma sucessão de imagens da capital paulistana com imagens de cidades da região Emília Romagna, que vai do Brás e do Bexiga a Campo de Fiore, em Roma, entre muitas outras.  Associando também Anita Garibaldi a Lina Bo Bardi, passando pela música, pelo futebol do Juventus, pela comida italiana, pela inevitável pizza napolitana, pelas manifestações artísticas inspiradas em Michelangelo, no Ibirapuera, e por aí vai.

 

Quem funciona como condutor nas andanças pela cidade e pela Itália é o músico e coralista Piero Damiani e, por meio de encontros, conversas e eventos, essa italianidade paulistana vai se mostrando, em seus anseios, buscas, preocupações, sentimentos de pertencimento e identidade dupla (brasileira/italiana).

 

Muitas questões são levantadas, inclusive uma bem sensível, já que as filmagens (ou grande parte delas) em São Paulo ocorreram entre o primeiro e o segundo turno da eleição de 2018.  Isso levantou o inevitável paralelo entre o momento brasileiro, extremamente preocupante, e o fascismo, que dominou a Itália na primeira metade do século XX, e está lá até hoje na memória, que deixou marcas profundas e desagregadoras.  A ideia de ter de viver uma experiência fascista no Brasil sugere a muitos a possibilidade de voltar. Fugir do fascismo, lá como cá?




A participação brasileira dos pracinhas na Itália, na Segunda Guerra Mundial, é relembrada com carinho pelos italianos da região de Monte Castello.  O que se tornou um símbolo da irmandade entre os dois países. 

 

Em que pese o volume de situações exploradas, o filme não chega a alcançar uma síntese.  Vale mais como um painel amplo e variado do recorte a que se propôs: a italianidade paulistana.

 

A produção é muito bem cuidada, o filme tem agilidade e variedade, explora o uso da palavra escrita junto com a imagem e faz um jogo espelhando São Paulo e Itália em diferentes aspectos.  Nem sempre a tradução está presente, quando se fala italiano e as palavras escritas estão em inglês.  Será preciso ao menos alguma familiaridade com um dos dois idiomas para acompanhar tudo o que é dito.  De qualquer modo, em bom cinema as imagens falam mais do que as palavras.

 


Um comentário:

  1. Apreciei a crítica do filme "O trem da Utopia", comentário sobre um assunto bem oportuno que a presença italiana em São Paulo. Eu próprio, pelo meu sobrenome, faço parte dessa grande comunidade e gostei de ler o texto.

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