Dicas de alguns filmes da 43ª. Mostra
Internacional de Cinema de São Paulo, que têm personagens consistentes, do
ponto de vista psicológico.
MENTE PERVERSA |
MENTE PERVERSA (Kopfplatzen). Alemanha,
2019. Direção e roteiro: Savas Ceviz.
Com Max Riemelt, Oskar Netzel, Isabell Gerschke. 99 min.
O filme alemão “Mente Perversa”, segundo longa
do diretor Savas Ceviz, é um trabalho absolutamente honesto e esclarecedor
sobre o tema da pedofilia. Ao tratar do
personagem Markus, que tem uma atração por crianças, meninos, que ele não
consegue controlar, embora tente desesperadamente, o filme deixa claros alguns
pontos importantes. Pedofilia é um
impulso, uma atração que não depende do sujeito. Não cabe culpa. É da ordem do desejo. A ação que pode decorrer desse desejo é o
abuso sexual, se considerarmos que as crianças estão vulneráveis diante dos
adultos. E abuso sexual é crime. Pedofilia, não, pelo menos enquanto
desejo. Infelizmente, confundem-se as
coisas, o que gera um estigma social violento, que não deixa saída para quem,
tendo essa atração, pretenda lidar melhor com ela, sem causar danos a
outros. Precisamos proteger as crianças,
por certo, mas também precisamos aprender a conviver com a diversidade humana,
por mais estranha que ela possa nos parecer.
O filme poderia ser chamado de mente aberta, já que promove uma empatia,
de forma competente e clara, com aquilo que nos é aversivo. Para tentar entender. O que é necessário. E aqui está tudo muito bem colocado e no tom
certo. Inclusive o atendimento
psicológico que o personagem recebe.
CICATRIZES (Savovi). Sérvia, 2019. Direção: Miroslav Terzic. Com Snezana Bogdanovic, Marco Bacovic, Jovana
Stojiljkovic. 97 min.
O que se vê no desenrolar do filme sérvio,
dirigido por Miroslav Terzic, em seu segundo longa, ambientado em Belgrado, são
as cicatrizes de um passado que move os personagens. Acompanhamos uma mulher, sua família, seu
trabalho, seus contatos. A cada
sequência nos deparamos com impropriedades.
As relações humanas são estranhas, pesadas, ásperas. Os comunicados, misteriosos ou simplesmente
lacônicos. Há perigos no ar. E vamos descobrindo, aos poucos, o que está
em jogo. Sem nunca entender muito bem do
que se trata. Até que, no terço final do
filme, a situação se esclarece. Mesmo
assim, não se resolve, porque é preciso encarar o que ficou para trás. Então, novas ações vão trazer uma nova configuração
ao conflito. Cicatrizes eternas, ao que
parece. Um belo trabalho dramático, com
um roteiro bem construído, que estimula o espectador a seguir a trama com
interesse. O tema abordado, que envolvle
maternidade, fatos e escolhas do passado, é bem relevante, do ponto de vista
psíquico.
CICATRIZES |
TEERÃ, CIDADE DO AMOR. Irã, 2018.
Direção: Ali Jaberansari. Com Forough
Ghajabeli, Mehdi Saki, Amir Hessan Bakhtiar.
102 min.
O filme aborda três diferentes personagens
vivendo em Teerã, que têm em comum a solidão, um desencanto com a vida e a
busca por amor. Uma busca um tanto
torta, envergonhada e, consequentemente, de baixa eficácia. Uma frustração amorosa, que também reflete a
inadequação dos personagens à sua própria vida.
Um ex-campeão de fisiculturismo que é treinador, uma secretária de
clínica de beleza, obesa, e um cantor religioso, que atua em funerais, compõem
esse trio. O interessante da proposta é
experimentar a empatia com pessoas que tentam, mas têm muita dificuldade de
encontrar seu rumo. Têm recursos
pessoais, mas se perdem pelos caminhos da cidade. Um trabalho sensível, do ponto de vista da
psicologia dos personagens. E que, pela
primeira vez no Irã, insinua desejo homossexual.
VIVER PARA CANTAR. China, 2019.
Direção e roteiro: Johnny Ma. Com
Zhao Xiaoli, Gan Guidan, Yan Xihu. 100
min.
Na China, que cresce e se transforna a olhos
vistos, como podem sobreviver as manifestações artísticas tradicionais, como a
lendária ópera chinesa? A partir de uma
trupe tradicional da ópera, vivendo numa pequena cidade, com espectadores fiéis,
o filme mostra a decadência do gênero, agora com um público idoso, cada vez
menor, sem apoio legal e sem recursos. A
trupe faz da ópera chinesa sua razão de existir. Toda a energia psíquica está
dirigida para a arte, que é também meio de subsistência, mesmo que difícil. E
se decepciona com os concorrentes da troca
de máscaras e panela quente ou das casas de dança erotizadas. A demolição do teatro, assim como de todo o
terreno que o cerca, representa o desmanche da cultura tradicional e a falta de
apoio governamental nos tempos atuais.
No caso, porém, parece que é o nada, ou a imaginação, que ocuparão o
lugar da beleza característica dos trajes, tipos de músicas que marcam a
história dessa ópera tradicional, ou mesmo já modernizada. Segundo longa do
diretor Johnny Ma.
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