terça-feira, 15 de outubro de 2019

DICAS DA MOSTRA 43

Antonio Carlos Egypto


Dicas de alguns filmes da 43ª. Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, que têm personagens consistentes, do ponto de vista psicológico.



MENTE PERVERSA

MENTE PERVERSA (Kopfplatzen).  Alemanha, 2019.  Direção e roteiro:  Savas Ceviz.  Com Max Riemelt, Oskar Netzel, Isabell Gerschke. 99 min.
O filme alemão “Mente Perversa”, segundo longa do diretor Savas Ceviz, é um trabalho absolutamente honesto e esclarecedor sobre o tema da pedofilia.  Ao tratar do personagem Markus, que tem uma atração por crianças, meninos, que ele não consegue controlar, embora tente desesperadamente, o filme deixa claros alguns pontos importantes.  Pedofilia é um impulso, uma atração que não depende do sujeito.  Não cabe culpa.  É da ordem do desejo.  A ação que pode decorrer desse desejo é o abuso sexual, se considerarmos que as crianças estão vulneráveis diante dos adultos.  E abuso sexual é crime.  Pedofilia, não, pelo menos enquanto desejo.  Infelizmente, confundem-se as coisas, o que gera um estigma social violento, que não deixa saída para quem, tendo essa atração, pretenda lidar melhor com ela, sem causar danos a outros.  Precisamos proteger as crianças, por certo, mas também precisamos aprender a conviver com a diversidade humana, por mais estranha que ela possa nos parecer.  O filme poderia ser chamado de mente aberta, já que promove uma empatia, de forma competente e clara, com aquilo que nos é aversivo.  Para tentar entender.  O que é necessário.  E aqui está tudo muito bem colocado e no tom certo.  Inclusive o atendimento psicológico que o personagem recebe.

CICATRIZES (Savovi).  Sérvia, 2019.  Direção: Miroslav Terzic.  Com Snezana Bogdanovic, Marco Bacovic, Jovana Stojiljkovic. 97 min.
O que se vê no desenrolar do filme sérvio, dirigido por Miroslav Terzic, em seu segundo longa, ambientado em Belgrado, são as cicatrizes de um passado que move os personagens.  Acompanhamos uma mulher, sua família, seu trabalho, seus contatos.  A cada sequência nos deparamos com impropriedades.  As relações humanas são estranhas, pesadas, ásperas.  Os comunicados, misteriosos ou simplesmente lacônicos.  Há perigos no ar.  E vamos descobrindo, aos poucos, o que está em jogo.  Sem nunca entender muito bem do que se trata.  Até que, no terço final do filme, a situação se esclarece.  Mesmo assim, não se resolve, porque é preciso encarar o que ficou para trás.  Então, novas ações vão trazer uma nova configuração ao conflito.  Cicatrizes eternas, ao que parece.  Um belo trabalho dramático, com um roteiro bem construído, que estimula o espectador a seguir a trama com interesse.  O tema abordado, que envolvle maternidade, fatos e escolhas do passado, é bem relevante, do ponto de vista psíquico.


CICATRIZES



TEERÃ, CIDADE DO AMOR.  Irã, 2018.  Direção: Ali Jaberansari.  Com Forough Ghajabeli, Mehdi Saki, Amir Hessan Bakhtiar.  102 min.
O filme aborda três diferentes personagens vivendo em Teerã, que têm em comum a solidão, um desencanto com a vida e a busca por amor.  Uma busca um tanto torta, envergonhada e, consequentemente, de baixa eficácia.  Uma frustração amorosa, que também reflete a inadequação dos personagens à sua própria vida.  Um ex-campeão de fisiculturismo que é treinador, uma secretária de clínica de beleza, obesa, e um cantor religioso, que atua em funerais, compõem esse trio.  O interessante da proposta é experimentar a empatia com pessoas que tentam, mas têm muita dificuldade de encontrar seu rumo.  Têm recursos pessoais, mas se perdem pelos caminhos da cidade.  Um trabalho sensível, do ponto de vista da psicologia dos personagens.  E que, pela primeira vez no Irã, insinua desejo homossexual.

VIVER PARA CANTAR.  China, 2019.  Direção e roteiro: Johnny Ma.  Com Zhao Xiaoli, Gan Guidan, Yan Xihu.  100 min.
Na China, que cresce e se transforna a olhos vistos, como podem sobreviver as manifestações artísticas tradicionais, como a lendária ópera chinesa?  A partir de uma trupe tradicional da ópera, vivendo numa pequena cidade, com espectadores fiéis, o filme mostra a decadência do gênero, agora com um público idoso, cada vez menor, sem apoio legal e sem recursos.  A trupe faz da ópera chinesa sua razão de existir. Toda a energia psíquica está dirigida para a arte, que é também meio de subsistência, mesmo que difícil. E se decepciona com os concorrentes da troca de máscaras e panela quente ou das casas de dança erotizadas.  A demolição do teatro, assim como de todo o terreno que o cerca, representa o desmanche da cultura tradicional e a falta de apoio governamental nos tempos atuais.  No caso, porém, parece que é o nada, ou a imaginação, que ocuparão o lugar da beleza característica dos trajes, tipos de músicas que marcam a história dessa ópera tradicional, ou mesmo já modernizada. Segundo longa do diretor Johnny Ma.


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