quinta-feira, 23 de novembro de 2023

MONSTER

Antonio Carlos Egypto

 

 


MONSTER (Kaibutsu).  Japão, 2023.  Direção: Hirokazu Kore-Eda.  Elenco: Sakura Ando, Eita Nagayama, Soya Kurokawa, Hirata Hiragi.  126 min.

 

Kore-Eda é o mais criativo e autoral cineasta japonês em atividade.  Seu mais recente trabalho, “Monster”, recebeu o prêmio de melhor roteiro, de Sakamoto Yuji, em Cannes. O filme também marcou o último trabalho musical de Ryuichi Sakamoto, falecido em março último.

 

E, afinal, quem é o monstro?  Pergunta cantada e reiterada ao longo da narrativa do filme, especialmente pelas crianças.  Tratada com muita dificuldade, como tema sério, pelos adultos.  Monstruosidades são percebidas pelos outros, por nós mesmos, pelo contexto que as cria e alimenta.  Mas essa não é verdadeiramente a questão.  É só o invólucro de um conjunto de coisas muito maior. Que envolve um grande número de emoções, diversas e conflitantes, que vão da rejeição à violência, passando pela ternura, pela amizade, pelo desejo que surge e também pela incapacidade quanto ao enfrentamento dos problemas.

 

Duas crianças, dois meninos, com destaque para o desempenho de Soya Kurokawa como Minato, protagonizam uma história que inclui bullying e violência na escola fundamental, mexe com a mãe de um deles e as acusações que são lançadas contra um professor. Há histórias pessoais estranhas que envolvem a diretora do estabelecimento escolar.

 

A forma como essas coisas são apresentadas em reuniões do colégio, em que professores, a diretora e a mãe, estão conectados nos revela um grande problema. Não há enfrentamento das questões, apenas desculpas e reverências, para que tudo fique como está.  Ou seja, curvar-se e pedir desculpas formalmente, sem admitir e muito menos tentar resolver o problema.

 


Enquanto isso, as crianças se estranham, se provocam e rejeitam umas às outras, ao mesmo tempo em que se aproximam, se tornam amigas, mesmo tendo de esconder essa amizade.  E exploram seus medos e suas fantasias, entre elas as das perdas e da morte.

 

É dentro de um clima que exala sensibilidade, ternura, compaixão e esperança, que circulam as crianças, numa narrativa poética e humanista.  Um filme para fruir, se deixar levar pelo cotidiano desse universo escolar, que os personagens infantis transcendem, e os personagens adultos acabarão por se entender também, de algum modo.

 

Sem esquematismos, sem soluções fáceis, mas também sem investir no drama insolúvel ou na tragédia, “Monster” tem leveza e frescura ao falar das monstruosidades que nos assustam e que estão logo ali, ao virar a esquina.  Mais um grande filme de Kore-Eda, que já nos deu “O Que Eu Mais Desejo” de 2011, “Pais e Filhos”, de 2013, “Nossa Irmã Mais Nova”, de 2015, “Depois da Tempestade’, de 2016, “Assunto de Família”, de 2018, “Broker, Uma Nova Chance”, de 2022, entre outros.  Uma filmografia notável.



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