Antonio Carlos Egypto
MONSTER
(Kaibutsu). Japão, 2023.
Direção: Hirokazu Kore-Eda.
Elenco: Sakura Ando, Eita Nagayama, Soya Kurokawa, Hirata Hiragi. 126 min.
Kore-Eda
é o mais criativo e autoral cineasta japonês em atividade. Seu mais recente trabalho, “Monster”, recebeu
o prêmio de melhor roteiro, de Sakamoto Yuji, em Cannes. O filme também marcou
o último trabalho musical de Ryuichi Sakamoto, falecido em março último.
E,
afinal, quem é o monstro? Pergunta
cantada e reiterada ao longo da narrativa do filme, especialmente pelas
crianças. Tratada com muita dificuldade,
como tema sério, pelos adultos.
Monstruosidades são percebidas pelos outros, por nós mesmos, pelo contexto
que as cria e alimenta. Mas essa não é
verdadeiramente a questão. É só o
invólucro de um conjunto de coisas muito maior. Que envolve um grande número de
emoções, diversas e conflitantes, que vão da rejeição à violência, passando
pela ternura, pela amizade, pelo desejo que surge e também pela incapacidade
quanto ao enfrentamento dos problemas.
Duas
crianças, dois meninos, com destaque para o desempenho de Soya Kurokawa como Minato,
protagonizam uma história que inclui bullying
e violência na escola fundamental, mexe com a mãe de um deles e as acusações
que são lançadas contra um professor. Há histórias pessoais estranhas que
envolvem a diretora do estabelecimento escolar.
A
forma como essas coisas são apresentadas em reuniões do colégio, em que
professores, a diretora e a mãe, estão conectados nos revela um grande
problema. Não há enfrentamento das questões, apenas desculpas e reverências,
para que tudo fique como está. Ou seja,
curvar-se e pedir desculpas formalmente, sem admitir e muito menos tentar
resolver o problema.
Enquanto
isso, as crianças se estranham, se provocam e rejeitam umas às outras, ao mesmo
tempo em que se aproximam, se tornam amigas, mesmo tendo de esconder essa
amizade. E exploram seus medos e suas
fantasias, entre elas as das perdas e da morte.
É
dentro de um clima que exala sensibilidade, ternura, compaixão e esperança, que
circulam as crianças, numa narrativa poética e humanista. Um filme para fruir, se deixar levar pelo
cotidiano desse universo escolar, que os personagens infantis transcendem, e os
personagens adultos acabarão por se entender também, de algum modo.
Sem
esquematismos, sem soluções fáceis, mas também sem investir no drama insolúvel
ou na tragédia, “Monster” tem leveza e frescura ao falar das monstruosidades
que nos assustam e que estão logo ali, ao virar a esquina. Mais um grande filme de Kore-Eda, que já nos
deu “O Que Eu Mais Desejo” de 2011, “Pais e Filhos”, de 2013, “Nossa Irmã Mais
Nova”, de 2015, “Depois da Tempestade’, de 2016, “Assunto de Família”, de 2018,
“Broker, Uma Nova Chance”, de 2022, entre outros. Uma filmografia notável.
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