quinta-feira, 10 de novembro de 2022

MEU BALANÇO DA # 46 MOSTRA

Antonio Carlos Egypto

 



A principal coisa a comentar sobre a 46ª. Mostra Internacional de Cinema em São Paulo é aplaudir o fato de ela ter acontecido.  Em meio a um clima desfavorável, por parte de um governo federal que desestimulava e combatia a cultura, sem patrocínio oficial de órgãos do Estado, foi uma vitória a ser celebrada.  Outra vitória foi celebrada durante a Mostra: a da democracia, no dia 30 de outubro, com a programação ainda em andamento.  Espero que para os próximos anos a Mostra possa continuar e contar com mais apoios e incentivos oficiais, considerando um novo governo que valoriza ações culturais como essa.  E sabe avaliar a sua importância.

 

Depois de 2 anos com prevalência da epidemia de Covid-19, em que eu acompanhei a Mostra on line, desta vez assisti presencialmente a mais de 50 filmes, além de 3 ou 4 on line.  Entre 15 de outubro e 04 de novembro, por meio de 10 postagens, comentei aqui 25 filmes, dentre os que mais me interessaram ou de que mais gostei.  Ou seja, mais ou menos metade do que eu pude ver.  Claro que uma parte dos filmes não comentados, de fato, não chegaram a me entusiasmar.  Outros, no entanto, eu gostaria de nomear aqui, recomendando que, se puderem ver em exibições no cinema ou por outros meios, creio que serão apreciados.

 

NOITE EXTERIOR


Começo com um filme que, na verdade, é uma série, 2 filmes compondo 6 episódios: NOITE EXTERIOR, partes I e II, de Marco Bellocchio.  Aqui, ao longo de quase 6 horas, se esquadrinha a história que envolveu o sequestro e assassinato do dirigente da Democracia Cristã e ex-Primeiro Ministro Aldo Moro, que estava em vias de assumir a presidência da Itália em 1978.  O tema já havia sido tratado por Bellocchio no filme “Bom-dia, Noite”.  Para quem gosta de série, um prato cheio.  Confesso que não sou fã.  Para mim, o tempo foi excessivo, embora ele tenha explorado bem os diversos grupos envolvidos na história: o governo de então, o Partido Democrata Cristão, o Papa Paulo VI e o Vaticano, as Brigadas Vermelhas, a família de Moro e a sociedade da época.

 

Outro belo filme que merece ser visto é BARDO, FALSA CRÔNICA DE UMAS TANTAS VERDADES, de Alejandro Iñarritu, com um personagem fascinante, jornalista mexicano, que vive sua crise existencial, reflete sobre a vida, identidade, lutas, relações e lembranças que o enlouquecem.  Filmado de forma moderna, feérica, é um filme envolvente.  Muito bem feito.

 

BARDO


Também gostei de AS OITO MONTANHAS, um filme italiano, dirigido por um casal de belgas, Felix Van Groeningen e Charlotte Vandermeersch, que é um trabalho tocante sobre amizade entre dois homens distintos, que têm em comum a vivência, eventual para um, constante, para outro, da vida nas montanhas.

 

De Cláudia Varejão, de Portugal, gostei também de LOBO E CÃO, em que uma pequena ilha no Oceano Atlântico, marcada pela religião e pelas tradições, tem de conviver, de algum modo, com o mundo queer dos tempos atuais.  A cena da procissão, em que rapazes super enfeitados participam, vale o filme.  Num outro registro, o filme português A NOIVA, de Sérgio Tréfaut, também pode ser lembrado.  Muito sofrido, mas abordando questões relevantes, vividas num campo de prisioneiros do Iraque por uma adolescente que se casa com um guerrilheiro Daesh, que está para ser executado.

 

Um filme curioso e provocador é o alemão PIAFFE, sobre um rabo de cavalo, de verdade, que se desenvolve no corpo de uma mulher.  Fala de submissão feminina de forma alegórica.  Tem uma qualidade de som espetacular, a personagem principal trabalha como sonoplasta, o que por si só vale a ida ao cinema.  É um filme para poucos da diretora israelense Ann Oren, mas por que não experimentar algo diferente?

 

AFTERSUN, do Reino Unido, de Charlotte Wells, venceu o prêmio do Júri da Mostra, de novos diretores. Apresenta uma narrativa inteiramente centrada na relação de um pai de 30 anos com a filha de 11, que acontece num pacote de férias na Turquia. Por meio de pequenos momentos, rotinas de lazer, contatos que surgem, detalhes de todo tipo, com inteligência e perspicácia, vamos percebendo o que está em jogo nessa relação não habitual, já que eles não vivem juntos. Há muito afeto e frustração no ar. E muita fluidez numa trama ao mesmo tempo simples e complexa.

 

AFTERSUN


Em apresentação especial, vi 2 filmes de Jean Eustache, A MÃE E A PUTA e MEUS PEQUENOS AMORES, dos anos 1970, que dialogam com a nouvelle vague francesa.  São trabalhos muito interessantes, do cotidiano real, embora A MÃE E A PUTA se alongue demais.  A meu ver, sem a menor necessidade disso. 

 

Por fim, gostaria de comentar sobre um número grande de filmes da Mostra de longa duração.  Surpreendeu-me negativamente, já que poucas vezes se justifica essa longa duração, especialmente quando importam mais os climas, os personagens, as questões maiores, do que o enredo em si.  A longa duração pouco acrescentou, se é que tenha acrescido algo de relevante.  Geralmente, não é por causa dessa duração que o filme é bom, mas apesar dela.

 

@mostrasp



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