quarta-feira, 26 de agosto de 2015

HOMEM IRRACIONAL


Antonio Carlos Egypto




HOMEM IRRACIONAL (Irrational Man).  Estados Unidos, 2015.  Direção e roteiro: Woody Allen.  Com Joaquin Phoenix, Emma Stone, Parker Posey, Jamie Blackley, Tom Kemp.  96 min.


Woody Allen, em seu novo filme, cria um personagem que representa o protótipo do homem racional, como nós costumamos nos chamar, para nos distinguir do resto dos animais.  Abe Lucas (Joaquin Phoenix) é filósofo, professor universitário, com um pensamento inovador e radical.  Chamado a lecionar numa universidade de uma cidade pequena dos Estados Unidos, ele se destaca como uma celebridade intelectual.  Apesar de ser triste, desanimado com a vida, pouco sociável e até mesmo, impotente.

Essas características associadas ao intelectual já dão a pista do que Allen quer discutir: até que ponto pode chegar o ser humano mais ilustrado e sofisticado, para reencontrar o prazer de viver? 




Um impulso vital, total e completamente irracional, pode ser capaz de modificar uma pessoa que passou a vida estudando, tentando compreender a existência e se valendo do espírito crítico?  Somos frágeis ao ponto de nos deixar dominar por pulsões primitivas que nos associem  mais ao homem das cavernas do que ao moderno homem urbano, culto e refinado?

Ou, por outro lado, nossa racionalidade pode se colocar ao lado do impulso e guiá-lo rumo à “justiça” pelas próprias mãos, ignorando qualquer sentido coletivo?  Ou seja, mais do que simplesmente racionalizar algo, podemos criar verdadeiras filosofias que acabem por levar a um crime sem culpa? Pior, um crime visto como justo, reparador e necessário?




Como se pode ver, não é pouca coisa que se pode extrair de “Homem Irracional”, de Woody Allen.  Acompanhar a trajetória desse intelectual nessa sua carreira universitária no interior, que acaba por abrir-lhe uma perspectiva nunca antes imaginada, e muito menos vivida, nos coloca diante de uma questão que assusta.  E surpreende, vindo de quem vem.  Por isso, esses questionamentos se colocam.
A relação do professor com uma aluna jovem e brilhante, cheia de sagacidade e esperteza, Jill (Emma Stone), faz o contraponto preciso do ponto de vista ético.  E mostra também do que é capaz o afeto, além da disponibilidade para ouvir e se colocar no lugar do outro.  Para o bem e para o mal.

A outra relação, paralela, que acontece entre Abe e outra professora, Rita (Parker Posey), que dá em cima dele sexualmente, também se coloca no terreno dos desejos e instintos.  Portanto, fora do campo racional.  E entre doutores.




Somos seres tão irracionais quanto somos racionais.  Essa é uma das tragédias do ser humano.  O viver racional é limitado, insuficiente, não importa quanta sofisticação intelectual possa ser agregada a ele.  No domínio do irracional, podemos perder totalmente o controle e sucumbir diante do que não podemos dominar, por mais que tentemos. 

Refletir sobre essas coisas todas por meio do cinema de Woody Allen é uma delícia.  Uma filmagem leve, bem humorada, com bons desempenhos dos atores e atrizes, e sempre uma trilha sonora que é um primor de bom gosto, é o que nos espera.  E o filme, com certeza, não acaba quando termina.  Fica germinando na nossa mente.


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