Antonio Carlos Egypto
AZUL É A COR MAIS QUENTE (La vie d’Adèle – Chapitre 1& 2).
França, 2013. Direção:
Abdellatif Kechiche. Com Adèle
Exarchopoulos, Léa Seydoux, Salim Kechiouche, Jérémie Laheurte, Catherine
Salée. 179 min.
“Azul é a Cor Mais Quente”, o filme francês inspirado
numa história em quadrinhos para adultos, foi o vencedor do Festival de Cannes
2013, recebendo a Palma de Ouro como melhor filme. Evidentemente, essa credencial aumenta a
expectativa frente à película. Isso, em
geral, acaba produzindo algumas decepções.
Porque, quando se espera muito, é difícil que o produto corresponda às
nossas exigências imaginárias. O filme,
“La Vie d’Adèle” no original, é um bom trabalho do diretor franco-tunisiano
Abdellatif Kechiche (de “O Segredo do Grão”, de 2008), mas não chega a
empolgar.
Adèle (Adèle Exarchopoulos) é uma jovem de 15 anos
descobrindo a sexualidade e o amor. Como qualquer adolescente nos dias de hoje,
ela faz suas experiências. Primeiro, com
um rapaz gentil e carinhoso, mas não se envolve com ele. Experimenta um beijo de amor com uma colega e
se sente atraída por ela. Mas não será
correspondida aí.
No entanto, essa experiência encontrará terreno
fértil com uma outra garota, essa mais velha e bem mais experiente, que ela
encontrará num ambiente gay. Ela está lá por acaso, já que tem um grande
amigo e confidente que é homossexual. O
fato é que algo muito importante para ela vai acontecer a partir daí. A garota experiente, Emma (Léa Seudoux), tem
cabelos pintados de azul, o que lhe confere um charme especial, na visão de
Adèle, além de vir de um círculo social e intelectual superior.
A história de amor, tesão e conflitos, entre Adèle e
Emma é o foco central do filme. O
diretor gosta de trabalhar longamente as cenas, não se preocupa em abreviar a
sequência, quando o que queria mostrar já está claro. Dá tempo para a situação se revelar um pouco
mais, calmamente. Isso torna seus
filmes, obviamente, mais longos. Este
tem três horas de duração, desnecessárias para contar a história que conta e,
mesmo, para enfatizar os sentimentos e expressões envolvidos, como ele faz,
usando fartamente a câmera muito perto do rosto das atrizes que protagonizam a
trama e dos atores que entram como coadjuvantes.
Adèle vai trabalhar como professora numa escola de
crianças e Kechiche se detém em aulas, exercícios e, principalmente, na forma
afetiva e acolhedora como ela trabalha.
A vida na escola e as conversas com as colegas e amigos também se
prolongam algumas vezes, assim como contatos familiares, refeições, etc.
Evidentemente, o que chama mais atenção são as cenas
de sexo entre Adèle e Emma. A principal
delas se alonga por mais de seis minutos bastante explícitos, com uma exposição
farta dos corpos das atrizes. Mas há
outras, menores, muitos beijos, e a exposição de Adèle nua, ao ser pintada por
Emma. O amor físico entre as duas é
mostrado com exuberância e sem pressa.
O diretor, questionado quanto a isso, explica que
esse é seu ritmo de filmar e pode estranhar às pessoas acostumadas a outros
ritmos, mas que ele não segue os ditames esperados. Quanto à debatida cena de sexo, o que ele
responde é que o amor tem um lado físico que é importante e tem de ser
mostrado, mas que seu objetivo foi focalizar o amor radical entre as garotas. E
mostrar a homossexualidade como algo corriqueiro, banal, até.
Bons propósitos, sem dúvida. Mas sabe-se que não é assim tão fácil, nem simples,
no contexto social. O próprio filme mostra que Adèle não conta a seus pais
sobre seu enamoramento homossexual. E que ela é pressionada e criticada pelas
amigas, quando percebem o caso. Só que
nem uma coisa nem outra são exploradas depois disso. Os conflitos potenciais somem, a ponto de
desaparecerem as cenas familiares e escolares dela, a partir de então. Um providencial salto no tempo se encarrega
de deixar para trás tais situações. Nos
ambientes em que Emma convive, tudo é tranquilo, inclusive na família
dela. Sinais de evolução civilizatória
nas camadas de nível mais elevado?
Para quem levou três horas para desenvolver a trama
do filme, não se entende que esses conflitos tenham sido postos de lado. Pode ser um desejo de que o tema da
homossexualidade seja tratado como algo trivial, mas isso ainda não faz parte
da realidade, infelizmente.
Claro que o que mais importa é como se estabelece, se
desenvolve e se resolve o caso amoroso entre Adèle e Emma, que poderia ser
entre um homem e uma mulher ou entre dois homens. Porque a homossexualidade não
é o que explica, determina ou desmancha esse amor. Mas ignorar que o componente homossexual
tenha, ainda, um peso diferencial, me parece algo idealizado.
A jovem atriz Adèle Exarchopoulos, de 19 anos, que
faz sua xará personagem, segura uma barra pesada, para uma estreante. Está em foco todo o tempo, passa por um
turbilhão de sensações e emoções e se expõe com coragem. Dá bem conta do recado. Léa Seydoux, atriz já
experiente, também merece destaque, fazendo uma Emma forte, decidida,
intelectualizada, exibindo seu corpo e seus cabelos azuis em grande parte do
filme. Mostra talento e firmeza na
condução do personagem. Ambas também receberam prêmios em Cannes.
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