Antonio Carlos Egypto
ANORA |
ANORA, produção
estadunidense, dirigida por Sean Baker, chega à Mostra 48 com a chancela da
Palma de Ouro no Festival de Cannes. Mas
a gente se surpreende com essa escolha.
A história envolve uma prostituta do Brooklin que vê a chance de mudar
de vida ao se casar em Las Vegas com o filho de um oligarca russo, totalmente
sem noção, que queima dinheiro nos Estados Unidos em sua temporada por lá, e se
comporta como um tresloucado, obcecado pelos prazeres do sexo, recém
descobertos. Claro que seu “casamento”
será posto à prova pela família do “noivo”.
E a profissional do sexo, naturalmente, lutará para mantê-lo. O filme é uma comédia amalucada, em
que os excessos estão visíveis:
quebradeiras, gritarias, xingamentos, vômitos, destruições. Há que se reconhecer que a comédia funciona,
produz risadas, tem sacadas interessantes aqui e ali, mas, no conjunto, beira o
nada. O que terá acontecido com o
Festival de Cannes? Não tinha nada
melhor para premiar? 138 min.
O PIOR HOMEM DE LONDRES é uma
produção portuguesa, dirigida por Rodrigo Areias, que tem outros filmes na
Mostra, falada em inglês e também em francês, italiano e até português. Passa-se na Londres vitoriana, ao tempo de
Napoleão III, e retrata o que poderíamos chamar de um vilão perfeito. Charles Augustus Howell, português radicado
em Londres, agenciador de artistas, negociante de arte, agente secreto,
chantagista, escroque, trapaceiro.
Merece muitos adjetivos na sua arte de envolver, manipular, roubar com
sagacidade, mentir, destruir pessoas e reputações. Enfim, o tipo é tão
execrável que Arthur Conan Doyle o chamou conforme o título do filme e fez dele
personagem nas histórias de Sherlock Holmes.
Quanto ao filme, demora para engrenar, ao mostrar as aparências, as
filigranas, mesuras e falsidades do comportamento das elites, até chegar à
essência do vilão. A direção de arte fez
uma boa caracterização de época e o filme vai ganhando interesse aos
poucos. Por vezes, perde o foco,
mereceria uma edição mais enxuta. A
narrativa é linear, clássica. 130 min.
O PIOR HOMEM DE LONDRES |
VOCÊ ME QUEIMA (Tú Me Abrasas),
dirigido por Matias Piñero, da Argentina, é um filme pretensioso e
intelectualizado. A antiga poeta grega Safo e a ninfa Britomartis conversam à
beira-mar sobre amor e morte, a partir da adaptação de um capítulo do livro
“Diálogo com Leucó”, de Cesare Pavese.
São citadas inúmeras vezes frases com fragmentos dos poemas de Safo, que
foram recuperados, para além da única poesia que se conhece dela. O filme trabalha manipulando o livro e
fazendo anotações nele, reproduzindo também imagens, com destaque para o mar,
alternando com o texto. Literário
demais, acadêmico, sem ritmo. Vai
interessar a muito pouca gente, creio eu.
64 min.
HANAMI é também uma produção
portuguesa (e de Cabo Verde), dirigida por Denise Fernandes. Leva-nos a uma ilha vulcânica distante, de
onde todos querem partir, como Nia, a mãe de Nana, o fez, por exemplo. Quando ela retorna, vários anos depois, com
Nana já adolescente, esta prefere ficar, demonstrando ter aprendido a amar a
ilha, mesmo sem conseguir expressar isso emocionalmente. O filme vai mostrando o ambiente, as características,
objetos e elementos culturais do lugar,
sem se deter muito no foco principal da história. Que, na verdade, é apenas um
fio de história. A locação de natureza é
bonita, atraente, já o filme flui vagarosamente, sem conseguir envolver muito o
espectador. Competição Novos Diretores. 96 min.
QUANDO A LUZ ARREBENTA |
QUANDO A LUZ ARREBENTA (When the Light Breaks),
produção da Islândia, dirigida por Rúnar Rúnarsson, focaliza os sentimentos
profundos que não podem ser expressos por circunstâncias que estão acima de uma
decisão pessoal. Os jovens Una e Diddi
estão secretamente apaixonados e se encontram sem que Klara, a namorada dele e
amiga de ambos, saiba disso. Diddi está
disposto a resolver esta questão, rompendo com Klara, e promete isso a
Una. Mas um acidente terrível impedirá
que isso aconteça, tirando-lhe a vida.
Para Una, as consequências irão muito além da dor e do luto, alcançando
todo o grupo de amigos com quem ela convive, sem permissão para expressar o que
sente, consolar e ser consolada, na dimensão do que seria necessário. O filme expõe essa condição de opressão
interior de Una o tempo todo, sem nunca perder o foco. Talvez pudesse ampliar a compreensão do
problema, superando a questão individual, relacionando-o à sociedade e à vida
dos jovens, num sentido mas geral. Mas é
um trabalho honesto e envolvente. 82
min.
@mostrasp #mostrasp
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