quarta-feira, 25 de setembro de 2024

PINOCHET 2

Antonio Carlos Egypto

 

Dois filmes em cartaz nos cinemas refletem o que foi a sangrenta ditadura militar chilena, comandada pelo general Augusto Pinochet, de 1973 a 1990, enquanto o Brasil enfrentava sua longa, e também sangrenta, ditadura militar, de 1964 até 1985.

 


Em PRISÃO NOS ANDES (Penal Cordillera), produção chilena de 2023, o diretor Felipe Carmona mostra uma prisão especial a céu aberto, na Cordilheira dos Andes, que abrigava cinco oficiais militares julgados e condenados por crimes de lesa humanidade como cruéis torturadores do regime de Pinochet, que censurou, perseguiu, torturou e matou militantes de esquerda, participantes e simpatizantes do governo de Salvador Allende, artistas e outros.  Lá eles estão “vigiados” por guardas que, na prática, estão tão presos quanto eles e que acabam funcionando até como empregados deles.  Porque os antigos chefões continuam se sentindo e agindo como se pudessem contar com o mesmo poder de que dispunham até a queda do regime e esperando voltar a qualquer momento.  Ou seja, na base do quem foi rei nunca perde a majestade.  Ou, melhor dizendo, opressores cruéis serão sempre opressores cruéis, se assim puderem agir, mesmo na cadeia.  O mérito de Felipe Carmona é mostrar o cotidiano dessa prisão “especial” injustificada, depois de tudo o que o Chile viveu com essas figuras.  Além de privilégios e benesses inaceitáveis da tal prisão.  No entanto, a exploração dessa questão não é aprofundada no filme, os personagens militares não são bem desenvolvidos, algumas situações soam artificiais, gratuitas ou sem relação direta com o tema.  Faltou amarrar as pontas, integrar a narrativa.  No elenco: Andrew Bargsted, Hugo Medina, Bastián Bodenhöfer.  104 min.

 



Em AINDA SOMOS OS MESMOS, produção brasileira de 2024, dirigida por Paulo Nascimento, rodada no Chile e no Brasil, utilizam-se relatos reais como o de um militante da VPR (Vanguarda Popular Revolucionária), que ficou 42 dias abrigado na Embaixada da Argentina, em Santiago, para poder sobreviver naquele momento em que, em qualquer lugar do país, no ano de 1973, quando se passa a ação, o perigo era total e a morte política estava à espreita.  O jovem Gabriel (Lucas Zaffari) vai ao Chile, como muitos brasileiros na época, incluindo exilados, buscar a democracia e a liberdade do governo popular de Allende e encontrará lá, um pouco depois, uma repressão monstruosa.  O pai Fernando (Edson Celulari) empresário figurão e colaborador do regime brasileiro até ajuda o filho, a contragosto, a sair do país, mas sobrará para ele a missão de resgatar Gabriel em plena Embaixada Argentina em Santiago, negociando com os militares daqui e de lá.  A situação é toda tensa e dramática, mas o filme não consegue atingir tal nível emocional, exceto em alguns poucos momentos.  A centralidade do papel do empresário, numa história vivida e manejada pelo jovem filho militante da esquerda, não contribuiu para isso.  Se a intenção era destacar, explicar, o papel da sociedade civil na ditadura militar, não funcionou.  O papel de Fernando, embora bem interpretado por Edson Celulari, não dá conta disso.  Deixa, inclusive, confuso esse papel e as relações que sustentam esses vínculos, tanto internos quanto externos. 90 min.

 

É importante resgatar essas histórias do período das ditaduras latino-americanas.  Um pouco depois, essa Argentina acolhedora da Embaixada viveria drama idêntico e maior, até, com seus militares, as Madres de Mayo  em busca de desaparecidos e tudo o que sabemos.  A guerra fria mostrou-se bem quente e coordenada por aqui. Muito já se falou e ainda há muito a dizer, compreender e reparar, sobre esse período histórico.  Mas isso não basta, precisamos de filmes intensos, emocionantes, bem elaborados, criativos, para contribuir para que essa história, de fato, nunca mais se repita.  




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