Antonio Carlos Egypto
Um
personagem incrível, universalmente conhecido, vivendo aventuras fantásticas,
nasceu da pena do escritor italiano Carlo Collodi, no final do século XIX: Pinocchio. O boneco de madeira que aspirava humanizar-se,
sem ser capaz de se comportar à altura desse desafio, por desobediência e
ingenuidade quanto aos demais, cujo nariz crescia frente às mentiras que
proferia para se explicar, se defender ou fazer algo que desejava, e que tinha
como conselheiro o Grilo Falante, já foi tantas vezes revisitado e
reinterpretado desde o lançamento do original de Collodi, em 1883, que não
surpreende que novas versões apareçam.
No
caso, o filme de animação musical stop
motion do cineasta mexicano Guillermo Del Toro (e de Mark Gustafson) é uma
produção norte-americana caprichadíssima.
Realiza um espetáculo fascinante com seus bonecos, a trilha sonora de
Alexander Desplat e as vozes de um elenco de ótimos atores e atrizes: Gregory
Mannn (Pinóquio), David Bradley (Gepeto), Ewan McGregor (o Grilo), Tilda
Swinton, Finn Wolfhard, Ron Pelman, Cate Blanchet. É uma versão moderna do personagem. O que, no caso de Guillermo Del Toro,
significou uma história com um viés mais sombrio e mais político. Pinóquio, como personagem infanto-juvenil,
está lá e a animação é atraente para as crianças. Mas o filme conversa com um universo mais
amplo, capaz de incluir facilmente os adultos.
Fala,
por exemplo, da relação pai e filho como expectativa e como imperfeição,
enquanto regra. Atribui a Gepeto a busca
de um filho para compensar a perda de outro.
E ele, magicamente, cria o boneco de madeira que vive. E como!
Capaz de grandes aventuras e até de salvar a vida do “pai”. Esse filho de Gepeto que morreu remete ao
período da Primeira Guerra Mundial e Pinóquio vai representar para o Duce em plena Itália fascista de Benito
Mussolini (que aparece como boneco). E é
capaz de ridicularizar o ditador fascista.
Muita liberdade criativa em relação à história original? Claro!
Porém, é preciso dizer: todo o espírito aventureiro e muitas das
histórias do livro de Collodi estão lá, respeitando esse espírito da criação
original.
A
leitura moral das atitudes de Pinóquio, naturalmente, mais valoriza do que
critica a sua desobediência frente aos adultos, o que incrementa o caráter
aventureiro da narrativa. A questão
afetiva, da relação pai e filho, é plenamente preservada. Só que com mais realismo. Nunca somos os pais que desejaríamos ser, nem
os filhos que gostaríamos de ter sido.
Porque a vida é assim. As
idealizações não resolvem nada, só atrapalham.
Enfim,
o filme é bonito, empolgante, o roteiro é inteligente, resgata um personagem
maravilhoso. A técnica de animação é
magnífica. Acaba alcançando um padrão
visual excelente, que nos permite embarcar na fantasia por inteiro. O “Pinóquio” de Guillermo Del Toro tem quase
duas horas de duração, mas flui com leveza e encanta. Nem dá para sentir o tempo passar.
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