sábado, 11 de dezembro de 2021

NÓS DUAS

Antonio Carlos Egypto

 



NÓS DUAS (Deux).  França, 2019.  Direção e roteiro: Filippo Meneghetti.  Elenco: Barbara Sukowa, Martine Chevallier, Léa Drucker, Muriel Benazeraf.  95 min.

 

 Nina (Barbara Sukowa) e Madeleine (Martine Chevallier), aposentadas, são vizinhas de porta a porta no mesmo andar de um prédio de apartamentos e grandes amigas, há tempos.  Nina, solteira, Madeleine, viúva.  Na verdade, o vínculo entre elas, como já mostram as primeiras cenas do filme “Nós Duas”, é mais intenso.  Elas se amam, compartilham prazeres, de modo discreto e secreto.  Tudo parece andar muito bem, mas falta algo, já que ambas alimentam um desejo de se mudar da França para Roma, para viverem juntas.

 

O empecilho para isso poderia vir dos dois filhos e do neto de Madeleine, mas a relação dela com esses familiares tem arestas.  Nada a ver com o amor lésbico, desconhecido por eles, mas há uma cobrança no ar de que Madeleine não amava verdadeiramente o marido que se foi.  E isso incomoda.

 

O desejo de mudança para Roma desencadeia uma série de situações que abalarão o mundo estável em que as duas mulheres idosas viviam.  Não esperem por um dramalhão.  Ao contrário, o filme dirigido por Filippo Meneghetti é cheio de pequenos detalhes e sutilezas que vão revelando os sentimentos dos personagens.  Um silêncio, uma ausência de resposta, um não cumprimento, uma movimentação no espaço, o toque num objeto, são indicativos disso.  Especialmente na primeira parte do filme, onde as coisas mais graves não aconteceram.  Os eventos se precipitam e as sutilezas se reduzem, porém, não desaparecem. 

 

O diretor está mais interessado no que se sente do que nos fatos e soluções em si.  No entanto, existe uma trama acontecendo e envolvendo o espectador.  Ela se move pelos sentimentos, o medo, especialmente, porém, o contexto social também está presente.  E, no fim das contas, conta muito.

 



O diretor e roteirista Filippo Meneghetti tem 41 anos, é italiano, vivendo na França, e, “Nós Duas” é seu primeiro longa-metragem.  Podemos dizer que, surpreendentemente, foi o filme escolhido para representar a França na disputa pelo melhor filme internacional no Oscar 2021.  Um feito para um jovem e promissor cineasta estrangeiro.  Merecido.  O seu trabalho é consistente, tem uma história bem concebida e ganha força nos detalhes, naquilo que fica em menor evidência, aparentemente.

 

O desempenho da grande atriz Barbara Sukowa tem muito mérito nesse êxito.  Ela transmite tudo o que sente, o que se passa dentro dela, nos menores gestos, posturas, olhares, entusiasmo ou desânimo.  Nossa conhecida desde os filmes de Rainer Werner Fassbinder, a atriz alemã de origem polonesa, é brilhante no desempenho que sustenta o filme o tempo todo.  Sua parceira de protagonismo, a atriz francesa Martine Chevallier, também é exigida na sutileza interpretativa e se sai muito bem.  Basta dizer que, em boa parte do filme, ela atua muda, sem emitir uma palavra.  E entendemos absolutamente tudo o que se passa com ela.

 

Tudo isso funciona bem, numa narrativa do tipo clássico, mesmo com algumas soluções questionáveis.  Por exemplo, guardar bastante dinheiro numa latinha dentro do apartamento não parece um comportamento razoável para uma personagem vivida e decidida como Nina.  Vai bem para a trama, mas não chega a convencer.  De qualquer modo, coisas como essas não comprometem um filme tão bem trabalhado, numa temática difícil e pouco, digamos, comercial.



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