Antonio Carlos
Egypto
ERA O HOTEL CAMBRIDGE. Brasil, 2016.
Direção e roteiro: Eliane Caffé.
Com José Dumont, Carmen Sílvia, Suely Franco, Isam Ahmad Issa, Guylain
Mukendi. 99 min.
Documentário e ficção já não se concebem, atualmente,
como coisas independentes ou separadas.
O que se vê, cada vez mais, é o diálogo, a fusão, o questionamento e a
integração entre o documental e o ficcional.
“Era o Hotel Cambridge”, de Eliane Caffé, é um filme
de ficção, porém, tão colado à realidade dos fatos e situações que representa,
que, muitas vezes, é difícil distinguir a encenação do momento documentado.
A história que o filme conta é a da ocupação de um
prédio abandonado no centro da cidade, na avenida 9 de julho, em São Paulo, que
foi, era, o hotel Cambridge, pelo Movimento dos Sem-Teto do Centro. O filme foi feito lá mesmo, com os ocupantes
representando seus papéis, sua história e a de outros, ao lado de atores
profissionais.
A diretora, com sua equipe de filmagem, frequentou a
ocupação por dois anos, conviveu e se envolveu com a vida dos moradores até
criar sua ficção, que é uma interação entre personagens e situações daquele
espaço e de relatos que vieram deles.
Eliane descobriu, ao lado dos chamados sem-teto, refugiados estrangeiros
vindos do Congo, da Síria, da Palestina, recém chegados ao Brasil. Buscou também registrar o convívio desses
refugiados com os “refugiados” do próprio país, ou seja, os “refugiados da
falta de direitos”.
Aqui, o cinema não observou a realidade, se envolveu
com ela (e ainda se envolve, diga-se de passagem). Mergulhou na situação vivida pelas pessoas
que ocupam aquele prédio, mostrou fatos relativos a outras ocupações, à
repressão policial, e se envolveu também com os aspectos psicológicos, humanos,
daquelas pessoas sofridas, mas ativas e lutadoras. Mostrou o comando e a força do gênero
feminino nessa batalha diária e constante que é a ocupação.
Carmen Sílvia desponta como liderança popular, forte
e decidida, e acaba se revelando como atriz.
José Dumont e Suely Franco estão muito integrados à situação, vivendo
tudo aquilo junto com os ocupantes sem-teto, como se fossem eles próprios
moradores e integrantes do movimento de moradia.
“Era o Hotel Cambridge” reflete o amálgama de fatos,
situações, encenações, personagens, que se confundem no real e no imaginário,
oriundos do mundo interno ou da dimensão sociológica, sem delimitações
claras. Toma o partido da FLM – Frente
de Luta Pela Moradia – e dos demais movimentos a ela associados. Realiza uma imersão comprometida com a
questão social que retrata. É um filme
emocionante e envolvente. Um filme de
luta, eu diria.
“Era o Hotel Cambridge” recebeu muitos prêmios pelo
Brasil. O público da 40ª. Mostra
Internacional de Cinema de São Paulo e o do Festival do Rio 2016 o elegeu como
melhor longa brasileiro. Venceu também o
Festival Aruanda, de João Pessoa, PB, e foi premiado no Festival Cinema de
Fronteira em Bagé, RS, além de se destacar em festivais internacionais, como os
de San Sebastian e Roterdã.
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