Antonio Carlos
Egypto
O SILÊNCIO DO CÉU (Era el Cielo). Brasil,
Uruguai, 2015. Direção: Marco
Dutra. Com Leonardo Sbaraglia, Carolina
Dieckmann, Chino Darín, Álvaro Armandi Ugón, Mirella Pascual. 102 min.
A vida de um casal pode resistir a algumas omissões e
segredos, talvez, sem maiores sobressaltos.
Mas quando algo muito importante aconteceu, foi vivido com muita dor e
de forma traumática e, ainda assim, nada se diz sobre isso, como fica a
situação? Pior: e quando o outro viu o
que aconteceu, sabe do que se trata e também não aborda o assunto, porque tem
algo muito importante a esconder?
Os silêncios substituem a comunicação e o diálogo,
criando um insuportável tabu na vida dos dois.
É curioso como os passos de um se guiam pelos passos do outro,
justamente em relação ao assunto-tabu.
Certos tipos de cuidados, apoios e solidariedade, se darão nessa zona escura
que, de um modo ou de outro, é conhecida por eles.
O filme “O Silêncio do Céu” aborda com muita
competência essa trama, em que o psiquismo dos personagens fala mais alto. Muito mais importante é o não-dito, em
relação a tudo que é dito. O clima onde
isso se dá, em torno da casa, do ateliê de trabalho, de um grande viveiro de
venda de plantas e em torno do movimento dos automóveis, coloca o espectador
dentro do mistério. Que para ele não é
exatamente um mistério: é uma grande questão entender as motivações dos
comportamentos naquela situação dada. E
o que se abre a partir desse universo de omissões como consequência. A tragédia é que omissão puxa omissão e as
coisas podem se agravar muito.
Para alcançar um resultado muito expressivo nas
interpretações, o diretor Marco Dutra contou com Carolina Dieckmann, no papel
de Diana, que desde a primeira cena vive um drama pesado e devastador, que ela
terá de carregar ao longo de todo o filme.
E fazer isso representando em espanhol.
Ela é brasileira, mas a produção é toda filmada no Uruguai, falada em
espanhol. O outro elemento do casal é Mário, papel do ator
argentino Leonardo Sbaraglia, que tem de se mostrar contido, cheio de medos,
covarde, sofrendo por dentro e em vias de explodir. Papel exigente, de que ele dá conta muito
bem. O ator já é conhecido no Brasil por
filmes como “Relatos Selvagens” (2014), “O Que os Homens Falam” (2012) e “Plata
Quemada” (2000).
Todos os demais atores e atrizes compõem com segurança esse mundo tenso, angustiante,
opressor e potencialmente violento, em termos psíquicos. Entre eles, a presença do jovem Chino Darín,
filho de Ricardo Darín, que tem pela frente o desafio de se mostrar à altura do
talento do pai. Está bem no filme, no
papel que lhe coube. Há, também, a atriz
uruguaia Mirella Pascual, conhecida por sua atuação em “Whisky” (2004).
O roteiro, muito bem construído, contou com três
talentos. Primeiro, o do escritor do
romance que lhe deu origem, “Era el Cielo”, o argentino Sergio Bizzio. Segundo, o da cineasta argentina Lucía Puenzo, de “XXY”
(2008) e “O Médico Alemão” (2013).
Terceiro, o do cineasta brasileiro Caetano Gotardo, do excelente “O Que
Se Move” (2013).
O jovem diretor brasileiro Marco Dutra realizou
“Quando Eu Era Vivo” (2012) e “Trabalhar Cansa” (2011), este em parceria com
Juliana Rojas, dois filmes bem recebidos pela crítica.
“O Silêncio do Céu” ganhou no 44º. Festival de Cinema
de Gramado o prêmio de melhor filme pelo júri da crítica, além de melhor
desenho de som e o prêmio especial do júri.
Um belo trabalho de equipe que uniu brasileiros, uruguaios e argentinos
numa autêntica produção latino-americana.
Fato raro e alvissareiro.
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