Antonio Carlos
Egypto
A PASSAGEIRA (Magallanes). Peru, 2015.
Direção e roteiro: Salvador del Solar.
Com Damián Alcazar, Magaly Solier, Federico Lupi, Christian Meier. 109 min.
“A
Passageira”, que dá título ao filme de Salvador del Solar no Brasil, é o nome
do romance de Alonso Cueto (La Pasajera), o que põe em evidência uma mulher que toma um
táxi e abala os sentimentos do motorista, que a partir daí passará a
procurá-la, com a intenção de se redimir de um passado cheio de culpa.
Esse homem é “Magallanes”, título original do filme
peruano, que se centra, de fato, na figura desse personagem, que enfrentará seu
passado comprometido, que está umbilicalmente ligado ao de seu país. Ele foi
soldado do exército peruano, lutou contra o Sendero
Luminoso, na guerra civil que abalou o Peru e produziu a ditadura de
Fujimori. Um passado violento e
terrível, que todos parecem querer esquecer.
Mas é possível?
Magallanes, vivido pelo ótimo ator mexicano Damián
Alcazar, trabalha hoje transportando e servindo ao “coronel”, papel do grande
ator argentino Federico Lupi. Coronel,
evidentemente, remete aos núcleos de poder militar e também de domínio da
terra, representação de uma elite dominante opressora.
A passageira que Magallanes reconhece é Celina, papel
da atriz peruana Magaly Solier, em excelente atuação. Celina sofreu diretamente sob o jugo do tal
coronel, de modo vil, ainda muito jovem.
Ela é a primeira a querer esquecer o sofrimento atroz que passou. Ao coronel, a seu filho e seus colaboradores
policiais e políticos, não interessa mexer nisso. As atrocidades se esquecem. No caso do coronel, a idade avançada já lhe
produziu a doença de Alzheimer, ou equivalente, de modo que ele não se lembra
de nada.
É do esquecimento, do não se lembrar, do não querer
saber, do propósito declarado de pôr uma pedra em cima de tudo que se move esse
pequeno grande filme. Uma metáfora das
feridas deixadas em aberto pelas ditaduras e guerras da América Latina, de 25,
30 anos atrás, que não fecharam, mas que não podem ser ignoradas. Remetem a uma história que compromete cada um
e todos, de um modo ou de outro.
Algozes, vítimas, omissos, a todos cabe a tarefa de resgatar a memória
do passado recente, para poder superá-lo e não repetir a tragédia.
“Magallanes” é um filme que tem uma trama muito bem
urdida, no sentido de nos revelar, na história pessoal dos três principais
personagens, as dimensões sociopolíticas da realidade peruana e, claro,
latino-americana do período. Uma época
que esperávamos superada pela democracia recém-conquistada, mas que está sempre
em risco. Sobretudo, quando tudo o que
se quer é esquecer e não enfrentar os fantasmas e demônios que se produziram
por aqui.
Além disso “A Passageira” trabalha com uma narrativa
policial e de suspense que mantem o espectador muito ligado nas cenas e
sequências apresentadas. A resolução do filme é fantástica, para mostrar a quem
interessa e as motivações que estão por trás desse desejo de apagar a História.
A produção envolve a participação de diversos países
de língua espanhola, como Argentina, Colômbia e Espanha. O peruano Salvador del Solar já tem uma larga
trajetória como ator de cinema e TV. Sua
estreia como diretor é muito convincente.
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