Antonio Carlos Egypto
O
primeiro aspecto a ser ressaltado é a própria existência da Mostra
Internacional de Cinema em São Paulo, já em seu 47º. Ano. É uma vitória e tanto essa continuidade, passando
por todo o período de censura da ditadura militar, a dificuldade de obter apoio
publicitário nos primeiros anos, os tempos recentes da extrema direita atacando
a cultura, a pandemia.
Voltamos
à Mostra presencial, após o período da pandemia, em que o evento sobreviveu on line, total ou parcialmente. Foi bom ver que o público cinéfilo
voltou. As sessões noturnas e de fim de
semana cheias, vários filmes tiveram ingressos esgotados, deixando alguns espectadores
sem conseguir assisti-los.
Houve
mudanças nos cinemas que exibiram a Mostra.
Alguns saíram, como o Belas Artes e o Marquise, no Conjunto Nacional,
justamente onde fica a Central da Mostra.
Em compensação, vimos a Cinemateca Brasileira em grande atividade
durante o evento, não só nas sessões de cinema, como nos debates e lançamentos
de livros. E lá também a inauguração do
Espaço Petrobrás, agora uma ampla área coberta. O cinema Sato, na Liberdade,
que exibiu filmes orientais da Mostra, teve também muito público. O Frei Caneca, com 4 salas, recebeu público
com intensidade, como de costume. Eu vi o Reserva Cultural com o saguão
completamente lotado, numa terça-feira, às 17:30 h. O Cinesesc, o Itaú Augusta e o Anexo, também
tiveram bom público. Enfim, o cinema
voltou a reunir e entusiasmar as pessoas.
Os encontros, conversas, debates sobre os filmes e sobre a programação,
correram soltos e isso tudo fluiu muito bem.
Foi uma grande notícia a ampliação dos patrocínios para este ano, com a
volta da Petrobrás para o seu papel indispensável de promoção da cultura. E outros apoios mais.
Também
houve problemas: cancelamento de sessões à última hora, atrasos, cinema com
projeção escurecida, como o Itaú Augusta, sala 1, ajustes sonoros muito ruins
em sessões do Frei Caneca. Vou citar
duas: na sessão do filme “Não Espere Muito do Fim do Mundo”, parecia que o fim
do mundo estava mesmo à espreita, tal o volume alto em que o filme foi
exibido. Foi uma das piores experiências
que tive, o filme mais barulhento a que já assisti. Ele até que não seria ruim, não fosse exibido
assim. Em outro dia, também no Frei
Caneca, tive que assistir ao belo “Folhas de Outono” com som muito baixo. O que terá acontecido por lá? Bem, as outras sessões a que assisti estava
tudo OK. O Cinesesc esteve impecável em
termos de projeção e som, mas também teve sessão interrompida por falta de luz.
Tudo
isso faz parte. Afinal, é um evento
grandioso, que supõe muita organização, é impossível esperar que tudo funcione
perfeitamente. A boa vontade dos
monitores e coordenadores de equipe é ótima.
É gente que se desdobra para que tudo funcione. Muitos são novos e não
conhecem a rotina da Mostra, não sabem informar muita coisa. Mas são acessíveis e gentis.
Da cor e da tinta |
Quanto
aos filmes a que assisti, foram mais de 50.
Já abordei os que me pareceram mais importantes. Mas tem algumas descobertas tardias, que vale
comentar rapidamente, e também uma decepção.
Começando pela decepção, veio com muita expectativa positiva o filme O MAESTRO, de Bradley Cooper, sobre a
trajetória de Leonard Bernstein (1918-1991), compositor e maestro consagrado. Falhou, no entanto, ao
privilegiar a vida pessoal em detrimento da obra maiúscula do retratado. Afinal, por que motivo uma cinebiografia
senão pela sua arte?
O que
vale a pena destacar aqui são três magníficos documentários sobre artes
plásticas. DA COR E DA TINTA, da cineasta chinesa Weimin Zhang, abordou a
trajetória do grande pintor chinês Chang-Dai-Chien (1899-1983), que circulou
pelo mundo com seu trabalho e morou vinte anos no Brasil, em Mogi das Cruzes.
Anselm, o barulho do tempo |
No
maravilhoso ANSELM - O BARULHO DO TEMPO
(Das Rouschen Der Zeit), do grande
cineasta alemão Wim Wenders, foi o trabalho do pintor e escultor moderno Anselm
Kiefer que ocupou a tela. Pinturas, esculturas, instalações, grandes projetos
de amplo espaço, ao longo de 50 anos de carreira, discutem a existência humana,
o movimento cíclico da história, incorporando literatura, poesia, ciência e
religião, num filme plasticamente muito bonito, que reflete a obra retratada.
O
documentário francês RICARDO E A PINTURA,
do realizador suíço Barbet Schroeder, retrata e focaliza o trabalho, que
envolve grandes painéis, do pintor argentino Ricardo Cavallo. Além da própria obra, Cavallo dá uma
verdadeira aula de história da pintura, comentando trabalhos clássicos.
Ricardo e a pintura |
São
filmes que vi ao final da Mostra, ou já na repescagem, que me encantaram. Também gostei da ficção italiana LA CHIMERA, de Alice Rohwacher, a da
Mongólia, SE EU PUDESSE HIBERNAR, de
Zoljargal Purevdash, do filme belga QUANDO
DERRETER, de Veerle Baetens, do da Lituânia, DEVAGAR, de Marija Kavteradze, e, ainda, de ZONA CRÍTICA, do cineasta iraniano Ali Ahmadzadeh. Espero que todos eles cheguem ao circuito
exibidor, para que mais gente possa apreciá-los.
@mostrasp
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