Antonio Carlos
Egypto
UM HOMEM CHAMADO OVE (En Man Som Heter Ove).
Suécia, 2016. Direção: Hannes
Holm. Com Rolf Lassgard, Bahar Pars, Ida
Engvoll, Filip Berg. 116 min.
Um bom personagem, que fuja dos clichês e
estereótipos, que se revele humano e complexo, é meio caminho andado para um
bom filme. Ove é um personagem assim,
embora, de início, ele se apresente como um sujeito simplório, pouco
inteligente e rígido ao extremo.
Ele se apega a regras que, no fundo, ele mesmo criou
como síndico de um condomínio e incomoda todos que por lá circulam, para se
assegurar de uma existência pobre, mas segura.
Pobre, no sentido espiritual.
Afinal, estamos na Suécia e a classe média baixa por lá vive bem. Muito bem atendida em suas necessidades
básicas.
Ove chega aos 59 anos já viúvo e agora aposentado
contra sua vontade, pouco lhe resta para usufruir da vida. Pelo menos, é assim que ele encara as coisas:
não existiu nada antes de Sonja (sua mulher morta) e nada haverá depois
dela. Com isso, ele se afunda num
niilismo pessoal, se afasta de tudo e de todos, de forma mal-humorada e
agressiva e, consequentemente, decide se suicidar. Mas morrer não é nada fácil e suas tentativas
costumam ser desastradas.
Existe também a alteridade e mesmo que se desejem
negar a existência, os direitos e as necessidades dos outros, eles estão lá e
podem se impor, goste-se ou não disso. Quem é o ser humano sem o outro, que pode incomodar,
sim, mas também pode ressignificar a sua própria vida? Que sorte tem o Ove que as pessoas não o
abandonem, não porque sejam altruístas, mas porque ele tem algo a dar sempre,
apesar das evidências em contrário.
É por aí que o filme avança na humanidade de seu
personagem e nos faz refletir sobre o que é a nossa vida. A partir de situações comezinhas, banais, as
coisas se mostram e podem ser descobertas.
Uma história também vai se revelando e, por mais simples e corriqueira
que pareça, é emocionalmente forte e marcante.
O filme se baseia no best seller A Man Called Ove,
de Fredrik Backman, que eu não conheço, mas percebe-se que o diretor Hannes
Holm quis aproveitar as muitas (todas?) situações do romance. Se é verdade que isso amplia o universo de
Ove, por outro lado, dispersa um pouco o interesse. Muita coisa é dispensável, não acrescenta à
temática principal e, se melhor editado, poderia deixar o filme mais enxuto e
focado. No texto escrito, faz mais
sentido do que na tela. Fidelidade
excessiva ao romance costuma ser uma armadilha para o cinema. Aqui há alguma perda, mas “Um Homem Chamado
Ove” se sustenta bem no seu clima doce azedo, em que cabem a angústia, o drama,
a tragédia do passado e, ao mesmo tempo, muito humor e muita ternura. O afeto como reparador da rigidez e da
intolerância, caminho de descoberta.
Conta-se aqui uma boa história, a partir de um bom
personagem. E isso se faz de uma maneira
honesta, limpa. Não é tão original, mas
é muito bom o caminho trilhado pela narrativa.
Rolf Lassgard é ótimo como Ove, sustenta o filme o tempo todo. Filip Berg, que faz Ove jovem, também dá
conta do recado. E as duas mulheres
protagonistas são ótimas: Bahar Pars, que faz a amiga Parvaneh, e Ida Engvoll,
a esposa Sonja, têm grande expressividade e beleza. Acrescentam ao filme uma luminosidade que lhe
é essencial.
“Um Homem Chamado Ove” está entre os selecionados
para a disputa do Oscar de filme estrangeiro, ou filme de língua
não-inglesa. O que já lhe garante
destaque e boa distribuição internacional.
Tem méritos para isso.
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