Antonio Carlos
Egypto
MANCHESTER À BEIRA-MAR (Manchester By The Sea).
Estados Unidos, 2016. Direção: Kenneth Lonergan. Com Casey Affleck, Michelle Williams, Kyle
Chandler, Lucas Hedges, C. J. Wilson. 138
min.
“Manchester à Beira-Mar” é um filme estadunidense
que não trata de heróis em quadrinhos, seres fantásticos ou de outro
planeta. Aborda gente de verdade, seres
humanos. Ou seja, conversa com um
público adulto, interessado em refletir sobre a vida cotidiana e o ser humano,
como ele é.
Esclarecido isso, dá para dizer que o filme trata de
um tema psicologicamente muito relevante e que pesa fortemente na vida das
pessoas: a culpa. A culpa não
trabalhada, não elaborada, que faz com que os comportamentos inadequados e
destrutivos se repitam e acaba por não conduzir a lugar nenhum.
Lee (Casey Affleck) é uma figura humana desencontrada
de si mesma, consumida pela culpa. O
alcoolismo, que está na origem do seu problema, se acentua, passando da
irresponsabilidade alegre para uma tristeza taciturna. Ele se torna muito agressivo, antissocial e
utiliza seu potencial no grau mínimo, contentando-se com uma ocupação manual
que o dispensa de pensar. Mas não de se
indispor com os clientes.
Esse homem terá de enfrentar um desafio para o qual,
evidentemente, não está preparado: cuidar de um sobrinho adolescente que perdeu
o pai e que não pode viver com uma mãe distante, descontrolada, que oscila
entre a dependência do álcool e a de uma religião e de um novo casamento, que
possam freá-la.
O convívio entre o tio e o sobrinho, sua
problemática, nuances e impasses, ocupam grande parte da trama. O centro disso é a preocupação com a
caracterização do personagem protagonista, os desacertos e descaminhos que ele
produz, seu despreparo, seu modo infantil de negar as coisas que se lhe
apresentam, suas reações tardias, quando ocorrem. Como se chega a isso? Na origem e na base de tudo, a culpa, que
corrói.
A relação com a ex-esposa se torna impossível para
ele, em qualquer circunstância. Está
consumida pelo fogo, que destruiu aquele casamento e os filhos. E destruiu a vida dela pós-separação, também,
pelo que se vê. Não há espaço para
nenhuma reparação, pelo menos da parte dele.
Estamos diante de um drama? Mais do que isso, de uma tragédia. Que se manifesta de muitas formas, ao longo
da narrativa. O espectador tende a
pedir: menos, menos. É tragédia demais
nessa vida.
Apesar disso, o tom do filme não é trágico. É mais um relato triste, desesperançado, sem
saída. Mas também sem exageros, arroubos
interpretativos, escândalos. As coisas
se colocam em tom baixo. Desanimador,
não histérico. Para isso contribuem os
desempenhos dos atores, em especial, o de Casey Affleck. Ele dá o tom certo, minimalista, ao
personagem Lee. O elenco todo compõe bem
o clima da história.
O vai-e-vem da narrativa no tempo e as cenas que vão
se apresentando, exigindo que a plateia fique atenta e monte, pouco a pouco, o
quebra-cabeça de quem é quem e o que está fazendo aqui, também colabora para
esfriar as emoções, evitando o envolvimento intenso com o drama que está sendo
mostrado. Isso dá margem ao
distanciamento necessário para se refletir sobre o que se vê. O resultado é muito bom, talvez com menor
apelo comercial. Mas como o filme deve
figurar na lista do Oscar, isso vai ser compensado.
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