Antonio
Carlos Egypto
DESAJUSTADOS (Fúsi). Islândia, 2015. Direção e roteiro: Dagur Kári. Com Gunnar Jónsson, Ilmur Kristjánsdóttir,
Arnar Jónsson, Margrét Helga Jóhannsdóttir.
96 min.
Fúsi (Gunnar Jónsson) é um homem grande, obeso, na
faixa dos 40 anos de idade, ingênuo, de interesses e comportamentos ainda
infantis. Ao conviver com uma menina
vizinha, suas atitudes se equiparam às dela.
É virgem, vive com a mãe, tem bom coração, sofre bullying de colegas no trabalho como despachador de malas no
aeroporto, mas os perdoa com facilidade.
Ele é o personagem central, é a sua vida que vai nos
ser mostrada. E a rotina sempre
repetitiva, do restaurante, das músicas pedidas no rádio e do seu interesse por
reconstruir com soldadinhos, tanques e outras peças, batalhas da Segunda Guerra
Mundial, ao lado de seu único amigo. No
original, o filme leva o nome do personagem, “Fúsi”.
Na versão em inglês, o título virou “Virgin
Mountain”, mas, em português, se chama “Desajustados”. Que Fúsi possa ser considerado um
desajustado, por seus comportamentos, para os padrões sociais esperados para
alguém como ele e com sua idade, parece óbvio.
Mas não deixa de ser um julgamento, um rótulo que rejeita a figura. Por que a rejeição a uma doce criatura como
essa? Por ser um looser, na visão capitalista difundida pelos Estados Unidos? Por entendê-lo como um doente mental? Ou o quê?
Acontece que o título está no plural, o que engloba
também a personagem Alma (Ilmur Kristjánsdóttir), uma mulher ativa e vibrante,
que ama flores e trabalhava numa floricultura.
Mas perde seu emprego e o que lhe resta é aceitar um trabalho como
lixeira. Ela entra na vida de Fúsi por
acaso, ele se dedica a ela e a ajuda numa crise de depressão. Chamá-la também de desajustada só agrega
julgamento aos que ficam desempregados e aos que sofrem de depressão. Sem que uma coisa precise levar à outra. Não faz sentido. É muito infeliz o título brasileiro desse
belo filme islandês.
Na realidade, o filme é terno como seu protagonista,
cheio de vida, como a mulher que se envolve na vida dele, capaz de valorizar o
respeito humano e de entender a mente ingênua dos que passam pela vida sem
acesso maior aos bens culturais, sem ambições, sem conseguir vencer uma timidez
atávica. Ou, quem sabe, sem conseguir
entender esse mundo onde vieram parar.
Basta esquecer o título do filme para perceber que
estamos diante de figuras humanas frágeis, que se debatem num dia-a-dia
frustrante e pouco acolhedor. Não como
derrotadas, mas como sobreviventes. Isso
também é uma batalha, às vezes tão dura quanto as da Segunda Guerra que Fúsi
reconstrói.
O ator protagonista, Gunnar Jónsson, está ótimo,
perfeito para o papel. Foi premiado nos
festivais de Marrakech e de Tribeca 2015. Merecidamente. Ilmur Kristjánsdóttir, que faz Alma, também
está muito bem. O contraste da dupla, em
todos os sentidos, é cativante.
O frio e a neve que fazem parte da história, como é
inevitável acontecer em filmes da Islândia, servem para acrescentar um clima um
tanto cinzento e triste à narrativa. Mas
é apenas um elemento acessório e nem tão explorado assim pelo diretor Dagur
Kári. Os ambientes internos um tanto
escuros dizem mais dos sentimentos e limites de vida dos personagens do que
qualquer outra coisa. Porém, é um filme
que também tem muito carinho e muitas flores, portanto, é também cheio de
esperança.
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