Antonio Carlos
Egypto
HANNAH
ARENDT (Hannah Arendt). Alemanha, 2012. Direção: Margarethe Von Trotta. Com Barbara Sukowa, Axel Milberg, Janet
McTeer, Nicholas Woodeson. 113 min.
Hannah Arendt (1906-1975), filósofa alemã de origem
judaica, fugiu da Alemanha nazista em 1933 e acabou fixando raízes e obtendo
cidadania nos Estados Unidos. Foi em
Nova York que ela ficou sabendo do sequestro, pelo serviço secreto de Israel,
do criminoso de guerra Adolf Eichmann, em Buenos Aires, e do seu julgamento em
Jerusalém.
Ela se ofereceu à revista New Yorker para fazer a cobertura do evento e foi aceita. Já era, então, um nome de peso na
intelectualidade da época, havia publicado um livro importantíssimo: “A Origem
do Totalitarismo”. William Shawn
(Nicholas Woodeson), editor da New Yorker, lhe deu carta branca e o tempo de
que ela precisava para o trabalho.
O filme “Hannah Arendt”, da escritora e cineasta
Margarethe Von Trotta, se refere a esse período da vida dela, que vai de 1961 a
1964. Foi um período turbulento para
Hannah, vivida por Barbara Sukowa, em ótimo desempenho. Primeiro, por lidar com um tema que mexia com
sua história pessoal e a de milhões de judeus exterminados. Segundo, porque ela foi encarar o monstro
Eichmann e encontrou apenas um burocrata medíocre. Foi capaz de observar e tentar entender o que
ela chamou de banalidade do mal, com uma coragem e uma honestidade intelectual
incríveis. Terceiro, porque, como se
poderia imaginar, isso causou um enorme mal-estar no campo judaico, muitas
incompreensões, hostilidades e perseguição ao seu trabalho e à sua figura.
Num momento ainda de afirmação do Estado de Israel,
qualquer crítica às lideranças judaicas no episódio do Holocausto soava
intolerável. E ela o fez. Assim como afirmou que Eichmann cometeu um
crime contra a humanidade, não apenas contra os judeus, uma vez que judeus são
humanos. Seu pensamento era
universalista e libertário. A
proximidade com a escritora e feminista Mary McCarthy (Janete McTeer) também
mostra que a questão feminina lhe interessava muito.
O filme mostra sua forte personalidade, determinação
e peso intelectual, seu relacionamento intenso com o marido Heinrich Blüchen
(Axel Milberg), também de grande estatura intelectual, apesar da ausência de
diplomas acadêmicos.
Mostra, ainda, o relacionamento de Hannah com o
filósofo Martin Heidegger, de quem foi discípula e com quem teve um caso de
amor. Ele viveu na Alemanha nazista como
reitor universitário sem dificuldades e com a carteira do partido, que nunca
renegou. Ainda assim, Hannah conviveu
com ele, tentando entender o que se passava.
Foi mais um item polêmico de sua história. O filme não aprofunda essa questão, no
entanto. Fica na superfície da relação.
A busca de Hannah Arendt era sempre a de querer
entender. Foi assim que ela percebeu, de
forma original, que o mal pode se originar não da monstruosidade de uma opção
política ou ideológica, mas simplesmente da obediência cega e da inabilidade
para pensar autonomamente. De coisas
como essas pode ser gerada uma tragédia de lesa-humanidade.
Não pensar por si mesmo, repetir bordões, obedecer às
palavras de ordem. Falar de coisas que
nem sequer entende. Julgar, condenar,
sem se preocupar em compreender, são mesmo coisas potencialmente muito
perigosas. Sem falar dos
preconceitos. Que cansamos de ver a toda
hora à nossa volta, todos os dias.
Eichmann |
Por isso mesmo, filmes como “Hannah Arendt” vêm a
calhar. Sua narrativa simples e clássica
serve bem ao objetivo de revelar uma trajetória, um pensamento, uma figura
humana admirável. Pela honestidade
intelectual, não pela polêmica em si.
Respeitar e procurar entender o outro, até mesmo seu maior e mais
evidente inimigo, é um desafio e tanto.
Quem for capaz disso, certamente se tornará melhor, mais humano.
Um mérito interessante do filme, também, é nos
mostrar a figura de Eichmann e algumas de suas respostas. A gente percebe que a banalidade do mal é
mesmo assustadora, justamente porque parece algo tão comum e corriqueiro.
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