quarta-feira, 15 de abril de 2009

SINÉDOQUE – NOVA YORQUE



Antonio Carlos Egypto

Se a vida, como se costuma dizer, é uma representação e se desempenhamos papéis continuamente, que tal transformá-la numa grande peça de teatro, que se amplia sempre e ocorre em paralelo à própria vivência? É o que se propõe o diretor teatral Caden Cotard, vivido pelo ator Philip Seymour Hoffman, no filme “Sinédoque – Nova Yorque”, de Charlie Kaufman, de 2009.
Sua peça-vida extrapola qualquer limite, embaralha atores e personagens, uns interferindo nos outros, quem sabe em busca de um sentido. O fato é que a transitoriedade da vida nos leva a tentar desesperadamente entender a morte e o papel que desempenhamos enquanto estamos vivos. E é humano pensar em produzir algo grandioso que possa marcar a passagem de cada um por essa vida, com todos os riscos aí implicados. É disso que se trata.
O primeiro filme dirigido por Charlie Kaufman (roteirista de “Brilho eterno de uma mente sem lembranças”, de 2004, e “Quero ser John Malkovich”, de 1999, entre outros) é intrigante o suficiente para nos fazer pensar na existência, seu sentido e sua finitude. É, portanto, um produto aberto à reflexão. Com efeito, sua trama dispensa o realismo, mas não a verossimilhança com as vivências humanas. Não é um sonho ou um delírio, embora haja elementos tanto oníricos quanto delirantes na sua expressão. Conta uma história, na medida em que a vida de qualquer um, seus percalços, indecisões, medos e dúvidas, acaba sendo sempre uma história. Ainda que comporte diferentes visões, compreensões, percepções, e possa ser o relato das omissões, do que se pretendeu fazer e não se fez, do que se imaginou, se desejou ou se confundiu.
Uma galeria de mulheres frequenta a vida e a peça de Caden e seus problemas de relacionamento, dando margem a papéis femininos muito curiosos e variados. Catherine Keener, Samantha Morton, Michelle Williams, Emily Watson, Diane West, Jennifer Jason Leigh e Hope Davis são as atrizes que dão vida, e competentemente, a esses personagens.
E, afinal, por que sinédoque? Uma figura de linguagem que joga com a idéia do todo pela parte ou vice-versa, ou que faz a comparação de coisas que ocorrem simultaneamente, como a peça e a vida. A peça pela vida ou a vida pela peça. Está claro? Também não é necessário que fique claro, já que o próprio diretor espera que cada espectador faça sua leitura do filme e conclua as coisas mais diversas. Ele tem razão e isso dá a dimensão das possibilidades desta película muito estimulante e que ultrapassa as medidas do mero entretenimento.

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