Antonio Carlos Egypto
MILTON
BITUCA NASCIMENTO. Brasil, 2024. Direção: Flávia Moraes. Narração: Fernanda Montenegro. Documentário.
110 min.
O
documentário “Milton Bituca Nascimento” partiu da turnê internacional e
nacional de despedida dele dos palcos, acompanhada pela diretora Flávia Moraes,
durante dois anos. Muita coisa
importantíssima resultou desses encontros musicais, gerando, para a cineasta,
uma questão: como explicar o fascínio que o músico causa no Brasil e no mundo
com sua obra? Uma obra que motiva
estudo, pesquisas, aulas, debates universitários, em todos os lugares a que ela
chega. Não sei se precisa, nem sei se dá
para explicar. Há coisas que são
autoexplicáveis. A música de Milton fala
por si: músico, compositor, cantor, de qualidades excepcionais, facilmente
constatáveis. Enfim, o documentário vai
por aí, mostrando essa obra fantástica do Bituca e engrenando 40 entrevistas,
que vão de Quincy Jones, Spike Lee e Paul Simon a Gilberto Gil, Chico Buarque,
Mano Brown, Djamila Ribeiro e toda a turma do Clube da Esquina. A música de Milton nesse derradeiro palco soa
magnífica, com a colaboração de outros intérpretes e músicos, como a cantora
portuguesa Carminho, por exemplo. Claro
que a voz maviosa de Bituca já não pode tanto, não é mais a mesma. Mas o encanto está lá e a emoção é tanta que
contagia. O filme é, evidentemente, uma
celebração dessa grande obra. E é mesmo
importantíssimo celebrar esse artista gigante que, segundo a diretora, é o
Brasil profundo. Mas é incrível como uma
obra mineira, brasileira, popular, se insere de forma tão impressionante e
reverenciada no mundo do jazz. Milton
Nascimento é festejado pelos músicos mundo afora, das mais variadas tendências,
idades e gêneros musicais. O adjetivo
está para lá de banalizado, mas como evitá-lo?
Realmente, Milton Nascimento, o Bituca, é um gênio da música e um
orgulho do Brasil. Ouvi-lo, relembrar
sua história e sua trajetória, sob a narração da grande Fernanda Montenegro,
incluindo as perguntas que nem precisariam ser feitas, é uma experiência bem
gratificante.
GIRASSOL VERMELHO. Brasil, 2024.
Direção: Éder Santos. Elenco:
Chico Diaz, Daniel de Oliveira, Luah Guimarães, Luiza Lemmertz, Mariano Matos,
Bárbara Paz. 110 min.
“Girassol
Vermelho”, filme de abertura e destaque da 28ª. Mostra de Cinema de Tiradentes,
é inspirado em contos de realismo fantástico do escritor mineiro Murilo Rubião
(1916-1991). Dirigido por Éder Santos,
também mineiro, com uma carreira marcada pela fusão entre artes plásticas,
teatro, cinema e TV. Codirigido por
Thiago Villas Boas e com roteiro do diretor e de Mônica Cerqueira, relata uma
aventura do senhor Romeu (Chico Diaz), em busca da liberdade, ainda que
sacrificando o seu passado. A trama
remete a uma situação kafkiana, em que o cidadão em questão, após uma parada
forçada do trem, caminha por uma estranha cidade enfumaçada, fazendo perguntas
para entender o que está acontecendo.
Vai preso, sendo seguidamente interrogado e torturado, e só então
descobre que ali há a impossibilidade de questionar, não se podem fazer
perguntas. Um sistema que oprime, em nome da máquina, que se materializa em
engradados e grandes blocos de vidro fechados, por onde vertem-se a fumaça, a
areia, o pó, a água, como elementos destruidores, no mínimo, do moral da
pessoa. Se até aí já há estranheza
suficiente, a inclusão do conto Os
Comensais na aventura de Romeu, para mim destoou da narrativa, acrescentando
ainda mais estranheza ao conjunto. Sem
necessidade. Tudo isso, no entanto, é
uma oportunidade para uma experimentação visual muito instigante. Além disso, o elenco, brilhantemente liderado
por Chico Diaz, retrata personagens que se comportam na base do non sense, rejeitando qualquer resposta
ou pergunta racional, lógica. Ou seja,
estamos diante de uma mistura do absurdo com o onírico. Em que o que se perde é justamente o que se
procurava: a liberdade.
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