terça-feira, 18 de março de 2025

BITUCA e GIRASSOL

Antonio Carlos Egypto

 



MILTON BITUCA NASCIMENTO.  Brasil, 2024.  Direção: Flávia Moraes.  Narração: Fernanda Montenegro.  Documentário.  110 min.

 

O documentário “Milton Bituca Nascimento” partiu da turnê internacional e nacional de despedida dele dos palcos, acompanhada pela diretora Flávia Moraes, durante dois anos.  Muita coisa importantíssima resultou desses encontros musicais, gerando, para a cineasta, uma questão: como explicar o fascínio que o músico causa no Brasil e no mundo com sua obra?  Uma obra que motiva estudo, pesquisas, aulas, debates universitários, em todos os lugares a que ela chega.  Não sei se precisa, nem sei se dá para explicar.  Há coisas que são autoexplicáveis.  A música de Milton fala por si: músico, compositor, cantor, de qualidades excepcionais, facilmente constatáveis.  Enfim, o documentário vai por aí, mostrando essa obra fantástica do Bituca e engrenando 40 entrevistas, que vão de Quincy Jones, Spike Lee e Paul Simon a Gilberto Gil, Chico Buarque, Mano Brown, Djamila Ribeiro e toda a turma do Clube da Esquina.  A música de Milton nesse derradeiro palco soa magnífica, com a colaboração de outros intérpretes e músicos, como a cantora portuguesa Carminho, por exemplo.  Claro que a voz maviosa de Bituca já não pode tanto, não é mais a mesma.  Mas o encanto está lá e a emoção é tanta que contagia.  O filme é, evidentemente, uma celebração dessa grande obra.  E é mesmo importantíssimo celebrar esse artista gigante que, segundo a diretora, é o Brasil profundo.  Mas é incrível como uma obra mineira, brasileira, popular, se insere de forma tão impressionante e reverenciada no mundo do jazz.  Milton Nascimento é festejado pelos músicos mundo afora, das mais variadas tendências, idades e gêneros musicais.  O adjetivo está para lá de banalizado, mas como evitá-lo?  Realmente, Milton Nascimento, o Bituca, é um gênio da música e um orgulho do Brasil.  Ouvi-lo, relembrar sua história e sua trajetória, sob a narração da grande Fernanda Montenegro, incluindo as perguntas que nem precisariam ser feitas, é uma experiência bem gratificante.



 

GIRASSOL VERMELHO.  Brasil, 2024.  Direção: Éder Santos.  Elenco: Chico Diaz, Daniel de Oliveira, Luah Guimarães, Luiza Lemmertz, Mariano Matos, Bárbara Paz.  110 min.

 

“Girassol Vermelho”, filme de abertura e destaque da 28ª. Mostra de Cinema de Tiradentes, é inspirado em contos de realismo fantástico do escritor mineiro Murilo Rubião (1916-1991).  Dirigido por Éder Santos, também mineiro, com uma carreira marcada pela fusão entre artes plásticas, teatro, cinema e TV.  Codirigido por Thiago Villas Boas e com roteiro do diretor e de Mônica Cerqueira, relata uma aventura do senhor Romeu (Chico Diaz), em busca da liberdade, ainda que sacrificando o seu passado.  A trama remete a uma situação kafkiana, em que o cidadão em questão, após uma parada forçada do trem, caminha por uma estranha cidade enfumaçada, fazendo perguntas para entender o que está acontecendo.  Vai preso, sendo seguidamente interrogado e torturado, e só então descobre que ali há a impossibilidade de questionar, não se podem fazer perguntas. Um sistema que oprime, em nome da máquina, que se materializa em engradados e grandes blocos de vidro fechados, por onde vertem-se a fumaça, a areia, o pó, a água, como elementos destruidores, no mínimo, do moral da pessoa.  Se até aí já há estranheza suficiente, a inclusão do conto Os Comensais na aventura de Romeu, para mim destoou da narrativa, acrescentando ainda mais estranheza ao conjunto.  Sem necessidade.  Tudo isso, no entanto, é uma oportunidade para uma experimentação visual muito instigante.  Além disso, o elenco, brilhantemente liderado por Chico Diaz, retrata personagens que se comportam na base do non sense, rejeitando qualquer resposta ou pergunta racional, lógica.  Ou seja, estamos diante de uma mistura do absurdo com o onírico.  Em que o que se perde é justamente o que se procurava: a liberdade.





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