Antonio
Carlos Egypto
HELI (Heli). México, 2013.
Direção: Amat Escalante. Com Armando
Espitia, Andrea Vergara, Linda González, Juan Eduardo Palacios. 105 min.
O que você faria se encontrasse escondida na
caixa d’água da sua casa pacotes de cocaína que, certamente, valem um bom
dinheiro? Chamaria a polícia? Tentaria vender a droga e embolsar uma
grana? Procuraria encontrar o dono da
droga, para entregar-lhe a mercadoria?
Se livraria do produto, jogando-o fora?
É uma decisão complicada, principalmente considerando-se que a tal
cocaína não caiu do céu, foi colocada ali por alguém. Quem e por quê?
Até que você descobrisse o que aconteceu,
poderia já ser tarde demais. O jovem
Heli não sabia do namoro de sua irmã menor, Estela, de 12 ou 13 anos, com um
soldado do exército e que a droga fora roubada do próprio exército, que teria
de incinerá-la. Quem a guardou vai
querer tê-la de volta, a qualquer custo e pode causar muitos danos não só ao Heli
e à irmã, mas ao resto da família.
Esse mote serve ao diretor Amat Escalante para
mostrar as relações do narcotráfico com a polícia, o exército e a população,
num ambiente amplamente minado pela droga, onipresente e ilegal. E não vacila em adotar um hiperrealismo em
todas as cenas do longa, que mostram muita violência, tortura e requintes de
crueldade capazes de mexer com qualquer um.
Incomoda, e muito. Mas o que
revela da sordidez humana, da miséria, da diluição dos poderes institucionais
de um país como o México, é certamente instrutivo, conscientizador e...
desolador.
Sempre que um produto artístico escolhe um
viés, no caso, crítico e pessimista, sabemos que existem outros lados nessa
desgraça. Nem tudo é assim, não pode
estar tudo assim. Do contrário, o México
não subsistiria como nação. Mas que há
um povo despossuído, que sofre na carne as maiores brutalidades e paga um preço
alto pela guerra do narcotráfico, não há como negar.
O que se pode perguntar é se é mesmo preciso
ser explícito a esse ponto, na violência e crueldade que se mostra no filme,
para que as pessoas possam entender o que se passa. Afinal, trata-se de uma terapia de choque.
Nem todo mundo vai aguentar ou querer se
submeter a esse retrato cruel da realidade.
O Festival de Cannes, em 2013, aprovou e o longa “Heli” foi vencedor do
prêmio de melhor direção. Amat Escalante
também levou o troféu de melhor direção, na primeira edição do Prêmio Platino,
dedicado ao cinema ibero-americano, na cidade do Panamá, em abril de 2014.
Eu creio que existem outras maneiras de
abordar essa dura realidade que o filme se propôs a mostrar. A sutileza, a ironia, o humor, podem ser
armas tão ou mais eficientes do que a denúncia agressiva. Mesmo num mundo em que as pessoas podem parecer
anestesiadas diante de tanta coisa que veem.
O que é muito chocante pode produzir também o
efeito contrário: o da rejeição do assunto ou da forma apresentada. O que é muito assustador pode, ainda,
produzir impotência e paralisia. Quando
a dose é excessiva, a receita pode desandar, por melhores que sejam as
intenções e os ingredientes utilizados.
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