Antonio Carlos Egypto
À BEIRA DO CAMINHO. Brasil, 2011. Direção: Breno Silveira. Com João Miguel, Vinícius Nascimento, Dira Paes, Ludmila Rosa, Ângelo Antonio. 100 min.
As músicas de Roberto Carlos estão no imaginário da população brasileira há tantos anos, e de forma tão marcante, que não há quem não conheça e aprecie alguma de suas canções. Provavelmente, saberá cantar algumas letras e se identificará em várias das muitas histórias de amor, solidão, traição, desentendimento, fantasia ou ruptura amorosas que recheiam as criações do cantor e compositor mais conhecido do país.
O repertório romântico tem sido o forte da carreira de Roberto Carlos. Vai daí que não há surpresa alguma em que suas músicas possam servir de base para um filme que trate de relações amorosas. É exatamente o caso de “À Beira do Caminho”, um road movie que pega pela emoção, falando de um homem, o João (João Miguel), que se torna caminhoneiro e passa a viver na estrada para fugir de dramas do seu passado. E de um garoto, o Duda (Vinícius Nascimento), em busca de um pai que nunca conheceu, mas de quem tem uma foto e um endereço antigo, legado de sua mãe, que morreu.
No passado de João há um casamento, comemorado com o próprio ator entoando Nossa Canção, há uma traição, um acidente. E uma emoção tão intensa que acaba levando à sua própria negação.
Para o garoto Duda, maltratado precocemente pela vida, só pode haver esperança. A canção de Roberto Carlos Amigo, que ele canta, é especialmente transmissora desse desejo de encontrar alguém a quem possa amar e que seja capaz de amá-lo.
Uma mulher que vive um grande amor que ficou pelo caminho é Rosa (Dira Paes). Seu amor pode ajudar a mudar algo ou alguém, mas ela sabe que não poderá usufruir dele, porque não lhe pertence. Você Foi é o tema de Roberto para ela.
Filhos que ficam pelo caminho, abandonados por seus pais, e esta andança permanente por este mundo de Deus, aqui representada pelas estradas da Bahia, compõem a matéria-prima de um filme que é um desafio. Segundo as palavras do ator João Miguel, a fita fala de amor de uma maneira derramada e escancarada. Como as canções de Roberto Carlos, que estão na origem do roteiro e dessa história. Mas Breno Silveira consegue fazer dessa emocionalidade toda um filme que aborda o amor convincentemente. Não é apelativo, nem piegas, embora a música que o embale possa comover e trazer à tona sentimentos e lembranças fortes. Quem já perdeu um amor, sente saudades ou solidão (ou seja, todo mundo, ou quase todo mundo), vai se identificar com as músicas e os personagens de “À Beira do Caminho”.
Uma bela fotografia realça o mundo, a paisagem e os ambientes onde imperam a simplicidade e o rústico. O que mais se destaca no filme, porém, e o que lhe dá força e segura possíveis derrapadas melosas é o elenco brilhante que o encabeça.
João Miguel tem mais um grande desempenho em sua carreira, depois de “O Céu de Suely”, 2006, ”Cinema, Aspirinas e Urubus”, 2006, “Estômago”, 2007, e “Xingu”, 2011. Ele, num papel muito expressivo, de poucas falas, mas muita força no olhar e nos gestos, na transmissão de uma dureza construída a fórceps, fadada a se desfazer, de forma lenta e também penosa, está ótimo.
O garoto Vinícius Nascimento no papel de Duda é um parceiro muito rico para o endurecido João. O menino é muito convincente na sua perspicácia, no seu sofrimento e na sua esperança. Também mostra muito com seus olhares, sua postura e a química com João Miguel.
Dira Paes, a Rosa, tem papel menor que os dois protagonistas, mas sua intervenção é decisiva para promover uma mudança substancial na vida de João. Ela dá a medida exata da importância de seu papel e também dos limites que ele tem. É uma presença forte e luminosa no filme.
Ludmila Rosa, como Helena,Ângelo Antonio, como Afonso, e Denise Weinberg, como D. Maria do Carmo, têm papéis menores, complementares. Mas estão igualmente bem, compondo um painel de atuações que dá credibilidade ao trabalho cinematográfico conduzido por Breno Silveira, o diretor do sucesso “2 Filhos de Francisco”, de 2005. Ele parece à vontade no terreno pantanoso das emoções intensamente vividas ou represadas.
À Distância foi a música escolhida pelo próprio Roberto Carlos para representar o filme e seu protagonista. No final, uma daquelas frases típicas que são estampadas nos caminhões pela estrada resume o mundo emocional que a película retrata: “Espere o melhor, prepare-se para o pior e aceite o que vier”.
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