Antonio Carlos Egypto
SOB AS ESCADAS DE PARIS (Sous
les Étoiles de Paris). França, 2020. Direção: Claus Drexel. Com Catherine Frot, Mahamadon Yaffa,
Baptiste Aman, Jean-Henri Compère. 83
min.
Paris é uma cidade tão bela,
encantadora e sedutora, que um filme rodado inteiramente lá, por si só, já se
torna atraente. No caso em questão,
ainda mais, porque os personagens de “Sob as Escadas de Paris” perambulam por
seus espaços abertos e por seus subterrâneos às margens do rio Sena. São uma mendiga francesa, Christine
(Catherine Frot) e um menino africano de 8 anos, Suli (Mahamadon Yaffa),
perdido na cidade, que não fala a língua do país e cuja mãe está para ser
deportada.
Do encontro ocasional de ambos e de
suas andanças por todos os cantos de Paris, indo dos lugares turísticos aos
bairros mais populares e os que agrupam os deserdados da sorte, como as tendas
do canal San Martin ou os acampamentos de imigrantes de Porte de La Chapelle,
resultará uma abordagem poética. A do
menino, em busca da mãe, e a da mulher sem teto, que tem conhecimentos de
astronomia e se interessa em ler uma revista científica que achou no lixo.
Os pobres de Paris comportam alegoria
e realidade, sofrimento e solidariedade.
Boas pessoas parecem acolher a mendiga.
Já é mais difícil acolher o estrangeiro, em tempos de migrações forçadas
e preconceitos, mesmo sendo apenas uma criança.
Seja como for, as pessoas podem ser melhores e mais multifacetadas do
que imaginamos. Basta pensar na forma
como tendemos a encarar as pessoas que vivem em situação de rua, que podem
estar muito além do que supõe a nossa vã filosofia. E que podem apresentar motivos insuspeitados
em suas histórias de vida.
O diretor e corroteirista Claus Drexel
conviveu de perto, durante um tempo, com gente que vive na rua e que depende da
comida que é oferecida a eles diariamente e de roupas quentes ofertadas para
que possam resistir ao frio. O
documentário que resultou desse convívio foi o ponto de partida da ficção “Sob
as Escadas de Paris”. Só que aqui ele
buscou um registro quase atemporal, fabular, mesmo, que dialoga até com os
contos de fada, embora não seja um deles.
Outro aspecto importante: não por
acaso, trata-se de Paris. A beleza e o
requinte visual do filme se contrapõem diretamente ao que se poderia chamar de
feiura ou falta de charme da pobreza. Ou
o que poderíamos chamar de estética da fome.
Não, aqui a intenção é evidente.
É uma história de personagens deslocados, deserdados, emoldurada por
muita beleza.
Não só da cidade, diga-se de
passagem. Por exemplo, a escolha de um
objeto de brinquedo para o menino é a de um caleidoscópio, o que enseja muitas
imagens que evidenciam e multiplicam a beleza de tudo o que está ao redor e a
deles próprios, obviamente. Numa sequência em que Suli pensa ter visto sua mãe
e corre ao seu encalço, é a música de Schubert que o carrega, com toda a sua
beleza instrumental. Há, ainda,
referências à arte dos pintores, ao longo da narrativa.
Destaque-se
também os sentimentos, a redescoberta do humano em meio à tristeza e às
perdas. Como disse o artista mirim a
respeito de seu personagem “ele não entende as palavras, ele entende a
emoção”. Perfeito, e ele conseguiu uma
interpretação muito boa para o seu papel. O
destaque maior, claro, é o da atriz Catherine Frot, que nos passa uma gama de
sentimentos, desilusão, tristeza e encanto, assim como nos transmite tanto sem
dizer nada, especialmente na parte inicial do filme.
“Sob as Escadas de Paris” é um filme
que tem leveza, humor e drama, evita a tragédia, mas não a esconde e é
esperançoso, como costumam ser as fábulas.
Ainda nso fomos ao cinema. Quem sabe esse tenta a coragem. Bjs
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