sábado, 9 de maio de 2015

WINTER SLEEP


Antonio Carlos Egypto




WINTER SLEEP (Kis Uykusu).  Turquia, 2014.  Direção: Nuri Bilge Ceylan.  Com Haluk Bilginer, Melisa Sözen, Demet Akbag, Ayberck Pekcan.  196 min.


O turco Nuri Bilge Ceylan é um dos mais importantes cineastas em atividade no mundo.  Seus trabalhos cinematográficos são muito elaborados, têm densidade, complexidade e grande apuro visual.  Seus filmes “Climas”, de 2006, e “Era Uma Vez na  Anatólia”, de 2011, são reveladores do requinte e da qualidade técnica de sua obra.  Não surpreendeu, portanto, que seu novo filme, “Winter Sleep”, tenha levado a Palma de Ouro do Festival de Cannes. 




É mais um grande filme desse diretor.  Grande, não só no talento, mas também na duração: são nada menos do que 196 minutos de projeção.  Mas vale a pena encará-los, o ritmo é lento, mas o filme trata com profundidade de questões pessoais, de relacionamentos e conflitos, altamente reveladores de sentimentos, mágoas acumuladas, opressões, humilhações, concessões, catarses.  Referências literárias e teatrais, como Tchekov, Dostoiewski e Strindberg, são visíveis.  Muitos momentos lembram os diálogos fortes e cortantes dos filmes de Ingmar Bergman.

Também estão marcadamente trabalhadas as manifestações de classe social, não só as diferenças de poder e interesses, os inevitáveis confrontos, mas as barreiras e impossibilidades que surgem das tentativas ingênuas ou equivocadas de reduzi-las ou negá-las.




Os níveis psicológico e social se interpenetram nos dramas vividos pelos personagens, em meio à beleza turística da região da Capadócia, na Anatólia Central.  O personagem principal da narrativa é Aydin (Haluk Bilginer), dono de um hotel, escritor e ex-ator,  com grande poder na pequena localidade onde vive, em função do dinheiro que acumulou.  Benfeitor ou opressor, nos limites da própria casa ou da propriedade que comanda, manipulador das relações que maneja, é colocado em xeque pelo casamento que realizou com uma mulher muito mais jovem, Nibal (Melisa Sözen), que constrói sua própria visão de mundo e questiona sua realidade e seu vínculo matrimonial.
Questões intelectuais ligadas à ética da criação literária ao autoengano e à filosofia da existência emergem das relações com a irmã que mora com ele, Necla (Demet Akbag), e opõem um ao outro. 


 

Em relação aos empregados e aos inquilinos com aluguel em atraso, se tecerá uma rede de conflitos sociais capaz de agravar as relações de todos, naquele ambiente, em que até mesmo os turistas, que se servem do hotel, podem entrar na dança.




A Capadócia, em suas estranhas formas, é explorada visualmente como referência de aridez, isolamento, instintos e expressões selvagens, como a dos cavalos soltos no ambiente.  A neve que advirá no inverno congela os corações e as possibilidades, enquanto o fogo aquece temporariamente, mas é também destruidor de ilusões.  Os enquadramentos e o trabalho de câmera, sutil e delicado, se valem da beleza da região para produzir o requinte visual que marca a produção do cineasta.  Os atores e atrizes que dão vida a todas as reflexões propostas pelo filme são muito convincentes e competentes na tarefa que abraçaram.  E Nuri Bilge Ceylan, como diretor, e também roteirista, vai construindo uma obra cinematográfica como poucas na atualidade.




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