Antonio Carlos Egypto
INVERNO DA ALMA (Winter’s Bone). Estados Unidos, 2010. Direção: Debra Granik. Com Jennifer Lawrence, John Hawkes, Dale Dickey, Lauren Sweetser e Tate Taylor. 100 min.
Quem está acostumado a acompanhar o cinema europeu e de todo o mundo não se surpreenderá com uma história que se centra nas carências humanas, tais como a fome, o abandono familiar e a violência dos produtores de droga, envolvendo uma comunidade rural. Pois esse é o contexto de uma produção norte-americana independente, de baixo orçamento, que tem indicações, inclusive a de melhor filme, na premiação do Oscar: “Inverno da Alma”.
A protagonista da ação é a jovem Ree (Jennifer Lawrence), de 17 anos, que se torna responsável por sua família, quando os pais a abandonam. O pai sumiu, esteve preso. Estaria morto? Envolvido por sua participação na indústria local de drogas (cocaína, maconha, metanfetaminas) é a figura insistentemente procurada por todos, especialmente por ela.
A mãe está fisicamente presente, mas mentalmente ausente. Vive uma existência autista, imprestável para qualquer coisa. É um peso a mais na vida da adolescente Ree, que tem de cuidar da casa e alimentar e educar seus irmãos menores, um garoto de 12 anos e uma menina de 8 anos. E desde que soube pelo xerife que sua própria casa foi dada pelo pai em fiança, para poder sair da cadeia, está à procura dele, passando por provações incríveis, que ela enfrenta com muita coragem. Não tem outra escolha? Pode ser. Ainda assim, é demais para uma garota dessa idade.
O personagem Ree acaba sendo perfeito demais. O contraste é ainda maior com o personagem Sonny, o irmão de 12 anos, que é infantil, dependente e sem qualquer iniciativa, exceto em uma única cena, fugaz. Quem vive nas circunstâncias de penúria em que ele vive já teria de ter aprendido a se virar. Enquanto Ree sabe de tudo aos 17 anos, Sonny não sabe de nada. Na verdade, ambos personagens improváveis.
Os adultos, até mesmo o tio dela, irmão do pai sumido, estão muito comprometidos para conseguir ajudar e acabam relegando as crianças e a adolescente à sua própria sorte. Restam os vizinhos, dispostos à solidariedade diante da fome.
Um retrato do interior dos Estados Unidos sem moldura dourada. As carências e tragédias da chamada “América profunda”. Ou o avesso da América da classe média, da tecnologia e do consumo. “Inverno da Alma” é um filme que pega pesado e é corajoso no retrato que faz de uma realidade bem pouco ou quase nada mostrada por Hollywood. Tem cenas desagradáveis de se ver, mostra lugares pobres, numa estética suja, ausente qualquer glamour e, é claro, nos faz refletir sobre essa crua realidade que também faz parte da América.
Eu diria que se distancia bastante da produção hollywoodiana típica, tendo mais parentesco com a produção alternativa que se produz pelo mundo afora, embora Hollywood também comporte tragédias humanas realistas, como foi o caso de“Preciosa”, de 2009. Devidamente oscarizada, inclusive (Mo’Nique, como atriz coadjuvante, e roteiro adaptado). Só que “Preciosa” cultivava uma esperança com a qual “Inverno da Alma” não compartilha.
sábado, 29 de janeiro de 2011
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