Antonio
Carlos Egypto
A LIÇÃO (Urok). Bulgária, 2014. Direção: Kristina Grozeva e Petar
Valchanov. Com Margita Gosheva, Ivan
Burnev, Ivanka Bratoeva, Ivan Savov. 105
min.
Sempre estive muito antenado com o cinema de todas as
partes do mundo que chega até nós. Não
só nas programações normais, mas também nas mostras e festivais que acontecem
em São Paulo. Mesmo assim, não me consta
que eu tenha assistido a nenhum longa-metragem búlgaro. Da Bulgária, só tenho registro de um curta,
muito inventivo, por sinal, chamado “O Ritual”, de 2005. Sendo assim, “A Lição”, que está sendo
lançado nos cinemas agora, e é um filme de 2014, adquire especial relevo. E, independentemente da nacionalidade, é um filme
que vale a pena ver.
Inspirando-se em notícias de jornal, os diretores
realizaram uma narrativa que põe em evidência o dilema moral e a relatividade
de princípios orientadores de conduta.
Trata-se de uma situação aparentemente corriqueira, a que se apresenta
de início. Nadezha ou Nade (Margita
Gosheva) é professora de crianças e, frente a algo roubado em sala de aula,
procura de todas as formas o culpado, para que possa lhe dar uma lição de vida,
como educadora. E, na ausência dele,
ensinar a toda a classe que atitudes tomar em casos como esse. Seus princípios não põem em dúvida o erro
moral que é roubar. No entanto, diante
das situações em que ela terá de se envolver em sua vida, ao longo da trama,
essa verdade se mostrará frágil, bem diferente de uma simples e inquestionável
aplicação de princípios.
Se um roubo pode ser compreendido e até admitido, em
algumas circunstâncias, que outros comportamentos inaceitáveis podem vir a ser
acolhidos como possíveis? E isso
significa uma derrocada ética, se acontecer?
Que a vida nos exige algo mais do que seguir uma
cartilha de bons princípios é evidente.
A realidade é muito mais complexa e desafiadora do que qualquer código
moral possa abarcar. Só vivendo certas
situações para entender. É isso que o filme “A Lição” faz: nos leva a viver com
a professora Nade o dilema de fazer escolhas que nos colocam numa saia justa ou
no olho do furacão. No limite do
ridículo, do absurdo, o que pode até remeter ao humor. Mas, não, é um drama e dos mais fortes.
A vida da professora é de penúria, muito digna, mas
muito pobre. O salário não dá para
nada. O jeito é tentar ganhar um
dinheiro extra, fazendo traduções. Mas,
e se esse pagamento que se arrasta acabar não vindo, como viver, como pagar as
contas? É isso que está na base do drama
da educadora. É, a vida dos professores na Bulgária não é mole, não. Falta valorização, respeito, pagamento
digno. Ainda bem que é só na Bulgária,
não é mesmo?
“A Lição” tem em Margita Gosheva uma grande atriz e
um elenco de atores profissionais e amadores que convencem ao viver essa trama
desafiadora dos comportamentos morais.
O filme pretende ser o primeiro de uma trilogia que
se espelha no que os jornais noticiam e desenvolve uma história a partir disso;
o segundo já está a caminho. “A Lição” tem sido exibido em muitos festivais
mundo afora, já tendo conquistado prêmios em San Sebastian e nos festivais
internacionais do Equador, do Thessaloniki, de Tóquio, de Gotemburgo, de Sofia
e de Luxemburgo.
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