Antonio Carlos Egypto
O QUE SE MOVE. Brasil, 2012.
Direção: Caetano Gotardo. Com
Cida Moreira, Dagoberto Feliz, Wandré Gouveia, Marina Corazza, Andrea Marques,
Rômulo Braga, Henrique Schefer, Adriana Mendonça. 97 min.
Alfred Hitchcock teria dito,
certa vez, que uma notícia de jornal pode virar um bom filme. É verdade, porque o que importa não é a
notícia em si mesma, mas o tratamento cinematográfico que ela receberá. A forma como ela será contada, por meio de
imagens, falas, sons, tempos mortos, cores, impacto visual.
“O Que Se Move”, primeiro
longa-metragem de Caetano Gotardo, partiu não de uma notícia de jornal, mas de
três. São situações diferentes, que
envolvem núcleos familiares distintos e dizem respeito a perda, reencontro,
revelação de familiar “desconhecido”.
Quem já não leu, viu ou ouviu
notícias como a de um bebê esquecido num carro num estacionamento? Ou da descoberta de um pedófilo virtual, por
meio de uma investigação policial? Ou,
ainda, de um familiar desaparecido, que é encontrado após muitos anos? Coisas como essas podem não ser usuais, mas
vivem acontecendo e sendo noticiadas.
Por isso mesmo, é possível imaginar o que sucede em volta delas, no seu
entorno, no sentimento dos personagens envolvidos, no mistério que fica no
ar. Foi isso que “O Que Se Move” fez:
deu um tratamento ficcional aos acontecimentos jornalísticos, investigando o
que pode estar por trás deles, o que se relaciona com eles, o que essas coisas
podem significar para as pessoas.
Essa investigação se faz pela
estética dos rostos, olhares, silêncios, pela ambientação das cenas. Pelo que se diz fora do quadro, pelo que não
se vê, não se diz, mas se intui. Pelos
tempos longos, pelos gestos suprimidos.
Ou seja, por uma forma de narrar que se vale dos recursos
cinematográficos com paciência e criatividade.
Isso resulta num filme surpreendentemente muito bom para um jovem
cineasta em seu primeiro longa.
Quem se dispuser a acompanhar o
desenrolar das três histórias, sem ansiedade e sem pressa, poderá usufruir do
clima e das sutilezas que a narrativa do filme nos traz. Cada uma das histórias vai revelando, pouco a
pouco, do que se trata, de quem se trata e, sobretudo, dos sentimentos
experimentados ali pelos protagonistas de cada episódio. Eles são separados por um canto que, de
alguma forma, resume a situação apresentada.
Causa uma certa estranheza, mas funciona.
Ao mesmo tempo, é possível pensar
no que as notícias representam, não só para aqueles personagens, mas para o
mundo de hoje. E podem-se imaginar
outras reações ou consequências para os mesmos fatos. Esse seria um exercício muito interessante,
que poderia ampliar a compreensão das situações que acompanham o nosso
cotidiano na vida urbana atual. O filme
se presta a isso, porque faz uma leitura possível dos acontecimentos, por meio
de uma especulação psíquica sobre as pessoas presentes em cada situação. E deixa em aberto inúmeras outras
possibilidades.
O desempenho do elenco dá muito
bem conta do experimento cinematográfico que é “O Que Se Move”. A representação contida, meio misteriosa, que
contrasta com a intensidade dos sentimentos em momentos cruciais, como um choro
convulsivo, por exemplo, exige dos atores e atrizes muito domínio de suas
atuações. O resultado obtido pelo
conjunto é bastante convincente.
“O Que Se Move” é um filme que
aborda a contemporaneidade urbana brasileira de forma instigante, a partir do
que parece muito pessoal e concreto, mas, na verdade, é coletivo e simbólico.
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