quarta-feira, 29 de junho de 2022

A COLMEIA

 Antonio Carlos Egypto

 

 


A COLMEIA.  Brasil, 2019.  Direção: Gilson Vargas.  Elenco: Andressa Matos, João Pedro Prates, Rafael Franskowiak, Janaína Pelizzon.  110 min.

 

“A Colmeia”, realização gaúcha, dirigida por Gilson Vargas, tem uma atmosfera pesada, em perfeita sintonia com o drama humano que apresenta.  Utiliza-se de cores esmaecidas, cinzentas como o clima, com um verde acinzentado, revelador de uma natureza mais opressiva do que acolhedora.  A trilha sonora de Léo Henkin acentua o peso da situação vivida pelos colonos alemães nos interiores do sul do Brasil, em meio à Segunda Guerra Mundial.

 

Naquele momento, havia a proibição de falar alemão ou cultivar hábitos e costumes de origem alemã.  Mais do que isso, havia uma franca hostilidade no entorno desse ambiente rural já isolado e quase nada integrado ao novo meio para esses imigrantes.  O clima é de permanente desconfiança e medo.  E, apesar do isolamento, o eventual contágio com o ambiente de fora traz piolhos para o grupo de colonos: várias sequências de cortes de cabelo, marcados pela dor de fisionomias dilaceradas e choro, indicam a vulnerabilidade do grupo.  Como se não bastasse, a realidade maior deles é a da fome permanente.

 

Os personagens que compõem o grupo de colonos alemães não são explicitados, nem  desenvolvidos, pela narrativa.  Mas são oito pessoas, os adultos Werner (Rafael Franskowiak) e Bertha (Janaína Pelizzon) detêm maior poder.  Especialmente Werner, num contexto machista.  Os demais adultos enfrentam o trabalho igualmente, Kasper, Uli, Liila e Erika.  Com outra perspectiva e desejo de mudar ou sair dali, está um casal de adolescentes gêmeos: Mayla (Andressa Matos) e Christoffer (João Pedro Prates), na verdade, os protagonistas da história.

 

                                                                      Bruno Polidoro   
  

É apenas um fio de história, mesmo sendo uma situação forte e intensa.  Daí a ideia dos favos da colmeia, os elementos definidores daquele mundo, daquele momento, que também podem dialogar com questões contemporâneas.

 

O bullying  que Christoffer sofre na escola e o grupo todo sofre pela pichação na casa e pelos eventuais encontros nos campos e floresta, o preconceito que faz com que se atribuam as culpas de tudo aos bugres, demonizando os povos originários vistos como impuros e selvagens, o machismo em que os homens, embora em tudo iguais no trabalho com as mulheres, continuam dando a última palavra, são exemplos desses favos.  A desconhecida Sndrome do Pânico também está presente e o canibalismo entra na história como elemento simbólico, mas também de sobrevivência.

 

O filme se desenvolve em ritmo bem lento, com muito poucos diálogos e desempenhos contidos dos atores e atrizes em todos os papéis.  Os personagens aguentam, engolem tudo em silêncio, até que a pressão se torne insuportável e, então, o grito de desespero ou o descontrole inevitavelmente ocorram.

 

“A Colmeia” realiza um trabalho artístico de qualidade num produto sem qualquer concessão.  Dirige-se, é claro, a um público menor, já acostumado a valorizar este tipo de approach  estóico e minimalista.



3 comentários:

  1. Teria dificuldade em assisti-lo nesse nosso momento histórico tão impregnado desse clima

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  2. Tenho visto seus comentários e
    apreciei, especialmente o que aborda o filme sobre a chamada "peste gay". Muito esclarecedor. Conti.

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  3. Obrigado Conti. Você está falando de OS PRIMEIROS SOLDADOS , certo?

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