Mostrando postagens com marcador Clássico. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Clássico. Mostrar todas as postagens

terça-feira, 24 de dezembro de 2024

O AUTO DA COMPADECIDA 2

 

           Antonio Carlos Egypto

 



O AUTO DA COMPADECIDA 2. Brasil, 2023.  Direção: Flávia Lacerda e Guel Arraes.  Elenco: Matheus Nachtergaele Selton Mello, Taís Araújo, Humberto Martins, Luís Miranda, Eduardo Sterblich, Fabíula Nascimento.  113 min.

 

25 de dezembro de 2024, dia de Natal, tem lançamento cinematográfico relevante: “O Auto da Compadecida 2”.  Vinte e cinco anos depois de um dos maiores sucessos do cinema brasileiro de todos os tempos, o clássico “O Auto da Compadecida”, Guel Arraes, volta à direção, agora ao lado de Flávia Lacerda, para trazer de volta às telonas dois ícones da cultura nordestina e nacional: João Grilo e Chicó.  Saídos das páginas encantadas de Ariano Suassuna, viraram figuras humanas, ao mesmo tempo concretas e mitológicas, no desempenho de Matheus Nachtergaele e Selton Mello. 

 

Creio que não há brasileiro que não tenha visto o filme ou a série que o antecedeu e, portanto, conheça toda a história que uniu o inteligente, criativo e espertalhão que aprontava tudo para tentar sobreviver, o João Grilo de Matheus Nachtergaele ao frouxo e medroso contador de histórias, o mentiroso Chicó, de Selton Mello.

 

Retomá-los agora para uma continuação, uma homenagem ou uma refacção, nada mais justo.  Porque eles valem muito a pena.  E por que não auferir lucro mais provável com aquilo que já deu muito certo?  Hollywood cansa de fazer isso.  No cinema brasileiro isso ainda é uma novidade.

 

O problema é que raramente essa retomada de algo que deu tão certo que se tornou um clássico indubitável consegue alcançar o nível de excelência do produto original.  E isso é perceptível em “O Auto da Compadecida 2”.  Se os protagonistas e seus intérpretes mantêm a mesma força, a história, não.  Ela acaba trilhando quase os mesmos caminhos do filme anterior, em que pesem os novos personagens e situações criados, em busca da fidelidade ao espírito do trabalho de Suassuna.

 

Foto de Laura Campanella

Taperoá está de volta, mas vinte anos depois, a ação está agora nos anos 1950 e não mais nos 1930.   O sertão nordestino já não é filmado lá, mas feito em estúdio, com uso de tecnologia de ponta.  Se o primeiro filme já rompia com o naturalismo e se permitia uma incursão importante no cinema fantástico, aqui a cidade imaginária está mais descolada da realidade e da literatura de cordel que serviu de base à obra de Ariano Suassuna.

 

É verdade que Chicó vende a vida, paixão e morte de João Grilo por meio de seus santinhos de madeira, na crença da morte de seu amigo desaparecido há tanto tempo.  Mas as figuras arquetípicas ficam um pouco atropeladas pelo modernismo do rádio e da loja Magazin, ambos de seu Arlindo (Eduardo Sterblich), que quer mais poder, e a prefeitura local, também disputada pelo coronelismo tradicional, do coronel Ernani (Humberto Martins).  Aí entra o heroísmo de João Grilo para fazer a diferença e atropelar os dois polos do poder local. Merece destaque a figura de Antonio do Amor (Luís Miranda) que tenta “ajudar” João Grilo a sair de enrascadas, mas arruma outras.

 

E então a narrativa tem, necessariamente, que caminhar rumo à Compadecida, agora vivida por Taís Araújo.  O sentido do dejà vu é inevitável, ainda que tudo seja muito bem feito e engraçado.

 

O trabalho do roteiro que envolveu Guel Arraes, João Falcão e as colaborações de Adriana Falcão e Jorge Furtado deve ter sido bem desafiador e difícil.  Era uma grande e perigosa empreitada.  Não se pode dizer que não tenha sido bem-sucedida.

 

O elenco, que era portentoso na versão original, tem alguns de volta, mas, independentemente disso, é muito, muito bom.  A trilha sonora de João Falcão e Ricco Viana, acrescida de músicas famosas e conhecidas, como a Canção da América, de Milton Nascimento, para celebrar a amizade dos dois protagonistas, ou o Como Vai Você, com Chico César, no encontro de Chicó e sua Rosinha, revisitada por Virgínia Cavendish, agora mulher independente e caminhoneira, funciona bem e dá ritmo ao filme.  Ou seja, é um bom trabalho, que envolveu muitos talentos.  Não dá para comparar com o original, mas até aí tudo bem.




 

domingo, 28 de julho de 2024

3 MOSTRAS DE CINEMA

Antonio Carlos Egypto

 

Em São Paulo tem tanta coisa acontecendo ao mesmo tempo que se torna difícil escolher o que fazer.  E não é preciso muito dinheiro para isso, não.  Vou falar de três mostras importantes de cinema que ocorrem simultaneamente, com ingressos a preços ultra promocionais ou gratuitos.

 


Pela primeira vez, o cine Reag Belas Artes vai promover uma mini-mostra internacional de filmes de todas as partes do mundo.  Estão previstos 20 filmes de 20 diferentes países para o Festival Filmes Incríveis (FFI), que ocorre naquele cinema de 1º a 14 de agosto.  Já estão confirmados o Irã, Camboja, Geórgia, Costa Rica, Índia, Nepal, Arábia Saudita, Tunísia, Cuba, Macedônia do Norte, Romênia, Coreia do Sul, Polônia, Japão, França, Bélgica, Canadá, Estados Unidos e Brasil.  São filmes inéditos, escolhidos por características de produção que escapam ao padrão comercial e não necessariamente têm obtido grandes prêmios em festivais internacionais ou pertençam a diretores já consagrados.  Fazem parte daquele espírito cinéfilo de encontrar pepitas de ouro cinematográficas.  Já vi alguma coisa em cabines de imprensa.  Por exemplo, o filme indiano A NUVEM E O HOMEM, de 2021, que estabelece o vínculo surrealista entre os substantivos do título, valendo-se de uma inesperada abordagem realista, é, no mínimo, curioso.  CAFÉ TEERÃ, do Irã, 2023, mostra a vida e as desventuras pelas quais passa um cineasta impedido de filmar e que espera por uma sentença para passar anos na cadeia.  Enquanto isso, cuida de um café na cidade, homenageando cineastas, como Kieslowski, Woody Allen e Kiarostami, que dão nome e imagem às mesas do estabelecimento.  Em tempos de inteligência artificial e fake News, nada mais surpreende, nem mesmo um filme encontrado, supostamente de 1941, que conta uma história da guerra em Londres, por meio da descoberta, por duas irmãs, de equipamentos de comunicação que são capazes de captar emissões no futuro.  Isso é LOLA, do Reino Unido, 2022, em que se vê, por exemplo, Hitler desfilando em Londres.  Nem sei o que dizer.  Melhor recomendar o filme de Karim Aïnouz, MOTEL DESTINO, que concorreu em Cannes e que ainda não vi.  E o filme do grande diretor Rithy Panh, do Camboja, que é tiro certo na qualidade: o documentário ENCONTRO COM O DITADOR, 2024.  Sessões a R$10,00 e R$5,00, a meia.  Para quem dispõe de tempo, dá para ver dois ou três filmes no mesmo dia.

 


No Cinesesc, ocorre, de 31 de julho a 14 de agosto, a 2ª. edição da Mostra Amor ao Cinema, que traz três filmes inéditos importantes: o indiano A ÚLTIMA SESSÃO, de Pan Nalin, de 2022, COUPEZ! (Corta!) de Michel Hazanavicius, 2023, e principalmente FECHAR OS OLHOS, do diretor espanhol Victor Érice, um dos melhores da 47ª. Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.  O Festival, que focaliza o cinema como tema e fonte de amor, tem vários clássicos restaurados, cursos e debates abordando o cinema atual e, ainda, uma programação na plataforma Sesc Digital, streaming gratuito do Sescsp.  Os ingressos no Cinesesc custam R$10,00 e os cursos são gratuitos.  Mais informações e programação completa em sescsp.org.br/amoraocinema

 


Como se não bastasse, a 13ª. Mostra Ecofalante de Cinema, que discute a emergência climática, traz 122 filmes de 24 países sobre as questões ambientais e ocorre de 1º. a 14 de agosto, em diversos cinemas de São Paulo, em sessões totalmente gratuitas.  Os cinemas são o Reserva Cultural, o Bijou (Satyros Bijou), o Centro Cultural São Paulo e o circuito SpCine, em vários CEUs, pela cidade.  As questões urgentes do desarranjo climático que estamos vivendo estão em destaque nesse ciclo de filmes.  Veja a programação em www.ecofalante.org.br .

Que tal experimentar o dom da ubiquidade para ver tudo isso nesse período de 15 dias de agosto de 2024?

 

terça-feira, 5 de abril de 2022

DZIGA VERTOV 2021

Antonio Carlos Egypto




Dziga Vertov (1896-1954) foi um dos mais importantes cineastas da história do cinema.  Seu "O Homem com a Câmera", de 1929, que acompanha uma cidade do amanhecer ao anoitecer, retratando o seu cotidiano e celebrando a modernidade que a cidade russa conquistava, é um grande clássico e inspiração dos documentaristas desde sempre.

Vertov é considerado o criador do cinema verdade, aquele em que a câmera, como o olho humano, registra os fatos, os acontecimentos, sem sentimentalismo, livre das influências teatrais, do palco, dos estúdios.  A realidade, em lugar das coisas encenadas.  Por meio de filmes documentais e experimentais, Vertov fazia um cinema realista, que captava o momento histórico, as tensões, a evolução humana e material, guiado pelo olhar.  E desse modo redescobria as coisas, revia e significava os fatos.  De montador de filmes e noticiários, o diretor soviético se tornou um dos mais famosos documentaristas, além de teórico do cinema.

Reencontrar um filme considerado perdido de Dziga Vertov 100 anos após a sua realização, restaurado por Nikolai Izvolov, para reexibição nos cinemas, num trabalho de dois anos de uma produtora israelense, é um presente e tanto para todos.  O filme HISTÓRIA DA GUERRA CIVIL foi lançado em 1921 e exibido no 3o. Congresso Internacional Comunista em Moscou e nunca mais reexibido antes do seu relançamento em 2021, em festivais pelo mundo e que chega agora aos cinemas do Brasil, iniciando por ser apresentado em uma sessão especial do festival É TUDO VERDADE 2022.

Assisti-lo hoje é uma experiência incrível, emocionante.  Ver imagens captadas durante a guerra civil russa, de 1918 a 1921, com cenas filmadas em pleno campo de batalha, com a movimentação de tropas, armamentos e equipamentos, os confrontos, os momentos de relaxamento e cuidados pessoais, as imagens dos líderes e heróis do governo e do exército vermelhos, inclusive com uma breve aparição de León Trotsky, os prisioneiros, os julgamentos, as vestimentas e tudo o mais, nos coloca dentro dos acontecimentos.  Somos envolvidos por eles e por aquelas imagens distantes no tempo, mas magnificamente realizadas e recuperadas.  É como entrar num novo tempo e espaço.  Não importam os detalhes, a preocupação com tentar contar a história da guerra civil em sua cronologia real, recuperar e rearranjar suas partes.  Mais do que tudo, o que fica é o mergulho real naquele mundo, naquele período, naquela região geográfica.

Como um filme mudo, centenário, em preto e branco, pode ser tão empolgante?  A trilha sonora realizada por Roger Miller e Terry Donahue por certo contribui para isso e é uma criação à parte.  Não há registros do que Vertov utilizou como acompanhamento musical de seu filme silencioso à época.  Também não importa a conotação ideológica de apoio declarado ao regime soviético que se consolidava.  Porque, para Vertov, os fatos se expressam como são, podem ser vistos pela câmera como pelo nosso olhar atento, apurado.

Num tempo em que as narrativas tentam se impor aos fatos, como temos visto muito por aqui, o trabalho de Dziga Vertov segue atual e revolucionário.  Nos ensina a ver o que se passa, a observar.  As conclusões de cada um vêm depois.  No jornalismo sério, são os fatos que nos guiam.  Podemos observá-los sob diferentes ângulos e visões e interpretá-los de diferentes maneiras, mas ainda assim eles estão lá e é preciso respeitá-los.  93 min.



quinta-feira, 18 de fevereiro de 2021

AMOR, ESTRANHO AMOR

Antonio Carlos Egypto

 




AMOR, ESTRANHO AMOR.  Brasil, 1982.  Direção e roteiro: Walter Hugo Khouri.  Com Tarcísio Meira, Vera Fisher, Marcelo Ribeiro, Xuxa Meneghel, Mauro Mendonça, Íris Bruzzi, Walter Forster.  120 min.

 

Um filme erótico-histórico, produção caprichada, realizada com grande elenco por um dos diretores brasileiros mais competentes da nossa cena cinematográfica: Walter Hugo Khouri (1929-2003).  Essa é uma boa e correta apresentação para “Amor, Estranho Amor”, que ficou tanto tempo sem poder ser exibido por força de decisões judiciais, que o impediram de ser visto no Brasil, a partir de ações impetradas pelos representantes de Xuxa Meneghel, que detinha os direitos de exibição.  Isso desde os anos 1980.  Somente agora o filme volta a ser exibido, pela TV, no Canal Brasil, em operadoras de TV por assinatura.

 

Polêmicas à parte, a trama do filme se desenrola a partir das memórias de um homem hoje poderoso, que morou somente alguns dias numa luxuosa mansão em que vivia sua mãe, uma prostituta que compartilhava com os políticos e outros figurões uma vida de luxo e submissão ao poder.  Esse homem, Hugo, papel de Walter Forster, descobriu a sexualidade aos 12 anos de idade nesse ambiente altamente erotizado, cercado pelo interesse de belas mulheres.  O papel de Hugo menino coube a Marcelo Ribeiro, que não seguiu carreira como ator, apesar de já ter trabalhado com Khouri em “Eros, o Deus do Amor”, no ano anterior.  Talvez por conta mesmo da polêmica que se seguiu a “Amor, Estranho Amor”.

 

As memórias de Hugo adulto, esse personagem que quase não fala no filme, remetem a algo muito intenso e muito forte, que marcou sua vida a ponto de ele preservar essa mansão, um patrimônio arquitetônico, e desejar transformá-la em um centro cultural, muitas décadas depois.  O bordel de luxo dando lugar a um acervo cultural.

 




Anna, papel de Vera Fisher, lindíssima, mas frágil como atriz, a mãe de Hugo, não era a dona do bordel, mas a figura mais importante do local pelo que representava para um grande político paulista, o dr. Osmar, em ótimo desempenho de Tarcísio Meira.  Íris Bruzzi, a Laura, era a dona do negócio.

As memórias remetem ao mês de novembro do ano de 1937, quando eclodiria o Estado Novo, de inspiração fascista, decretado por Getúlio Vargas.  Mas, no prostíbulo, as relações políticas se dão na base da dobradinha café com leite.  São Paulo e Minas tentavam se cacifar para vencer as próximas eleições, que acabariam não acontecendo.  Os personagens do dr. Osmar e do dr. Benício, político mineiro vivido por Mauro Mendonça, urdem uma aliança eleitoral em que uma bela e suposta virgem entrará como presente, moeda de troca na aliança. Aí é que entra Xuxa Meneghel, no papel de Tamara, o “presente”.  Além de servir ao político mineiro, a jovem se envolve na trama com o pré-adolescente Hugo em cenas eróticas e com direito a nudez de Xuxa.  Vamos lembrar que ele tinha apenas 12 anos.  Ela, não muito mais idade, 18 ou 19 anos, mas, obviamente, mais experiente e dona de si.

 

Quanto à nudez, todas as lindas mulheres do filme são mostradas nuas, numa beleza requintada, típica dos trabalhos de Walter Hugo Khouri, cuja inspiração maior sempre foi Ingmar Bergman.  Portanto, estamos diante do chamado filme de arte, que se diferencia da pornografia.  Não visa meramente à excitação do espectador, mas oferece a beleza feminina embalada pela reflexão histórico-política, fazendo uma equiparação muito interessante entre a vida no bordel e as articulações político-partidárias.  O sexo e o poder imbricados em conluio permanente.  E a corrupção entre eles, alimentando tudo.  Muito atual tudo isso, não?

 




Bem, mas por que o tabu, a proibição?  O filme foi lançado em 1982.  Apenas dois anos depois, Xuxa enveredaria para a função de apresentadora de programas infantis na TV e acabaria tornando-se a “rainha dos baixinhos”, na Globo.  Como essa rainha seria vista nua, em cenas eróticas, com um “baixinho” na cama?  Dá para entender a preocupação com a imagem da apresentadora naquele momento.  Mas não para aceitar o banimento de uma obra de arte que, na realidade, em nada compromete a pessoa ou a atriz em questão.

 

É uma pena que o moralismo tacanho vença certas batalhas, provocando retrocessos incompreensíveis.  A própria Xuxa recomenda hoje que se veja o filme, liberado para exibição em 2018.  Um pouco tarde, mas sempre é possível resgatar coisas.  No caso de “Amor, Estranho Amor”, o filme, sem dúvida, merece ser visto ainda hoje.  Tem muito a dizer.  E sua apreciação estética é gratificante.  Até porque a cópia veiculada pela TV está com muito boa qualidade.  O filme já foi exibido há poucos dias, mas fiquem atentos.  Em breve, será possível vê-lo novamente no Canal Brasil.

   


quinta-feira, 1 de fevereiro de 2018

A FORMA DA ÁGUA e O MONSTRO DA LAGOA NEGRA


Antonio Carlos Egypto


A FORMA DA ÁGUA (The Shape of Water).  Estados Unidos, 2017.  Direção: Guillermo del Toro.  Com Sally Hawkins, Octavia Spencer, Michael Shannon, Richard Jenkins, Doug Jones, Michael Stuhlbarg.  123 min.

O MONSTRO DA LAGOA NEGRA (Creature from the Black Lagoon)Estados Unidos, 1954.  Direção: Jack Arnold.  Com Julie Adams, Richard Carlson, Richard Denning, Nestor Paiva.  80 min.





Reconheço que “A Forma da Água” é um título poético para o filme de Guillermo del Toro, que conseguiu o maior número de indicações para o Oscar 2018: 13.  No entanto, sendo mais concreto, o filme poderia se chamar A Forma na Água ou A Criatura na Água ou, ainda, O Monstro na Água, porque é disso que se trata.  Uma criatura estranha, uma espécie de homem-anfíbio, que remete a “O Monstro da Lagoa Negra”, o filme de Jack Arnold, de 1954, em que se falava de um homem-peixe, algo que cientistas pesquisavam, em busca de encontrar um elo perdido na evolução humana.

Em “A Forma da Água”, não é muito diferente.  Aqui estamos num laboratório estadunidense, em que se fazem experimentos secretos com o tal homem-anfíbio, que vive na água, já não mais na romântica lagoa negra da Amazônia brasileira, mas num conteiner dentro do laboratório.  Embora almejando as águas abertas que levem ao mar.

O MONSTRO DA LAGOA NEGRA

 Pois bem, as duas figuras se assemelham muito, evidenciando que a inspiração de “A Forma da Água” foi o monstro da lagoa negra.  Essa figura humana-animal aparece como um ser que assusta, aterroriza, ao mesmo tempo em que atrai o interesse.  O que é estranho, diferente, é perigoso e, no limite, deve ser destruído.  Antes, porém, vamos explorá-lo, extrair dele o que nos interessa.  No contexto da Guerra Fria dos anos 1960, é a competição com a União Soviética, vista como inimiga, que move as ações.  Suspeita-se do que é diferente, daquele que traz perigo. Como sempre acontece.

Diferentes também se atraem e uma moça muito bonita como Kay (Julie Adams), em “O Monstro da Lagoa Negra”, ou, pelo menos, muito gentil e afetiva, como a Elisa (Sally Hawkins), de “A Forma da Água”, produzem uma atração no tal monstro.  Aí, a referência à história de A Bela e a Fera é óbvia.  No filme de Guillermo del Toro, com um elemento novo, talvez politicamente correto, a bela é uma moça portadora de deficiência comunicativa, ou seja, é muda.  Isso introduz uma variável interessante, ao contar a história, porque facilita que ela esconda seu segredo dos patrões.  Não é da sua deficiência que o filme se ocupa, ela é a heroína da situação, sua coragem e determinação são os elementos que a destacam.  Partindo de uma condição bem modesta, a de funcionária de limpeza do laboratório.  Um pouco de Cinderela vai bem, também.


A FORMA DA ÁGUA

 Se, em “O Monstro da Lagoa Negra”, a aventura toma o primeiro plano, em “A Forma da Água” é o conto de fadas que emerge do substrato líquido da trama. O cineasta Guillermo del Toro busca o estranho, o bizarro, para criar seu mundo e o relaciona com a realidade do que pode ser visto nos telejornais diários, as notícias do mundo.  Foi assim, também, em seu “O Labirinto do Fauno”, de 2006, em que a fantasia interagia com a ditadura franquista espanhola.  O resultado é híbrido, como o monstro humano aquático dos dois filmes, o de 1954 e o de 2017, mas tem seu encanto, assim como eles.

Em “O Monstro da Lagoa Negra”, o vínculo com a realidade se dá mais claramente pela ciência e pelo uso estratégico que pode gerar, com menos vínculo político com a realidade imediata.

“A Forma da Água” é aposta quase certa para vários Oscar.  O filme atrai, agrada, mesmo a quem não faz conjecturas ou associações e curte simplesmente a história de amor e o suspense da narrativa.  Ou se encanta com a linda trilha sonora de Alexandre Desplat, já premiada, assim como o diretor del Toro, com o Globo de Ouro 2018.  Uma gravação de Babalu, de Margarita Lecuona, com Caterina Valente e Silvio Francesco, aparece na trilha e nos faz lembrar da gravação magistral de Ângela Maria, que acompanhou toda sua vida artística.  Tem Carmen Miranda aparecendo na TV cantando Chica Chica Boom Chic


O MONSTRO DA LAGOA NEGRA

 O Brasil estava presente também no antigo monstro, a ação toda supostamente se passava na distante Amazônia brasileira, uma preservada zona do globo, que teria mantido elementos ancestrais da evolução terrena.  Talvez tivesse sentido em 1954, hoje, certamente, não mais, com o desmatamento a todo vapor.

Bem, mas por que estou falando de “O Monstro da Lagoa Negra”, um clássico do distante 1954, junto com “A Forma da Água”, de 2017?  Não só pela influência de um sobre o outro, mas porque é possível vê-los, a ambos, no cinema, agora mesmo, sendo “O Monstro da Lagoa Negra” exibido em cópia restaurada em 3D.  O filme foi realizado originalmente em 3D, quando a moda apareceu, e depois sumiu.  Está em exibição no cinema do Instituto Moreira Salles, que também exibe, assim como outras salas de espetáculo, “A Forma da Água”.  Um programa duplo que vale a pena. 

  


sábado, 18 de março de 2017

A BELA E A FERA


Antonio Carlos Egypto


A BELA E A FERA (La Belle et La Bête).  França, 1946.  Direção: Jean Cocteau.  Com Jean Marais, Josette Day, Marcel André, Mila Parely, Nane Germon.  93 min.

A BELA E A FERA (Beauty and the Beast).  Estados Unidos, 2015.  Direção: Bill Condon.  Com Emma Watson, Dan Stevens, Luke Evans, Kevin Kline, Ewan McGregor, Ian McKellen, Emma Thompson.  92 min.



“A Bela e a Fera” é um tradicional conto de fadas francês, originalmente escrito por Gabrielle-Suzanne Barbot, em 1740.  Mas a versão mais conhecida da história é mais compacta e simplificada em número de personagens e situações.  Foi escrita por Jeanne-Marie Leprince de Beaumont, publicada em 1756.  A versão de Beaumont é a que serviu de base ao filme de Jean Cocteau (1889-1963), realizado em 1946, que se tornou um grande clássico do cinema fantástico. 




Cocteau foi um renovador da estética cinematográfica.  Seu filme contém imagens oníricas, surrealistas, e efeitos especiais.  Tem uma fotografia, em preto e branco, belíssima, que trabalha muito bem com a bruma, a neblina, a fumaça.  A direção de arte construiu um universo de mistério e riqueza, que explora o contraste entre feiúra e beleza interior.  A magia do conto está lá, numa dimensão dramática.  O cineasta nos convida a que deixemos fluir um pouco de nossa inocência infantil para acompanhar essa narrativa fantastica e acreditar na história.  Ou seja, ele se dirige ao público adulto, não às crianças.




Bem diferente da versão da Disney, em desenho animado, de 1991, dirigida ao público infantil, que transformou o conto trágico-romântico num bem-humorado musical.  A versão 2015 de “A Bela e a Fera”, também da Disney, que está agora nos cinemas, dirigida por Bill Condon, é uma live-action baseada naquela animação, muito popular e grande sucesso de público.  É o chamado filme-família.  As crianças provavelmente vão adorar.  Mas os adultos vão se divertir também.  É uma produção grandiosa, musical, com elenco forte e objetos que ganham vida e se destacam na narrativa, como o candelabro, o relógio, o bule, a xícara.  E o monstro é charmoso, quase tanto quanto a Bela. Leveza e humor tomam o lugar do drama, o romantismo vence o trágico, galhardamente.  Mas não sem antes uma boa luta, recheada de efeitos especiais.  Tem pouco a ver com o clássico de Jean Cocteau, embora a história seja basicamente a mesma.  Mas quanta diferença!

O Centro Cultural Banco do Brasil – SP está promovendo neste mês de março a Mostra “Jean Cocteau: O Testamento de um Poeta” e incluiu “A Bela e a Fera”, de 1946, entre as películas exibidas.  Esse filme também pode ser encontrado em DVD e em sites da Internet.


“A Bela e a Fera”, de Bill Condon, tem uma carreira promissora.  Está levando grande público às salas de exibição.  Não é novidade.  Afinal, marketing é o que não falta e o número de salas, como sempre acontece com os blockbusters, é arrasador.



sexta-feira, 9 de dezembro de 2016

BLOW-UP

  
Antonio Carlos Egypto





BLOW-UP (Blow-Up).  Inglaterra/Itália, 1966.  Direção e roteiro: Michelangelo Antonioni.  Com David Hemmings, Sarah Miles, Vanessa Redgrave, Veruska.  111 min.



Para quem gosta de cinema, não há nada melhor do que rever grandes filmes, experiências marcantes, históricas, na telona.  E isso vem acontecendo.  Periodicamente, têm sido relançados no cinema alguns dos mais marcantes e significativos filmes de sua história.  Inúmeras vezes já deixei o DVD em casa e fui ao cinema, para ver um filme que eu teria à mão a qualquer hora.  E não me arrependi.




Minha sugestão hoje é ir ver “Blow-Up”, do mestre italiano Michelangelo Antonioni (1912-2007), filme em inglês, já que trata da Swinging London dos anos 1960.  O personagem central é Thomas (David Hemmings), fotógrafo de moda naquele fervilhante período britânico, que se envolve acidentalmente com o que pode ser um assassinato, revelado pelas lentes de sua câmera.  Lá estará a verdade.  Ou não?  A cada ampliação da revelação das fotos, uma nova imagem e uma nova dúvida.  Onde está a verdade?  Mesmo a verdade revelada pela câmera, será que ela existe?  É alcançável pelos recursos tecnológicos, no caso, aqui, da fotografia? 

Será preciso ver para crer?  Ou melhor será crer para ver?  Nesse sentido, o final do filme é genial, uma das melhores sequências cinematográficas já feitas.  Se alguém ainda não viu, ou não se lembra, vale a pena conferir.




“Blow-Up” é um filme absolutamente brilhante que, a par de mexer com a insegurança, o medo, a paranoia, a desorientação humanas, revela, como poucos o fizeram, todo o clima efervescente dos anos 1960, com sua transgressão, seu psicodelismo, seu amor livre, suas festas e drogas.  Que nos legou, por exemplo, a música dos Beatles, a revolução sexual, a emancipação feminina, a visibilidade dos gays, as intensas manifestações de rua, o espírito crítico, a luta por mudanças.  Tudo isso tem muito a ver com o sentido inovador e profundamente questionador da arte de Antonioni.

A ele foi atribuído um especial interesse em revelar e desvendar a incomunicabilidade humana em seu filmes, mas ele vai muito além disso.  Antonioni inova na narrativa, no jeito de contar uma história, quando é o caso, ou de vivenciar uma situação, um personagem, um grupo de personagens, uma coletividade que se expressa, um sistema econômico e social que aprisiona ou oprime.  E tem um estilo maravilhoso de narrar tempos mortos, momentos em que nada acontece ou acontece na mente, nos movimentos e sentimentos dos personagens.




Em “Blow-Up”, aqui lançado com o estúpido subtítulo de “Depois daquele beijo”, Antonioni baseia seu roteiro, feito em parceria com Tonino Guerra e Edward Bond, em um conto do escritor argentino Julio Cortázar.  Revê-lo restaurado, e na tela grande, é um luxo que todos merecem, 50 anos passados de seu lançamento original, quando foi o grande vencedor do Festival de Cannes de 1967.

 -------------------------------------------------

Se “Blow-Up” é um velho notável filme que volta ao cartaz, “Belos Sonhos”, de Marco Bellocchio, é um produto novo em folha, muito talentoso, que está sendo lançado agora.  Veja a crítica postada no cinema com recheio, por ocasião da 40ª. Mostra.


  

quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

8 1/2 de FELLINI

  
Antonio Carlos Egypto




 8 ½  (Fellini Otto & Mezzo).  Itália, 1963. Direção: Federico Fellini.  Fotografia: Gianni Di Venanzo.  Música: Nino Rota.  Com Marcello Mastroianni, Claudia Cardinale, Anouk Aimée, Sandra Milo.  145 min.


“8 ½ “ de Fellini foi o primeiro filme de grande envergadura artística a que assisti no cinema, quando de seu lançamento, em 1963 ou 1964. Eu era, então, um adolescente e posso dizer que foi chocante. Tinha entendido muito pouco do filme, mas percebi que se tratava de algo brilhante, muito especial, e que, se eu não tinha tido acesso a ele, o problema era meu e não do filme.



Fui revê-lo na mesma época, buscando que ele fizesse sentido para mim.  Mas não era uma tarefa fácil.  Afinal, “8 ½ “ é um conjunto de cenas, magistralmente concebidas, que valem por elas mesmas.  Reunidas naquele conjunto, elas adquirem um significado muito maior, são lembranças, recordações de vida, desejo e imaginação, no contexto da crise criativa de um artista, que tem de continuar produzindo.  É um filme sobre a gestação do cinema de autor, com todas as suas implicações.  O diretor detém as ideias e o conceito do espetáculo, define cenários, suntuosos até, locações, figurinos, os papéis de cada um e sua ambientação.  Tem de lidar com os produtores e seus investimentos, os roteiristas e sua afetação intelectual, a imprensa e os críticos.  Um verdadeiro peso que ali se transforma em pesadelo.




Parecia muito complicado entender tudo isso, na época.  Pelo menos para mim.  Por isso, voltei ao filme outras vezes e então ele foi fazendo todo o sentido.  Aquelas imagens deslumbrantes e originais já conseguiam falar uma língua que eu era capaz de entender. Marcello Mastroianni, o diretor no filme, alter ego de Fellini, tem um desempenho extraordinário.  Desde então, sempre o considerei o ator número 1 do cinema, até sua morte.  E não mudei de opinião até hoje.  A presença diáfana e inebriante de Claudia Cardinale, no auge de sua beleza, sempre me acompanhou.  Poderia existir uma mulher mais bela, melhor fotografada, em alguma outra película?




A fotografia de “8 ½ “ é primorosa, insuperável.  Como acontecia com grande parte do cinema italiano da época ou na obra de Ingmar Bergman, com o trabalho do fotógrafo Sven Nykvist.  Havia coisas tão boas quanto, não melhores.

A música do genial Nino Rota elevou a filmografia toda de Fellini a um nível artístico que beira a perfeição.  É um compositor excepcional, sua parceria com Fellini é um dos legados artísticos mais importantes do século XX.




“8 ½ “ venceria o Oscar de melhor filme estrangeiro do ano e o de figurino.  Também, pudera, era o melhor filme já feito, não só daquele ano e não só em uma língua que não fosse inglês.

Volto sempre a rever “8 ½ “, numa cópia em DVD, restaurada e remasterizada, lançada pela Versátil, que faz jus ao filme.  É incrível, mas cada vez que o revejo fico mais maravilhado.  São imagens em preto e branco, que jogam notavelmente com a luz e a sombra, as tonalidades de branco são acentuadas pelos figurinos exuberantes, os gestos e sentimentos são expressados pelos tons de claro e escuro e pelos cenários de sonho e fantasia, tudo me encanta. Pois não é que agora o filme está de volta aos cinemas? Fantástico!  Olha, quem nunca viu não pode deixar passar essa oportunidade.




Há coisas para as quais a experiência vivida nos dificulta o exercício da crítica.  É o caso desse filme, a minha maior referência, paradigma daquilo que o cinema pode ser capaz de produzir.  Não consigo ver as falhas que esse filme possa ter.  Dizem que a paixão cega.  Talvez seja isso.  Mas se alguém me perguntasse qual o melhor filme que eu já vi na vida, eu não titubearia: foi o “8 ½ “ de Fellini, projetado numa tela de cinema.




terça-feira, 22 de setembro de 2015

A HORA E A VEZ DE AUGUSTO MATRAGA


Antonio Carlos Egypto


João Miguel como Matraga


A HORA E A VEZ DE AUGUSTO MATRAGA.  Brasil, 1965.  Direção: Roberto Santos.  Com Leonardo Villar, Jofre Soares, Maurício do Valle, Maria Ribeiro, Flávio Migliaccio.  109 min.

A HORA E A VEZ DE AUGUSTO MATRAGA.  Brasil, 2011. Direção: Vinícius Coimbra.  Com João Miguel, José Wilker, Vanessa Gerbelli, Irandhir Santos, Chico Anysio, José Dumont.  106 min. 


O terreiro lá de casa
Não se varre com vassoura
Varre com ponta de sabre
E bala de metralhadora.

“A Hora e a Vez de Augusto Matraga”, baseado na obra de Guimarães Rosa, realizado em 1965 com a direção de Roberto Santos, é um dos maiores clássicos do cinema brasileiro.  Foi um dos filmes mais fortes e impactantes da minha juventude.  As interpretações de Leonardo Villar, Jofre Soares, Maurício do Valle, Maria Ribeiro e Flávio Migliaccio, inesquecíveis.  A música que Geraldo Vandré fez para o filme é espetacular, nunca poderia me esquecer dela porque a tenho em disco de vinil até hoje e ouço de quando em quando.


Leonardo Villar como Matraga


Só revi o filme há poucos meses, numa sessão da Cinemateca Brasileira, dentro da retrospectiva dedicada ao cineasta Roberto Santos, que o exibiu no telão em cópia restaurada.  O impacto foi o mesmo.  O filme é belíssimo.

Vencedor do Festival de Brasília de 1966, sua circulação obviamente sofreu muito com a ditadura militar/civil do período e muita gente não chegou a conhecê-lo.  Não houve lançamento em DVD.  Quem entrar no Google vai encontrar facilmente a cópia integral dele, mas não vale a pena ver.  A imagem é ruim e compromete essa obra-prima do cinema nacional.  Fiquem de olho em alguma outra exibição no cinema da cópia restaurada, que aí a história é outra.




Agora chega aos cinemas uma nova versão de “A Hora e a Vez de Augusto Matraga”, sob a direção de Vinícius Coimbra.  O filme foi realizado em 2011, mas só em 2015 está sendo lançado em circuito regular. Ele foi premiado no Festival do Rio, em 2011, como melhor filme, pelo Júri Oficial e pelo Júri Popular.  Mesmo assim, questões de direitos e burocráticas o mantiveram fora de cartaz até hoje.

Nessa nova versão da obra de Guimarães Rosa, coube a João Miguel, grande ator, o papel de Augusto Matraga, que originalmente foi vivido pelo grande Leonardo Villar. Ele se sai muito bem na difícil empreitada de viver um personagem que se transforma de modo radical e tem agressividade e mansidão em proporções alternadas, crueldade e beatitude em escalas similares.




A nova versão traz também José Wilker, como Joãozinho Bem-Bem, e tem a participação especial de Chico Anysio, como o Major Consilva.  Dois grandes nomes que já se foram, figuras queridas e talentosas, que ver em cena é sempre muito bom. Vanessa Gerbelli e Irandhir Santos também compõem o ótimo elenco do filme, que ainda conta com participações especiais de José Dumont e Gorete Milagres.  Enfim, de grandes atores e atrizes o filme está cheio.

Para que possamos admitir a ausência da música de Geraldo Vandré, que dialogava tão diretamente com o texto e a história, na versão original, o novo Matraga põe a música sublime de Tom Jobim com grande orquestra, inundando a tela de um som magnífico.  Deu para compensar.




A versão atual de Matraga destaca e valoriza bem a prosa original de Guimarães Rosa e dá à saga do personagem uma dimensão de aventura ao estilo faroeste, capaz de envolver o público.  É um bom trabalho, que merece ser visto.

Quanto à inevitável comparação que farão todos os que conhecem o filme original, é preciso considerar que os tempos são outros, as intenções mudam, a própria tecnologia de filmar muda.  O Matraga original é um exemplar bem acabado do cinema novo brasileiro da época, que renovou a linguagem cinematográfica nessas plagas.  Para mim, incomparável.




O que não significa que não se possa revisitar essa obra tão importante da literatura, como é este conto de “Sagarana” e buscar uma nova forma de apresentá-la.  Seria preciso realizar esse trabalho com a competência e a dignidade que ele merece.  Isso, o filme de Vinícius Coimbra alcançou.