quinta-feira, 27 de setembro de 2018

A FÁBRICA DE NADA


Antonio Carlos Egypto




A FÁBRICA DE NADA.  Portugal, 2017. Direção: Pedro Pinho.  Com José Vargas, Carla Galvão, Dinis Gomes, Américo Silva.  177 min.


Condição necessária para a existência da produção e, consequentemente, do lucro, no sistema capitalista, é a mão de obra geral e especializada, que vem dos trabalhadores.  Em tempos de tecnologia avançada, robótica e que tais, o próprio trabalhador começa a ser dispensável.  Máquinas podem ser eliminadas ou substituídas por equipamentos mais recentes, que chegam a tornar obsoletos a própria estrutura física das fábricas e seu maquinário tradicional.  Ou esse maquinário pode ser deslocado para onde a tecnologia não se sofisticou e que mantém custos de mão de obra tão baixos que se aproximam da escravidão.

Esse é o pano de fundo da história do filme português “A Fábrica de Nada”, dirigido por Pedro Pinho, a partir de ideia original de Jorge Silva Melo, com base na peça The Nothing Factory, da escritora holandesa Judith Herzberg. 

A referência literária não impede que o realizador trabalhe o material fílmico de forma documental, inclusive dedicando o filme aos trabalhadores da Fateleva, que, entre 1975 e 2016, levaram a cabo uma experiência de autogestão na fábrica de elevadores Otis portuguesa.  Experiência que, certamente, inspirou “A Fábrica de Nada”, tanto quanto a peça original holandesa.  Trata-se, de qualquer modo, de uma ficção.




Quando equipamentos da fábrica vão desaparecendo, ou são roubados, à noite, esvaziando as condições de trabalho e produção, seus operários decidem fazer vigílias para impedir que isso continue a acontecer.  A fábrica, porém, para de produzir.  Eles não têm o que fazer e agora são os seus empregos que estão em jogo.  Há um plano evidente de desativar a fábrica e dispensar os trabalhadores.  Eles partem para a greve, recurso histórico e legítimo dos operários.  Mas greve numa fábrica que já parou?

A ideia do roteiro é ótima, muito bem desenvolvida e com um elenco convincente, que nos põe no mundo dessa fábrica estranha que, no entanto, é tão representativa dos dias econômicos atuais.  E, de quebra, reflexões teóricas sobre a presente etapa do capitalismo, que se caracteriza pelo desemprego, vão sendo lançadas ao longo do filme, ilustrando as encenações, ou melhor, dando a elas um caráter mais geral, extrapolando o caso concreto que está sendo mostrado.

Apesar das quase três horas de projeção, o filme flui bem, cria uma situação de expectativa e de suspense que mantém o espectador interessado no que vai ocorrer em seguida.



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