sábado, 15 de fevereiro de 2025

PRÊMIO ABRACCINE - MELHORES FILMES 2024

 

Antonio Carlos Egypto

 

 

Associadas e associados da Abraccine, Associação Brasileira de Críticos de Cinema, elegeram seus filmes favoritos do ano nas categorias Melhor Longa Brasileiro, Melhor Curta ou Média Brasileiro e Melhor Longa Estrangeiro. Os vencedores foram definidos em votação realizada entre mais de 180 críticas e críticos de todas as regiões do país.

AINDA ESTOU AQUI, de Walter Salles, venceu na categoria Melhor Longa Brasileiro. Em um empate, os curtas EU FUI ASSISTENTE DO EDUARDO COUTINHO, de Allan Ribeiro, e QUANDO AQUI, de André Novais Oliveira, foram premiados na categoria Melhor Curta ou Média Brasileiro. E a produção francesa ANATOMIA DE UMA QUEDA, de Justine Triet, venceu como Melhor Longa Estrangeiro.

 

A Abraccine também divulgou a lista dos 10 mais votados de cada categoria: os TOP 10.

 

 


TOP 10 -- Longa-metragem brasileiro (em ordem alfabética):

 

“Ainda Estou Aqui”, de Walter Salles
“Cidade; Campo”, de Juliana Rojas
“O Dia que te Conheci”, de André Novais Oliveira
“Estranho Caminho”, de Guto Parente
“A Filha do Palhaço”, de Pedro Diógenes
“Greice”, de Leonardo Mouramateus
“Malu”, de Pedro Freire
“Motel Destino”, de Karim Aïnouz
“Saudade Fez Morada Aqui Dentro”, de Haroldo Borges
“Sem Coração”, de Nara Normande e Tião

 

TOP 10 -- Curta ou média-metragem brasileiro (em ordem alfabética):

 

“Cavaram uma Cova no meu Coração”, de Ulisses Arthur
“Dona Beatriz Ňzîmba Vita”, de Catapreta
“Eu Fui Assistente do Eduardo Coutinho”, de Allan Ribeiro
“Fenda”, de Lis Paim
“Kabuki”, de Tiago Minamisawa
“A Menina e o Pote”, de Valentina Homem
“Quando Aqui”, de André Novais Oliveira
“Samuel Foi Trabalhar”, de Janderson Felipe e Lucas Litrento
“A Sua Imagem na Minha Caixa de Correio”, de Silvino Mendonça

 “Vollúpya”, de Éri Sarmet e Jocimar Dias Jr.

 



TOP 10 -- Longa-metragem estrangeiro (em ordem alfabética):

 

“Anatomia de uma Queda”, de Justine Triet
“Dias Perfeitos”, de Wim Wenders
“Jurado Nº 2”, de Clint Eastwood
“Pobres Criaturas”, de Yorgos Lanthimos
“O Quarto ao Lado”, de Pedro Almodóvar
“Rivais”, de Luca Guadagnino
“A Substância”, de Coralie Fargeat
“Tudo que Imaginamos como Luz”, de Payal Kapadia
“Vidas Passadas”, de Celine Song
“Zona de Interesse”, de Jonathan Glazer

 

 



 


quarta-feira, 12 de fevereiro de 2025

ANORA e CALLAS

Antonio Carlos Egypto

 

 


ANORA, produção estadunidense, dirigida por Sean Baker, chegou à 48.a Mostra Internacional de Cinema de São Paulo com a chancela da Palma de Ouro no Festival de Cannes.  Mas a gente se surpreende com essa escolha.

 

A história envolve uma prostituta do Brooklin que vê a chance de mudar de vida ao se casar em Las Vegas com o filho de um oligarca russo, totalmente sem noção, que queima dinheiro nos Estados Unidos em sua temporada por lá, e se comporta como um tresloucado, obcecado pelos prazeres do sexo, recém descobertos.  Claro que seu “casamento” será posto à prova pela família do “noivo”.  E a profissional do sexo, naturalmente, lutará para mantê-lo.

 

  O filme é uma comédia amalucada, em que os excessos estão visíveis: quebradeiras, gritarias, xingamentos, vômitos, destruições.  Há que se reconhecer que a comédia funciona, produz risadas, tem sacadas interessantes aqui e ali, mas, no conjunto, beira o nada.  O que terá acontecido com o Festival de Cannes?  Não tinha nada melhor para premiar?

  

Acrescento agora minha surpresa ao ver que o filme também está bem cotado para melhor filme no Oscar 2025. Não o revi , nem teria interesse, mas começo a me questionar o que foi que eu não vi, ou não notei como mérito  em  “Anora”.

 

Bem, além de reconhecer que como comédia ele funciona, a atriz principal Mikey Madison é mesmo muito boa. Seu desempenho é forte e marcante. Mas o filme é um entretenimento que peca pelo excesso e não tem nada de importante a dizer. E, com certeza , há sim, filmes melhores do que esse na lista dos 10 indicados ao Oscar na categoria principal. A começar, é claro, pelo brasileiro “Ainda Estou Aqui”. Torcidas, à parte. 138 min.



 


 

MARIA CALLAS (Maria), produção internacional que envolve Itália, Alemanha e Estados Unidos, dirigido pelo conceituado diretor chileno Pablo Larraín, é um espetáculo cinematográfico/musical de peso.  Dá o devido e merecido destaque ao canto daquela que foi a maior na ópera em todo o mundo: Maria Callas (1923-1977).  O foco do filme, porém, é o período de decadência, de perda progressiva da voz de Callas, associado a seus problemas de saúde, em grande parte decorrentes do uso abusivo de remédios e, claro, dos excessos da profissão.  O brilhantismo vem dos flash-backs e das gravações.  Angelina Jolie vive muito convincentemente a diva do canto lírico, ao lado de outros colegas do elenco, como Pierfrancesco Favino e Alba Rohrwacher.  Foi o filme de abertura da Mostra 48. Concorre apenas ao Oscar 2025 de melhor fotografia.  123 min.

 

 

 

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2025

EMILIA PÉREZ

          

 Antonio Carlos Egypto

 



EMILIA PÉREZ.  França, 2024.  Direção: Jacques Audiard.  Elenco: Karla Sofia Gascón, Selena Gomez, Zoe Saldaña, Adriana Paz.  130 min.

 

“Emilia Pérez” é um filme ousado, que causa impacto, que tem uma forma moderna de expressão e que mescla e funde diferentes gêneros cinematográficos, com esmero visual.  Alguns o classificam como comédia musical de suspense e ação.  Tem humor, mas não é uma comédia, a meu ver.  E um thriller  que envolve crime e violência, drama e crítica social, onde cabe um inusitado musical.  Um filme em que todo cambia todo el tempo.  Mudança é o mote da empreitada francesa, dirigida por Jacques Audiard, cuja trama se passa no México, com o filme falado em espanhol.

 

“Emilia Pérez” me parece ser um representante da ideia de modernidade líquida, do sociólogo polonês Zygmunt Bauman, na sociedade da pós-verdade, em que tudo se dissolve, se liquefaz: o trabalho, a família, o amor e a própria identidade.  E com a marca do medo de não pertencer, de não se encaixar num mundo de violência e terrorismo, que produz angústia e muda velozmente.  Todo cambia.

 

Os personagens mudam, de corpo, de gênero, de identidade, de comportamentos, de valores, de papéis familiares.  Nada permanece sólido.  Consequentemente, as instituições ruem também.  Desafiador, assustador, caótico? Não sei, cada um faça a sua aposta.  Perdemos o controle, isso já faz tempo e tudo, absolutamente tudo, está agora em questionamento.  Um filme que nos traz esse retrato do nosso tempo tem valor, ainda que também tenha problemas.


Uma produção francesa que aborda a guerra do narcotráfico no México, sem ser filmada lá e praticamente sem mexicanos na produção e elenco, está naturalmente sujeita aos tradicionais estereótipos que, nós latinos, conhecemos bem.

 


Por outro lado, valer-se de uma atriz trans como Karla Sofia Gascón para o papel central de Emilia dá força e credibilidade à incrível história que ela vive. Tudo nela se liquefaz, inclusive o modo de viver e de encarar o mundo, não só o gênero ou a identidade.  Com a personagem de Rita, da ótima Zoe Saldaña, passa-se o mesmo, sua capacidade e talento profissional mudam de vetor, de campo, se liquefazem.  A família de Emilia, ex-mulher e filhos, desfaz-se, embaralhando os papéis familiares.  Vira uma família líquida.  E por aí vai.

 

Enfim, é um filme que dá o que falar.  Tem um maravilhoso quarteto feminino: Gascón, Saldaña, Selena Gomez e Adriana Paz, e uma equipe de produção para lá de competente.  Do trabalho do diretor aos criadores das músicas, coreografias e danças bem atraentes, “Emilia Pérez” é  um produto cinematográfico respeitável.

 

Agora, algumas considerações extra-filme.  Ele concorre ao Oscar nas mesmas categorias em que o brasileiro “Ainda Estou Aqui” foi indicado: melhor filme, melhor filme internacional e atriz.  Só que tem ainda mais 10 indicações, alcançando 13 no total. Um evidente exagero.  Sinal de que é o grande favorito do Oscar do ano?  Ou corre o risco de flopar legal? Aí vai muito da campanha, do trabalho de divulgação.  Da briga midiática e das redes sociais que já, ao que parece, causaram danos a Karla Gascón por surpreendentes manifestações preconceituosas, em passado recente.  Logo ela, que representa pela primeira vez uma transexual com chances?

 

As disputas paralelas das redes sociais nada acrescentam ou significam às qualidades ou problemas dos filmes, mesmo que interfiram nas decisões finais dos votantes da Academia.  Não farão de “Emilia Pérez” uma obra-prima, o que ela não é, mas também não transformarão um filme relevante e significativo em algo a ser rechaçado ou ignorado.  Aliás, é muito difícil ignorar um filme como esse.