quinta-feira, 25 de abril de 2024

PLANO 75

 

   Antonio Carlos Egypto

 

 


PLANO 75 (Plan 75), de Chie Hayakawa, indicado pelo Japão ao Oscar de filme internacional, trata de um programa governamental de eutanásia voluntária, dirigida a cidadãos idosos, a partir de 75 anos.  Uma coisa complicada porque, se se pode admirar o programa suíço de morte assistida como algo generoso e humanitário, o mesmo não se dá aqui.  Na Suíça, o programa é particular, tem alto custo e, em princípio, se dirige a cidadãos e cidadãs que optem por abreviar a existência, em função de sofrimentos físicos ou psíquicos ou por desalento com a vida.  É algo cercado de muitos cuidados. 

 

No caso do suposto programa japonês abordado no filme, há a ideia de que os idosos, ou boa parte deles, são um peso para a sociedade, para os mais jovens.  E, apelando para o espírito de sacrifício japonês (kamikazes, haraquiri, por exemplo), de o Estado incentivar as pessoas a voluntariamente aderirem à eutanásia, com algumas vantagens e sem custos.  Embora haja também pacotes luxuosos em resorts para as últimas noites da vida, para os abonados.  Quando se estabelece um programa oficial, e se divulga amplamente isso, pressupõem-se ações em larga escala, para atender a todos os possíveis interessados, e um esquema em que tudo precisa funcionar perfeitamente.  O que é um desafio complicado. 

 

Vamos fazer um paralelo entre o planejamento familiar e o controle de natalidade.  Uma coisa é orientar e oferecer recursos para aqueles que desejarem limitar o número de filhos aos que efetivamente quiserem e puderem criar.  Outra, é realizar um programa oficial para a redução do número de filhos por família, a partir do Estado, com leis, punições ou incentivos, ainda que tudo permaneça “voluntário”.  A motivação que vem das pessoas ou das famílias é muito distinta da motivação do Estado, dos governantes e dos planos econômicos.  Nesse último caso, é inevitável uma coerção, até pelo poder da propaganda oficial, com seus meios e recursos financeiros, quando há um interesse coletivo (ou governamental, pelo menos) na história.  Um programa de massa, que atinja muita gente, tem maior probabilidade de falhar.  E trata-se de um assunto com a seriedade da morte, da própria morte do indivíduo que adere ao plano.

 

O filme PLANO 75 mostra essas coisas, a partir de uma narrativa que se concentra, principalmente, em dois casos, em que o desalento em viver está acompanhado de dificuldades ou problemas pessoais, mas que também refletem o abandono a que a sociedade e o Estado relegam os idosos.  Basta lembrar das dificuldades de uma pessoa idosa de encontrar moradia para alugar, diante de um despejo inevitável, quando se exigem, ironicamente, dois anos de antecipação do aluguel para alguém que já beira os 80 anos e que não dispõe de recursos para tal.  Nesse caso, é o lugar que a pessoa ocupa na sociedade que está marcado.  Marcado para morrer, se pode dizer.  A opção do indivíduo está, portanto, bastante limitada.

 

Quando a narrativa se ocupa das falhas que podem ocorrer, a situação é de chorar, alarmante.  Não que o filme seja de emocionar, na sua concepção.  Mas é algo tão grave, que não dá para brincar.  Como, de algum modo, o filme faz, tentando desanuviar as coisas.  É um produto bem feito, tem seus defeitos, mas é um bom trabalho sobre um tema cada vez mais sério num mundo cada vez mais povoado por pessoas idosas.  No caso, o Japão é campeão nisso.  De todo modo, essa eutanásia oficial não pode ser a solução, como o filme mostra.

 

Elenco: Chieko Baishô, Hayato Isomura, Yusumi Kawai, Taka Takao.  105 min.

 

 

 

 

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