Antonio Carlos
Egypto
A LIVRARIA (The Bookshop). Espanha,
2017. Direção: Isabel Coixet. Com Emily Mortimer, Patricia Clarkson, Bill
Nighy, James Lance, Honor Kneafsey. 113
min.
“A Livraria” é um filme espanhol, dirigido
pela cineasta catalã Isabel Coixet. Mas
a verdade é que não poderia ser mais inglês.
A trama é uma adaptação do romance homônimo, de Penelope Fitzgerald, e
se passa na pequena cidade litorânea inglesa de Hardborough, em 1959. O filme nos transporta ao pequeno mundo
daquela localidade, com seus hábitos, costumes, valores provincianos,
vestimentas e modo de falar e se comportar com precisão, direção de arte
impecável, ótima reconstituição de época.
É um charme só. Pelo menos, na
aparência.
Na realidade, a tal localidade é marcada por
um conformismo, uma acomodação e um conservadorismo nada charmosos. Vigoram por aqui a ignorância, a inveja e a
falsa moral. Que é o que a personagem
Florence Green (Emily Mortimer) vai sentir na pele, quando resolve encarar o
seu grande sonho de montar uma livraria numa casa muito antiga da família, que
lhe restou como herança.
Com espírito empreendedor, misturado a uma
tenacidade e a uma alma sonhadora, Florence, contra tudo e contra todas as
previsões, terá sucesso nessa empreitada maluca. Aí terá de lidar com a hostilidade da
mediocridade, a inveja dos acomodados e a sordidez humana que se escondem
debaixo das aparências charmosas. Por
fora, bela viola, por dentro, pão bolorento, já diz o ditado. O pior é que tudo se dá com base em
argumentos ridículos e mesquinhos, mas em nome da arte. E das verdades inventadas pela fofoca e pela
maldade que ela distila.
A diretora Isabel Coixet conta que se
identificou muito com a personagem Florence do romance, com seu espírito livre,
capaz de transformações. De fato, ela
levanta a poeira daquela comunidade sonolenta, que se transfigura em
hostilidade. Mas também encontra quem já amava a boa
literatura, escondido no seu canto, o sr. Brundisk (Bill Nighy), a menina que a
ajudará com dedicação e os que descobrem a maravilha da leitura, com trabalhos
provocantes, como o de Nabokov, em Lolita,
ou Ray Bradbury, em Farenheit 451. E ela segue em frente, seguirá sempre, em
busca de seus sonhos, suas utopias, que podem se resumir a ideias ingênuas e
bem intencionadas. Mas que incomodam da
mesma maneira os de alma pequena, onde nada vale a pena, invertendo Fernando
Pessoa.
A narrativa de “A Livraria” não resiste ao
realismo, é fabular. Florence é uma
espécie de fada que encontra sua alma gêmea e combate a bruxa: a sra. Gamart
(Patricia Clarkson), que personifica a mediocridade maldosa da comunidade. O bem pode estar nos livros e o mal, na
inveja e na burocracia, por exemplo. É
um bom modo de apontar para a hipocrisia do mundo. Potencializada pelos pequenos e encantadores
povoados ingleses, que se materializam no trabalho cinematográfico de uma
cineasta talentosa de Barcelona, que mereceu o prêmio Goya de melhor filme, o
Oscar espanhol, com “A Livraria”.
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