quarta-feira, 21 de setembro de 2016

O SILÊNCIO DO CÉU


Antonio Carlos Egypto




O SILÊNCIO DO CÉU (Era el Cielo).  Brasil, Uruguai, 2015.  Direção: Marco Dutra.  Com Leonardo Sbaraglia, Carolina Dieckmann, Chino Darín, Álvaro Armandi Ugón, Mirella Pascual.  102 min.



A vida de um casal pode resistir a algumas omissões e segredos, talvez, sem maiores sobressaltos.  Mas quando algo muito importante aconteceu, foi vivido com muita dor e de forma traumática e, ainda assim, nada se diz sobre isso, como fica a situação?  Pior: e quando o outro viu o que aconteceu, sabe do que se trata e também não aborda o assunto, porque tem algo muito importante a esconder?

Os silêncios substituem a comunicação e o diálogo, criando um insuportável tabu na vida dos dois.  É curioso como os passos de um se guiam pelos passos do outro, justamente em relação ao assunto-tabu.  Certos tipos de cuidados, apoios e solidariedade, se darão nessa zona escura que, de um modo ou de outro, é conhecida por eles.




O filme “O Silêncio do Céu” aborda com muita competência essa trama, em que o psiquismo dos personagens fala mais alto.  Muito mais importante é o não-dito, em relação a tudo que é dito.  O clima onde isso se dá, em torno da casa, do ateliê de trabalho, de um grande viveiro de venda de plantas e em torno do movimento dos automóveis, coloca o espectador dentro do mistério.  Que para ele não é exatamente um mistério: é uma grande questão entender as motivações dos comportamentos naquela situação dada.  E o que se abre a partir desse universo de omissões como consequência.  A tragédia é que omissão puxa omissão e as coisas podem se agravar muito.

Para alcançar um resultado muito expressivo nas interpretações, o diretor Marco Dutra contou com Carolina Dieckmann, no papel de Diana, que desde a primeira cena vive um drama pesado e devastador, que ela terá de carregar ao longo de todo o filme.  E fazer isso representando em espanhol.  Ela é brasileira, mas a produção é toda filmada no Uruguai, falada em espanhol. O outro elemento do casal é Mário, papel do ator argentino Leonardo Sbaraglia, que tem de se mostrar contido, cheio de medos, covarde, sofrendo por dentro e em vias de explodir.  Papel exigente, de que ele dá conta muito bem.  O ator já é conhecido no Brasil por filmes como “Relatos Selvagens” (2014), “O Que os Homens Falam” (2012) e “Plata Quemada” (2000).




Todos os demais atores e atrizes compõem  com segurança esse mundo tenso, angustiante, opressor e potencialmente violento, em termos psíquicos.  Entre eles, a presença do jovem Chino Darín, filho de Ricardo Darín, que tem pela frente o desafio de se mostrar à altura do talento do pai.  Está bem no filme, no papel que lhe coube.  Há, também, a atriz uruguaia Mirella Pascual, conhecida por sua atuação em “Whisky” (2004).

O roteiro, muito bem construído, contou com três talentos.  Primeiro, o do escritor do romance que lhe deu origem, “Era el Cielo”, o argentino Sergio Bizzio.  Segundo, o da  cineasta argentina Lucía Puenzo, de “XXY” (2008) e “O Médico Alemão” (2013).  Terceiro, o do cineasta brasileiro Caetano Gotardo, do excelente “O Que Se Move” (2013).




O jovem diretor brasileiro Marco Dutra realizou “Quando Eu Era Vivo” (2012) e “Trabalhar Cansa” (2011), este em parceria com Juliana Rojas, dois filmes bem recebidos pela crítica.

“O Silêncio do Céu” ganhou no 44º. Festival de Cinema de Gramado o prêmio de melhor filme pelo júri da crítica, além de melhor desenho de som e o prêmio especial do júri.  Um belo trabalho de equipe que uniu brasileiros, uruguaios e argentinos numa autêntica produção latino-americana.  Fato raro e alvissareiro.





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