Antonio Carlos
Egypto
A COMUNIDADE (Kollektivet). Dinamarca, 2015. Direção e roteiro: Thomas Vinterberg. Com Ulrich Thomsen, Trine Dyrholm, Lars Ranthe, Fares Fares, Lise
Koefoed. 111 min.
Uma casa linda e enorme, em lugar privilegiado de
Copenhague, chega de herança para Erik (Ulrich Thomsen), casado com Anna (Trine
Dyrholm). O desejo de viver numa casa
assim só se viabiliza envolvendo outras pessoas e isso parece encantar Anna,
que acaba por convencer o marido a montar uma comunidade com pessoas amigas e
conhecidas. Estamos em 1975 e a
ideologia do movimento hippie, de paz, amor e vida coletiva, de preferência na
natureza, estava em alta.
Ao contar essa história, o filme de Thomas Vinterberg,
“A Comunidade”, procura fazer uma radiografia do que está em jogo nas relações
humanas, em uma proposta como essa. Para
começar, conviver com todo tipo de diferenças: de classes sociais, crenças,
religiões, características de personalidade, aspectos geracionais, sentimentos
que afloram uns em relação aos outros, medos, ansiedades, excessos,
excentricidades. É preciso estabelecer
regras claras de funcionamento e de como punir quem não as cumprir. As decisões têm de ser tomadas de forma
coletiva e democrática.
Há ainda a questão da posse do imóvel e do
aluguel. Por exemplo, em uma das
reuniões da casa, decidiu-se que o aluguel a ser pago por cada um deveria ser
proporcional à sua renda, o que acabou produzindo um aumento brutal no aluguel
do membro mais rico.
Viver em comunidade supõe uma dedicação ao coletivo
muito rara de se encontrar em quem foi educado nos cânones individualistas de
um capitalismo altamente competitivo. É
bonito, sobretudo para as crianças, conviver numa família maior, enorme e
calorosa. Mas o desapego dos pais
precisa ser muito grande, também. Alguns
não resistirão por muito tempo e cairão fora.
Parece inevitável.
Mudanças como essas, para serem possíveis e
duradouras, exigem um teste de realidade que, mais cedo ou mais tarde, se
imporá. Se o principal atingido for o casal de intelectuais que concebeu o
experimento, a coisa se complica muito.
Experiências de vida coletiva, de inspiração
socialista, parecem produzir um tipo de felicidade que tem hora para
acabar. Pelo menos, no nosso contexto
socioeconômico capitalista. Em que pese
o êxito do Estado de Bem-Estar Social construído na Escandinávia, que resiste
lá até hoje. As questões econômicas podem
pesar menos para cada um, nos países ricos, mas a realização do sonho coletivo
ainda não encontrou registro histórico palpável.
Estou, naturalmente, pensando em cima da provocação
que o filme “A Comunidade” me fez. É que
esse novo trabalho do diretor dinamarquês Thomas Vinterberg lida com a
complexidade do tema de forma competente e com profundidade. O realizador de “Festa de Família”, de 1988,
“Submarino”, de 2010, e “A Caça”, de 2012, enfrenta questões sérias com coragem
e não teme a polêmica. É um grande
cineasta.
O elenco é igualmente muito bom. Rende bem.
O casal de protagonistas, que enfrenta questões emocionais mais
intensas, mostra do que é capaz, em papéis difíceis. Ulrich Thomsen é um talento reconhecido, tem
uma larga carreira no cinema e TV escandinavos.
Trine Dyrholm, também, e recebeu o prêmio de melhor atriz no Festival de
Berlim deste ano, por este filme.
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