Antonio
Carlos Egypto
VISITA OU MEMÓRIAS E CONFISSÕES. Portugal, 1982. Direção: Manoel de Oliveira.
Documentário. 68 min.
Foi um verdadeiro presente o que nos deu a 39ª.
Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, quando Renata de Almeida anunciou
a exibição de um filme inédito do mestre português do cinema, Manoel de
Oliveira.
A história é a seguinte: em 1982, Manoel de Oliveira
chegava aos 74 anos de idade e realizou um filme documental sobre uma casa em
que ele morou por muitos anos, 40, creio, e sobre a sua própria vida e
história. Talvez imaginando que já era
mesmo hora de fazer isso. Mas deixou o
filme guardado na Cinemateca portuguesa, para só ser exibido após a sua
morte. E assim se fez.
Ocorre que ele só veio a falecer no ano passado, aos
106 anos de idade, e trabalhou até o fim da vida mesmo. Seu último trabalho,
“O Velho do Restelo”, é um curta-metragem realizado em 2014. Seu último grande filme, o brilhante longa “O
Gebo e a Sombra”, em 2012. Ou seja, o
filme póstumo do diretor, “Visita ou Memórias e Confissões”, ficou guardado por
inacreditáveis 33 anos. E, se ele já
havia feito muita coisa até então, a verdade é que a maior parte da sua grande
obra é posterior ao filme. Foi quando
ele trabalhou mais, melhor, mais intensamente, e nos legou filmes
inesquecíveis.
É preciso ver “Visita ou Memórias e Confissões”
sabendo dessas coisas, para se perceber a importância que ele tem como registro
de um trabalho in progress,
poderíamos dizer, em relação ao conjunto da obra.
Na abertura do filme, Manoel de Oliveira põe a
informação de que fez esse trabalho falando de si mesmo e não sabe se deveria
tê-lo feito. Mas, enfim, está
feito. Que bom, Manoel! Assim pudemos ter registrada a sua fala sobre
aspectos importantes da sua vida pessoal, familiar, problemas econômicos que o
levaram a vender a casa tão amada, que expõe lindamente no filme, a sua prisão
no tempo de Salazar, suas ideias sobre arte, arquitetura e, especialmente,
cinema. Imagens de filmagens familiares
são mostradas, em paralelo à linda casa esquadrinhada e objeto de interessantes
reflexões.
A origem do cineasta na cidade do Porto, vindo de uma
família de industriais, indicava caminhos diversos do que trilhou no
cinema. As dificuldades da expressão
artística no longo período ditatorial do regime salazarista foram grande
empecilho. Ele chegou a ser atleta,
piloto de corridas e vinicultor, mas era o cinema o que ele tinha na veia. E foi tardiamente que conseguiu dar vazão
completa a seu espírito criativo e inovador.
O filme autobiográfico de Manoel de Oliveira é
simples e admirável, um documento inestimável sobre um dos grandes cineastas
que o cinema já teve. Merece não só ser
exibido comercialmente, como integrar uma caixa de DVD ou BluRays com os
principais filmes do mestre, coisa que está faltando no mercado
brasileiro. Vários deles foram lançados
em DVD, outros, exibidos na TV paga, no canal Brasil, mas para uma obra tão
vasta e longeva são apenas pílulas.
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