sábado, 6 de julho de 2013

HANNAH ARENDT


 Antonio Carlos Egypto



 

HANNAH ARENDT (Hannah Arendt)Alemanha, 2012.  Direção: Margarethe Von Trotta.  Com Barbara Sukowa, Axel Milberg, Janet McTeer, Nicholas Woodeson.  113 min.



Hannah Arendt (1906-1975), filósofa alemã de origem judaica, fugiu da Alemanha nazista em 1933 e acabou fixando raízes e obtendo cidadania nos Estados Unidos.  Foi em Nova York que ela ficou sabendo do sequestro, pelo serviço secreto de Israel, do criminoso de guerra Adolf Eichmann, em Buenos Aires, e do seu julgamento em Jerusalém.

Ela se ofereceu à revista New Yorker para fazer a cobertura do evento e foi aceita.  Já era, então, um nome de peso na intelectualidade da época, havia publicado um livro importantíssimo: “A Origem do Totalitarismo”.  William Shawn (Nicholas Woodeson), editor da New Yorker, lhe deu carta branca e o tempo de que ela precisava para o trabalho.




O filme “Hannah Arendt”, da escritora e cineasta Margarethe Von Trotta, se refere a esse período da vida dela, que vai de 1961 a 1964.  Foi um período turbulento para Hannah, vivida por Barbara Sukowa, em ótimo desempenho.  Primeiro, por lidar com um tema que mexia com sua história pessoal e a de milhões de judeus exterminados.  Segundo, porque ela foi encarar o monstro Eichmann e encontrou apenas um burocrata medíocre.  Foi capaz de observar e tentar entender o que ela chamou de banalidade do mal, com uma coragem e uma honestidade intelectual incríveis.  Terceiro, porque, como se poderia imaginar, isso causou um enorme mal-estar no campo judaico, muitas incompreensões, hostilidades e perseguição ao seu trabalho e à sua figura.

Num momento ainda de afirmação do Estado de Israel, qualquer crítica às lideranças judaicas no episódio do Holocausto soava intolerável.  E ela o fez.  Assim como afirmou que Eichmann cometeu um crime contra a humanidade, não apenas contra os judeus, uma vez que judeus são humanos.  Seu pensamento era universalista e libertário.  A proximidade com a escritora e feminista Mary McCarthy (Janete McTeer) também mostra que a questão feminina lhe interessava muito.




O filme mostra sua forte personalidade, determinação e peso intelectual, seu relacionamento intenso com o marido Heinrich Blüchen (Axel Milberg), também de grande estatura intelectual, apesar da ausência de diplomas acadêmicos.

Mostra, ainda, o relacionamento de Hannah com o filósofo Martin Heidegger, de quem foi discípula e com quem teve um caso de amor.  Ele viveu na Alemanha nazista como reitor universitário sem dificuldades e com a carteira do partido, que nunca renegou.  Ainda assim, Hannah conviveu com ele, tentando entender o que se passava.  Foi mais um item polêmico de sua história.  O filme não aprofunda essa questão, no entanto.  Fica na superfície da relação.

A busca de Hannah Arendt era sempre a de querer entender.  Foi assim que ela percebeu, de forma original, que o mal pode se originar não da monstruosidade de uma opção política ou ideológica, mas simplesmente da obediência cega e da inabilidade para pensar autonomamente.  De coisas como essas pode ser gerada uma tragédia de lesa-humanidade.

Não pensar por si mesmo, repetir bordões, obedecer às palavras de ordem.  Falar de coisas que nem sequer entende.  Julgar, condenar, sem se preocupar em compreender, são mesmo coisas potencialmente muito perigosas.  Sem falar dos preconceitos.  Que cansamos de ver a toda hora à nossa volta, todos os dias. 


Eichmann

Por isso mesmo, filmes como “Hannah Arendt” vêm a calhar.  Sua narrativa simples e clássica serve bem ao objetivo de revelar uma trajetória, um pensamento, uma figura humana admirável.  Pela honestidade intelectual, não pela polêmica em si.  Respeitar e procurar entender o outro, até mesmo seu maior e mais evidente inimigo, é um desafio e tanto.  Quem for capaz disso, certamente se tornará melhor, mais humano.

Um mérito interessante do filme, também, é nos mostrar a figura de Eichmann e algumas de suas respostas.  A gente percebe que a banalidade do mal é mesmo assustadora, justamente porque parece algo tão comum e corriqueiro.

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