quinta-feira, 11 de julho de 2013

DOSSIÊ JANGO

Antonio Carlos Egypto





DOSSIÊ JANGO.  Brasil, 2012.  Direção: Paulo Henrique Fontenelle.  Argumento: Paulo Mendonça e Roberto Farias.  Documentário.  102 min.


“Dossiê Jango” é um documentário que aborda a trajetória do ex-presidente João Goulart, concentrando-se no período de seu exílio e fim.  E tem uma intenção clara: propor a investigação da morte de Jango, com base em suspeitas bastante plausíveis de que teria ocorrido um assassinato e não morte natural.

Num primeiro momento, a ideia parece estranha.  Jango faleceu em decorrência de um infarto, na Argentina, em 06 de dezembro de 1976.  Ele era, reconhecidamente, paciente cardíaco.  Estava bem de saúde, mas se valia permanentemente de medicação.  Há uma suposição de troca dos remédios que teria provocado sua morte, justamente quando ele estava pensando em poder voltar ao Brasil.  Evidentemente, não é algo fácil de se comprovar a esta altura.  A exumação do corpo do ex-presidente foi recentemente aprovada e talvez possa esclarecer as circunstâncias da morte.




O contexto político em que isso se dá é, no entanto, bastante revelador.  A ditadura já perdia fôlego nesse período e era evidente que o caminho para a redemocratização seria questão de tempo.  Viriam a abertura lenta e gradual do regime e a anistia, mas ainda era preciso muita luta e articulações políticas para superar o período autoritário.

Num eventual retorno a eleições presidenciais, os nomes mais fortes e influentes, com maior potencial de voto, seriam os ex-presidentes Juscelino Kubitschek e o próprio Jango, além de Carlos Lacerda, a maior liderança da direita e político de dotes raros, de oratória e coragem.  Arqui-inimigo do getulismo e, portanto, de Jango, sempre foi um rival de peso.




Pois bem, os rumos da ditadura acabaram por unir os adversários políticos, todos já cassados, em prol de uma causa comum: a redemocratização do país, o fim da ditadura militar instalada desde 1964.  Formaram, então, e surpreendentemente, a Frente Ampla, com significado óbvio para a vida nacional daquele momento histórico.

Num período de apenas nove meses, Juscelino Kubitschek, Carlos Lacerda e João Goulart morreram.  Juscelino, num acidente de estrada, suspeitíssimo.  Houve até notícia equivocada de sua suposta morte por acidente dias antes do ocorrido.  Carlos Lacerda padecia de uma gripe e foi tomar injeção num hospital.  Pouco depois estava morto, também de forma estranha e inesperada. E João Goulart sofreu um infarto.

Há outras mortes inexplicáveis, como a do médico legista que fez o laudo da morte de Jango, do empresário uruguaio e amigo do ex-presidente, Enrique Foch Diaz, que afirmava veementemente que Jango fora assassinado, cujo depoimento está no filme.  Entre outras mortes, também por razões cardíacas, no mesmo período.




Há, ainda, entrevistas esclarecedoras que fazem crer na hipótese do assassinato.  Evidentemente, é uma história que precisa ser muito melhor contada, a partir de investigações.  É necessário resgatar a verdade histórica.  É isso que “Dossiê Jango” procura fazer, dando elementos que subsidiem esse trabalho investigativo com novas informações e o resgate de documentos, como os do Serviço de Inteligência do Uruguai e do DOPS (Departamento de Ordem Política e Social).  E também depoimentos como os de Mário Neira Barreiro, ex-agente policial uruguaio, preso no Rio Grande do Sul, desde 2003.

São muitos os entrevistados, inclusive o filho e a viúva de Jango.  A produção pode ser considerada não-isenta, uma vez que é também do Instituto João Goulart, além do Canal Brasil.  Foi mesmo para reabrir o caso.  Mas isso não tira o mérito do filme.   As informações que ele traz são fortes, contundentes.  E eles têm razão: não podemos ficar simplesmente com uma história oficial que parece pouco convincente, principalmente se olharmos o entorno que envolveu a morte do presidente João Goulart, deposto por um golpe de Estado que deu origem a um longo período ditatorial no Brasil.

“Dossiê Jango” recebeu os prêmios de melhor documentário, pelo Júri Popular do Festival do Rio 2012, e melhor longa-metragem, pelo Júri Popular do Festival Tiradentes 2013




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