Antonio Carlos Egypto
O cinema é o tema de dois filmes muito bons em
cartaz. Um verdadeiro presente em época
de festas de fim de ano para os cinéfilos.
Confira.
LUMIÈRE, A AVENTURA CONTINUA! (Lumière,
l’Aventure Continue!). França,
2024. Direção e roteiro: Thierry
Frémaux. Documentário. 104 min.
Os irmãos Louis e Auguste Lumière deram
início à aventura do cinema, em 28 de dezembro de 1895, com a primeira projeção
pública, e paga, de filmes realizados com o cinematógrafo, no subsolo do Grand
Café, Boulevard des Capucines, em Paris. O cinematógrafo coroava os esforços de
um grande número de inventores e pesquisadores que buscaram o sonho de criar a
fotografia animada, ou em movimento. Entre eles, estava Thomas Edison
que, com seu cinetoscópio, associado ao fonógrafo, tentou criar o cinema com
imagem e som em paralelo, uma espécie de precursor do cinema falado, em
1892. Só que isso se dirigia a um espectador por vez, que precisava olhar
num visor.
Antoine Lumière, o pai de Louis e
Auguste, proprietário de uma fábrica em Lyon, trabalhava com fotografia e
película, conheceu o equipamento e teria dito que era preciso libertar as
imagens daquela caixinha e pô-las para que todos as vissem
simultaneamente. Estimulou seus filhos a encontrar a solução técnica para
isso. Estamos diante, portanto, de uma família de criadores, inventores,
técnicos. Com a patente do cinematógrafo, também negociantes.
Embora isso já seja uma coisa fantástica, é muito mais do que isso.
Thierry Frémaux, diretor do Instituto
Lumière e do Festival de Cannes, com seu novo filme, nos mostra, mais uma vez
de forma inequívoca, que os irmãos foram grandes cineastas, responsáveis não só
pela criação e difusão do cinema como pelo estabelecimento da linguagem
cinematográfica tal como a conhecemos hoje. E com grande talento. “Lumière, a Aventura Continua” retoma a compilação
dos filmetes de 50 segundos de duração dos Lumière e de seus operadores, de
1895 a 1905. No filme, composto e
comentado por ele, desfilam cerca de 120 filmes, selecionados da coleção de
milhares realizados. Parece um milagre,
foram encontrados mais de 1400 filmes deles, que estão sendo restaurados e cujo
material serve de base ao conceito de que os Lumière sabiam usar e
posicionar uma câmera, fazer o enquadramento preciso, trabalhar lindamente com
a luz, com o tempo e a agilidade do filme, com as pessoas que estão à frente da
câmera e com a impressão que as imagens podem causar.
A fotografia é esplêndida, de um preto
e branco bem contrastado, perfeito. A nitidez da fotografia é uma
surpresa. A profundidade de campo já era explorada, é tão nítida na
frente quanto no fundo. Eles também produziram o travelling e
a filmagem bem de perto, o zoom. Tudo isso com uma câmera sem
visor, com os recursos técnicos dos primeiros tempos. Limitadíssimos,
portanto. O texto, em off, de Frémaux, é uma
preciosidade. Ele aponta para tudo o que foi a criação dos Lumière, os registros
individuais e coletivos, os eventos, as paisagens humanas urbanas, os detalhes
e muitas coisas que a gente não veria, se não fosse alertado para elas. Se
‘Lumière, a Aventura Começa”, de 2016, já foi uma aula obrigatória para quem
gosta de cinema, a sequência dessa experiência é um aprofundamento na leitura
desses grandes pioneiros da arte cinematográfica. Indispensável.
NOUVELLE VAGUE (Nouvelle Vague). França, 2025. Direção: Richard Linklater. Elenco: Guillaume Marbek, Zoey Deutsch, Aubry
Dullin, Adrien Rouyard, Antoine Besson, Jodie Ruth-Forest. 105 min.
“Nouvelle Vague”,
como o nome já indica, é uma homenagem ao movimento cinematográfico francês que
modernizou o cinema nos anos 1960, na vanguarda dos demais movimentos de
renovação do cinema, entre eles, o cinema novo brasileiro. Seus maiores expoentes estão em evidência em
São Paulo. François Truffaut (1932-1984)
está sendo reexibido na íntegra numa mostra de 26 filmes no Cinesesc e é um dos
personagens do filme de Richard Linklater, naturalmente. Mas o destaque do filme “Nouvelle Vague” é
Jean-Luc Godard (1930-2022) e a sua obra-prima “Acossado” (A But de Souffle), de 1960, que é um dos mais importantes trabalhos
da história do cinema. E que aconteceu
depois do êxito extraordinário de “Os Incompreendidos”, de 1959, de Truffaut.
No filme do cineasta
norte americano Richard Linklater,
destaca-se a figura do diretor Godard (Guillaume Marbek) e do casal de atores
centrais de “Acossado”, Jean-Paul Belmondo (Aubry Dullin) e Jean Seberg (Zoey
Deutsch) e o clima especial da juventude daquela filmagem, para lá de inovadora
e surpreendente.
Naturalmente quem
conhece e curte o filme e já o viu algumas vezes vai se empolgar de conhecer
essa narrativa, os detalhes dela, especialmente. Para quem não conhece o filme original, sua
história ou importância, fica mais difícil aproveitar a experiência e se
divertir com “Nouvelle Vague”. Nesse
caso, no entanto, valeria a pena assistir ao filme atual e, em seguida, ver
“Acossado”, ou vê-lo antes, se for possível.
Servirá para cobrir uma lacuna importante do cinema mundial.
Destaco que a dupla
central de ator e atriz do filme é um achado, são talentosos, lembram muito os
originais e a química entre ele e ela.
Isso acontece também com os personagens de Godard, Truffaut e outros. Houve um cuidado especial na procura das figuras
que deveriam representar esses grandes nomes do cinema francês e mundial da
época. Praticamente todas as grandes
figuras da nouvelle vague e seus
contatos aparecem ou são citadas no filme.
Gente como Claude Chabrol, Eric Rohmer, Jacques Rivette, Alain Resnais,
Roberto Rossellini, Agnès Varda, Jacques Demy, Jean-Pierre Melville. A lista é enorme. Vale a pena lembrar deles. Deixaram um legado extraordinário para a
história do cinema.
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E para finalizar,
deixo aqui um abraço a todos e todas que estiverem me lendo neste momento e que
costumam acompanhar o cinema com recheio. Meu desejo de Boas Festas e um novo início de
ano estimulante e esperançoso para todos nós.
Viva 2026 e Viva o Cinema!
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