Antonio Carlos Egypto
O CASTIGO (El Castigo). Chile, Argentina, 2022. Direção:
Matías Bize. Elenco: Antonia Zegers,
Néstor Cantillana, Catalina Saavedra, Yair Juri. 88 min.
“O Castigo”, dirigido pelo cineasta chileno Matías Bize, é um drama
psicológico que envolve suspense e mistério numa questão aparentemente
prosaica. Que casal não aplicou um
castigo desproporcional a um filho de 7 anos de idade e não se arrependeu do
que fez? Mas parece que aqui não é bem o
caso. O menino foi abandonado na estrada,
perto da floresta, pelos pais durante apenas alguns minutos, mas quando eles
retornaram ele havia sumido. No entanto,
ambos admitem que o que a criança fez foi muito sério, muito grave e teria até
justificado a ação. A mãe acredita, o
pai concorda em parte, acha que exageraram na dose, o que não foi legal. Mas, afinal, o que de tão grave um menino poderia
ter feito para que os pais pensassem assim?
O mistério vai se ampliando, quando ao chamarem a polícia mentem sobre o
fato. Estabelece-se um conflito muito
forte dentro do casal, que também revela uma questão de gênero: as renúncias
que às mulheres acabam sendo impostas socialmente. E como os homens lidam com elas. O confronto
que vive o casal com seus desdobramentos, mágoas e acontecimentos do passado,
ocupa o centro da narrativa dramática. O
suspense se mantém, devido à insegurança da situação e à perda que se deu. E, claro, à culpa que corrói pai e mãe. Após essa experiência traumática, não se pode
voltar ao que se era. Tudo mudou e algo
novo terá de surgir. Por alguma razão,
aconteceu e, pode-se dizer, talvez fosse mesmo inevitável que acontecesse. O filme mantém a tensão psicológica e o
suspense na ação por conta de sua narrativa enxuta, dos silêncios, das
introspecções, do diálogo escasso e do turbilhão emocional que precisa ser
contido. O que nem sempre é
possível. Os dois atores chilenos que
protagonizam o filme, Antonia Zegers e Néstor Cantillana, dão densidade aos
seus personagens e mantêm a situação com brilho.
MILONGA (Milonga). Uruguai, Argentina, 2023. Direção e roteiro: Laura González. Elenco: Paulina García, César Trancoso, Laila
Reys, Paolo Venditto, Jean Pierre Noher.
106 min.
“Milonga”, da diretora uruguaia Laura González em seu primeiro
longa-metragem, é um drama psicológico centrado na personagem Rosa,
interpretada pela ótima atriz chilena Paulina García. Rosa é uma mulher aprisionada pela vida e por
sua história familiar. É viúva, perdeu o marido, mas a sombra dele está
presente em tudo o que ela pensa e faz.
Percebemos o que há de doentio nessa fixação no marido morto, mas o
filme não dá pistas sobre isso. Da mesma
forma que não entendemos o que acontece na sua relação com a nora, de quem ela
procura se aproximar e a rejeita, afastando o neto. Sabemos também que seu filho está preso e ela
não consegue vê-lo há tempos. Tudo
parece desmoronar à sua volta, mas ela não busca reconstruir sua vida, nem suas
relações. Está presa ao passado nostalgicamente. No entanto, coisas começam a acontecer,
quando ela recebe, com relutância, uma antiga amiga que mostra vigor e
entusiasmo, frequentando uma academia de danças de tango. E a estimula a buscar novos ares. A venda de um carro que foi do marido também
acaba pondo-a em contato com um homem ativo e produtivo, Juan, papel do grande
ator uruguaio César Trancoso. Ele vai
pintar um muro da casa dela, aceita sua comida e se interessa pelo apelo do
tango. O que poderia representar um novo
sopro em sua vida e nas relações afetivas e amorosas, no entanto, parece um
estorvo, que ela rejeita. E se refugia
dentro de casa, como numa prisão. A
sequência em que ela assiste escondida Juan circular o jardim da residência
cortando a grama é muito marcante para representar isso. O que ela faz é olhar para trás e tentar
restaurar as relações familiares, fazendo bolos e levando presentes que não
reconstróem nada. Os mistérios da
história se revelarão de forma pouco sutil, com a evolução das situações. Fundamentalmente, numa conversa em que os
fatos e os sentimentos são explicados verbalmente. O mais importante, porém, é o processo que
vive Rosa, o labirinto sem saída em que ela se coloca. E se o tango costuma ser a expressão da
tragédia, sua dança também poderia ser uma porta de saída da depressão.


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