segunda-feira, 4 de novembro de 2024

O QUARTO AO LADO

                     

Antonio Carlos Egypto

 


O QUARTO AO LADO (The Room Next Door). Espanha, Estados Unidos, 2024.  Direção: Pedro Almodóvar.  Elenco: Tilda Swinton, Julianne Moore, John Turturro, Alessandro Nivola.  107 min.

 

“O Quarto ao Lado” é o primeiro longa-metragem de Pedro Almodóvar falado em inglês.  A ação se passa em Nova York, com duas atrizes extraordinárias na língua inglesa: a britânica Tilda Swinton e a norte-americana Julianne Moore.  No cartaz do filme a gente encontra a informação de que ele é escrito e dirigido por Almodóvar.  No entanto, ele é baseado na obra literária de Sigrid Nunez.  Trata-se, portanto, de um roteiro adaptado.  É que sabemos que o cineasta espanhol retrabalha o texto original e o torna almodovariano, como já fez outras vezes.

 

O que vemos em “O Quarto ao Lado” é uma reflexão sobre os caminhos da vida e da morte.  Um trabalho feito com profundidade, delicadeza, afeto, e, por que não esperança?  O tema é nada menos do que a eutanásia, que pode ser entendida como um direito humano fundamental, mas geralmente é tratada como crime.  E o suicídio costuma ser visto de modo intolerável pelas religiões.  Isso aparece claramente no filme, mas não é o ponto principal.

 

A questão central é o que se passa entre duas mulheres jornalistas, muito amigas e que se conhecem muito bem: Martha (Tilda Swinton) e Ingrid (Julianne Moore).  Distanciaram-se por um tempo, em função das circunstâncias de seus trabalhos, mas no reencontro a química e a cumplicidade entre elas se reestabelece quase que instantaneamente.

 


Só que Martha, agora, sofre com uma doença incurável que lhe traz dores terríveis e que motivou sua difícil decisão de querer partir.  Mas ela precisa de ajuda, tentou junto a outras amigas que rejeitaram o pedido e não considera sequer solicitar isso à sua filha, de quem se mantém distante.  Ingrid, no entanto, a entende, a aceita, tem empatia profunda com ela.  Nem por isso a decisão é fácil.  Aliás, todo o processo é muito difícil, embora tudo seja mostrado com beleza, com sutileza, sem excessos ou arroubos.  Na medida certa dos sentimentos que são expressos com precisão em cada gesto, tom de voz, postura ou silêncio.  Vivemos com elas, como espectadores, todas as nuances dessa história, com extrema sensibilidade.  Reconhecemos ali pessoas verdadeiras se relacionando.

 

O ambiente é mais do que bonito, é requintado.  A morte pode se dar com humanidade e com conforto.  É uma aspiração legítima.  Possível em alguns casos.  Sempre pressupõe condição econômica para isso, o que não invalida a aspiração.

 

Acompanhamos com interesse “O Quarto ao Lado” do começo ao fim, já que o filme exala humanidade, enfatiza a cumplicidade e a amizade, sem nunca esquecer os conflitos, os medos, as indecisões, as dificuldades todas que envolvem o viver, o morrer e a perda. 

 

A música de Alberto Iglesias, colaborador habitual de Almodóvar, dá ênfase às emoções que estão subjacentes à atuação das atrizes.

 


Almodóvar declarou que teve muita sorte ao poder contar com as duas grandes atrizes, que deram um show no filme.  Sorte é fruto de trabalho, empenho, busca criteriosa de soluções, abertura para o que vem.  Nesse caso, pode-se dizer que Pedro Almodóvar costuma ter muita sorte nos seus filmes.  Que começam pelas ideias em profusão que saem do seu imaginário de autor.

 

“O Quarto ao Lado” foi aplaudido no Festival de Veneza 2024 por 17 minutos e venceu o Leão de Ouro, o prêmio maior do Festival.





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